quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Futuro da Buser dá pistas sobre o futuro do Brasil, Leandro Narloch, FSP

 

Será que, ainda na nossa geração ou na próxima, o Brasil vai se transformar numa nação próspera, justa, ou que pelo menos não se envergonhe tanto de si própria enquanto outras a ultrapassam?

Um critério para dar uma resposta pessimista ou otimista a essa pergunta é o futuro da Buser, “o Uber do ônibus”, e de outros aplicativos que ameaçam o oligopólio das empresas de transporte intermunicipal.

As empresas tradicionais, com laços fortes na política, na Justiça e nos tribunais de contas, estão fazendo de tudo para proibir a concorrência e evitar baixar preços ou melhorar o serviço.

Ônibus da plataforma Buser - Rivaldo Gomes/Folhapress

A Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou nesta terça-feira (31) uma lei que na prática proíbe os aplicativos de ônibus. A tramitação da lei durou menos de um mês (enquanto 20 projetos anteriores levaram mais de 350 dias para serem votados).

Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, conseguiu aprovar um projeto que extingue milhares de novas linhas de ônibus e restringe a atuação dos aplicativos. Agora ele pressiona os deputados para aprovarem a medida. O projeto atende aos interesses da sua família, dona de duas companhias do ramo.

Se a pressão der certo e o oligopólio conseguir barrar a inovação, o Brasil se firmará mais uma vez como uma economia de “instituições extrativistas”, como denominam Daron Acemoglu e James Robinson, autores do livro “Como as Nações Fracassam”.

Esse tipo de sociedade premia quem grita mais alto e tem mais poder político, e não quem oferece serviços melhores ou mais baratos que os da concorrência.

Nesse capitalismo de compadres, de cartas marcadas, comprar um jatinho para dar carona a deputados se torna mais vantajoso que investir em ônibus melhores para os clientes.

Pequenas decisões como essa podem decidir o futuro do país porque a inovação é a chave da prosperidade. Se empresas inovadoras são proibidas por lei, a economia não se torna mais produtiva.

Atividades obsoletas, pouco produtivas (e portanto mal pagas) continuam existindo. A livre concorrência não opera sua mágica de derrubar preços e aumentar o poder de compra dos cidadãos.

Para Acemoglu e Robinson, o sucesso de grupos poderosos de barrar a destruição criativa, com o objetivo de manter reservas de mercado, é uma das principais causas do fracasso das nações.

Na Rússia e no Império Austro-Húngaro, a aristocracia rural conseguiu banir a industrialização –“como consequência, a economia desses países ficou para trás em relação outras nações europeias, onde o crescimento da economia decolou durante o século 19”.

Esse será o rumo do Brasil se optar por proteger grupos de pressão em vez de permitir a concorrência dos inovadores.

O Uber foi uma vitória importante, mas não dá pra dizer que vai ser igual com a Buser. No primeiro caso, a elite experimentou e logo percebeu que o serviço era evidentemente superior ao dos táxis. Mas essa mesma elite viaja de avião, não de ônibus.

Talvez por isso o tema custe a entrar na agenda pública. (É curioso a esquerda, tão afoita a acabar com o privilégio de elites tradicionais, dar pouca atenção ao assunto.)

Mas e se a pressão se reverter e os aplicativos de ônibus conquistarem liberdade para operar? Nesse caso, teremos um sinal de que há instituições inclusivas e um futuro de crescimento sustentável por aqui.

Ainda poderemos dizer que os ricos brasileiros não são só os privilegiados, os herdeiros que representam os interesses do papai no Senado, mas também os inovadores, talentosos e criativos. E poderemos concluir que talvez não seja tanta loucura ter alguma esperança com o Brasil.

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