domingo, 23 de abril de 2023

Uma cidade de demitidos, com ações em alta, Marcos de Vasconcellos FSP (definitivo)

 Demissões, cortes e cancelamentos. Essas palavras têm acompanhado o noticiário sobre as grandes empresas de tecnologia nos últimos meses. Só neste ano, a Amazon já anunciou 27 mil demissões; o Google, outras 12 mil; a Microsoft e a Meta (do Facebook), cerca de 10 mil cada uma.

Somando os números de outras grandes empresas do setor, como Netflix, Dell e Spotify, o ano (em seus quase quatro meses) computa cerca de 160 mil demissões, contabiliza o site especializado TechCrunch. Isso é praticamente toda a população de Ilhéus, na Bahia, ou de São Caetano do Sul, em São Paulo, no olho da rua. E a triste verdade é que isso agradou a grandes investidores. Veja:

Mais do que o impacto do avanço da inteligência artificial no seu próprio berço, que deverá ser ainda mais devastador nos próximos anos, ainda vivemos uma "ressaca" da pandemia de Covid-19. Mas, diferentemente de outros setores, que apanharam na pandemia e agora podem ter ficado com o caixa curto para pagar as contas, as techs incharam no período mais crítico da doença.

Sede da Meta em Menlo Park, Califórnia; empresa já demitiu mais de 10 mil funcionários nos últimos meses - Josh Edelson/AFP

O trabalho remoto obrigou empresas a contratar novas ferramentas, como a versão paga do Zoom ou do pacote Office para os computadores de seus funcionários. A falta de opções de lazer deu um boom na assinatura de streamings, como Netflix e Amazon Prime.

A chuva de dinheiro encheu o caixa das gigantes da tecnologia, que, com a alta demanda, puseram-se a contratar e a desenvolver novos produtos. Lembra-se do metaverso? Era vendido como o futuro, na época em que ninguém podia sair de casa. Dois anos depois de o Facebook mudar seu nome para Meta, parece um futuro do pretérito.

A conta foi cobrada, com juros brasileiros, quando o mundo voltou a caminhar para a normalidade. O home office deixou de ser regra. Os restaurantes e os bares voltaram a fornecer o tradicional lazer. E a demanda por tecnologia minguou. Crianças, que tinham aula por computador ou tablet, voltaram às escolas.

O impacto ficou claro nas contas das gigantes de tech. A Netflix computou a primeira perda de assinantes da sua história no primeiro trimestre de 2022. A Amazon fechou o ano com prejuízo de US$ 2,7 bilhões (em 2021, registrara lucro de US$ 33 bilhões). É uma diferença de R$ 180 bilhões.

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Quando a conta não fecha, é porque a empresa mordeu mais do que poderia mastigar. Ampliou a máquina e se esqueceu de combinar com os clientes. Isso, óbvio, sem contar as tragédias que também abalam os mercados, como a Guerra da Ucrânia. E o aumento dos juros nos Estados Unidos, que encareceu o dinheiro e dificultou novas expansões.

Para os investidores, esse tipo de atitude significa problemas à frente. E isso ficou claro no preço das ações. De janeiro a dezembro do ano passado, os papéis da Amazon e da Netflix caíram praticamente pela metade do preço. Os da Meta despencaram 66%.

Os balanços anuais mostraram que as perdas no valor das ações não eram algo somente do mercado financeiro, mas sim da dificuldade em fechar as contas na economia real. E as empresas entraram no modo "corte de gastos", fechando postos de trabalho em todo o mundo.

A mudança de posicionamento atingiu as famílias em cheio, mas agradou a grandes investidores. Enquanto demitiram dezenas de milhares de pessoas, as companhias viram suas ações decolar nas Bolsas de Valores. Neste ano, os papéis da Meta subiram 68%; os da Amazon, 24%; os da Microsoft, 19%; os do Google, 18%; e os da Netflix, 11%.

Isso significa que os ventos mudaram para o setor tech? Não necessariamente. Significa apenas que as empresas parecem estar agora com os equipamentos corretos para enfrentar as tempestades. O investidor precisa estar sempre em busca de crescimento, mas é essencial identificar quando ele deixa de ser sustentável. No fim das contas, é preciso fechar a conta.


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