sexta-feira, 28 de abril de 2023

A manipulação da imagem está ao alcance de todos, Luís Francisco Carvalho Filho, FSP (definitivo)

 Se Joe Biden vencer, assegura o Partido Republicano, os Estados Unidos sucumbirão em meio a conflitos extremos, colapso econômico, descontrole das fronteiras e delinquência.

É o que anuncia vídeo difundido em resposta ao anúncio da candidatura de Biden, "o mais fraco" dos presidentes. O roteiro é tosco, mas cria a distopia da reeleição, ilustrada por cenas fictícias de acontecimentos catastróficos. Manipula imagens com recursos da inteligência artificial.

É um pequeno ensaio das controvérsias eleitorais e jurídicas do futuro, já no ano que vem, do que pode e o do que não pode ser feito.

A credibilidade da fotografia era histórica e capilarizada, apesar de eventuais episódios de manipulação, alguns deles clássicos, como o cancelamento (eliminação visual) da imagem de adversários políticos em fotografias oficiais na União Soviética, nos anos 1940, para a satisfação autoritária de Stálin.

O apagamento ou o exagero, a encenação e filtros capazes de remover imperfeições, feiuras e inconveniências não são novidades.

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Pesa contra a lendária fotografia da guerra civil espanhola, "A morte de um soldado republicano" (1936), de Robert Capa, a suspeita de que foi posada. Do cartaz da exposição "Sartre" (2005), na Biblioteca Nacional da França, por um irresistível impulso politicamente correto, foi removido o cigarro que o filósofo tinha entre os dedos da mão no retrato original.

'A Morte de um Soldado Republicano', de Robert Capa
Detalhe de 'A Morte de um Soldado Republicano', de Robert Capa - Reprodução

No fim do século passado, uma campanha publicitária explorava na TV o divertido bordão: "fotografou?", não?, "dançou" —popularizando um meio de prova da veracidade das vantagens que se contam para os amigos (uma pescaria, um flerte). Se há foto, testemunha incorruptível da realidade, a controvérsia normalmente acabava ou se esvaía.

A manipulação era coisa de artesãos, artistas. Hoje está ao alcance de todos.

Há aplicativos para "corrigir" lembranças e imagens: a ex-namorada, uma persona non grata, qualquer um ou qualquer coisa pode ser eliminado ou incluído em determinada fotografia. A tecnologia permite construir a imagem de governantes em bordéis, presídios e igrejas.

O título do artigo do "The New York Times" publicado na Folha sobre o impacto da inteligência artificial no universo da fotografia é sinal de novos tempos: "Não podemos mais acreditar em nada do que vemos?". Fala em "erosão" da confiança na mídia e sugere o barateamento da tecnologia de produzir imagens fake.

Se é legítimo ou ilegítimo criar empecilhos para a obra de arte que cria distopias dos poderes políticos, inspiradas em conflitos e homens públicos reais, o argumento da liberdade de expressão, essencialmente genuíno, também foi apropriado pelos fabricantes de inverdade.

A ameaça da falsidade é contra todos —o vizinho, o ex-marido, o colega de trabalho, por ciúme ou vingança, ideologia ou interesse, qualquer um pode produzir foto ou vídeo para destruir reputação. Porque governos perseguem seus adversários, na política a ameaça é especialmente perigosa.

A lei pode proibir pouco ou muito ou nada, para conforto e desconforto dos atingidos. Distopia e fato inverídico, ficção e falsidade, narrativa e distorção, o veto formal de qualquer coisa que não seja estritamente "verdadeira" não impede sua circulação e sua influência irreversível. Nos EUA, na China, no Brasil e na Ucrânia.

Fotografia não é mais sinônimo de realidade, ainda que instantânea. O céu é o limite da farsa e da ilusão.


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