“Mas por que não se candidatar para a vaga? Vale a pena ter uma opção, mesmo que você escolha voltar para o seu emprego público no Brasil. E, em relação a sua filha, o melhor é receber uma educação no Brasil ou na Europa? Onde é mais fácil virar cidadão global?” Em um restaurante em Madri, parte da conversa com um colega girou sobre como abrir oportunidades na carreira.
Opções têm valor, o que é ignorado por muita gente capacitada, que se entrega de corpo e alma ao seu emprego sem separar parte do tempo para criar planos de contingência. É praticamente obrigação, no moedor de carne que é o mundo corporativo, ter sempre duas ou três boas ofertas de emprego na mão.
O que acontece se você for demitido? Por que fazer um mestrado? Vale a pena vender o apartamento para fazer um curso em Harvard? Qual o tamanho das suas ambições?
Um dos melhores alunos que já tive veio me perguntar, quando estava para se formar, se ele deveria assumir a vaga no Banco Central, em um concurso que ele tinha acabado de passar.
“Você é tão brilhante que a opção do emprego no Bacen vai estar sempre disponível para você. Pense se não vale a pena arriscar, montando uma empresa com amigos, fazendo um doutorado no exterior, ou entrando como trainee em uma multinacional. Você vai decolar, independentemente das suas escolhas. Qual a vida que você quer levar?”
No final, ele escolheu a segurança do emprego público. Não deu outra. Em poucos anos, estava frustrado, porque era subutilizado na instituição, mas, a cada dia que passava, demitir-se para fazer outra coisa tinha custo cada vez maior.
Uma vida como funcionário do Estado pode ser maravilhosa, desde que seja o resultado de ações planejadas, não somente medo de explorar o multiverso.
Não vivemos somente uma vida, mas sim várias. Em uma, você termina numa empresa global em Dubai. Em outra, como funcionário público em Florianópolis. Em uma, você se casou com o primeiro amor, em outra, continua buscando a pessoa certa, e em mais uma vive feliz solteiro.
A cada decisão relevante, bifurcamos nossa vida. Quando recusei oferta de emprego vitalício na melhor escola de negócios de Roma para renovar meu contrato por cinco anos na China, sabia que haveria o risco de me arrepender. Mas a escolha foi feita de olhos abertos e, desde então, mantenho contatos com colegas para sempre ter ofertas parecidas me rondando, se por alguma razão quiser abandonar a vida na China ou venha tomar uma rasteira.
Opções têm valor, mas você tem que estar sempre as construindo. Nas minhas últimas turmas de mestrado, perguntei quantos estavam lá como etapa de um planejamento de longo prazo. Entre 50 alunos, pouquíssimos responderam afirmativamente. Um dos meus orientandos teve muita dificuldade com sua dissertação, porque admitiu que entrou sem saber muito bem o que esperar.
"Deixa a vida me levar” faz sentido quando, em um país desigual como o Brasil, a única preocupação é a sobrevivência. Mas, se não é seu caso, você é dono da sua carreira. Se não há ofertas de outras empresas na sua mesa, há grandes chances de você estar fazendo besteira, mesmo que o plano principal seja ficar na mesma instituição por décadas.
Quem você quer ser quando crescer? Não é para responder a essa pergunta apenas aos 18 ou 20 anos, ao escolher qual curso seguir na faculdade. Seja aos 30, aos 40 e aos 50 anos, quem você quer ser quando crescer?
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