O Brasil firmou o compromisso de reduzir em 37% as emissões de gases do efeito estufa até 2025 em comparação a 2005. Ainda assim, no Senado Federal trabalhamos para diminuir essa meta, e a comunidade internacional apela para que nesta década sejam cortados, no mínimo, 30% dos gases que contribuem para o aquecimento global.
Mas, na contramão, o governo federal, em mera reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), decidiu colocar mais pedras no caminho: as sucessivas reduções do percentual de biodiesel ao diesel mineral utilizado em motores pesados.
Mais uma vez decidiu-se que o Brasil deve manter apenas 10% de biodiesel na mistura do combustível fóssil. Isso sob a pretensa economia de dois centavos por litro —valor que acaba sendo diluído na cadeia de distribuição e chega imperceptível ao bolso do consumidor.
Ao contrário do que se espera, o cidadão sente imediatamente na pele —e no bolso— os efeitos provocados pela redução de até 100 mil empregos, aumento na importação de petróleo (com um dólar altamente valorizado face ao real) e, sobretudo, o retrocesso ambiental.
Foi na crise do petróleo dos anos 1970 que o engenheiro químico Expedito Parente iniciou as pesquisas sobre desenvolvimento de energias renováveis, como o óleo vegetal, produzido de forma abundante em nosso país, e criou a primeira patente do mundo para produção do biodiesel em escala industrial.
Passaram-se três décadas até que o governo federal realmente investisse em um combustível limpo e renovável. Em 2004 foi lançado o Programa Biodiesel, que estabeleceu uma adição de 15% do material ao diesel até 2019. Segundo maior produtor de biodiesel do mundo, o Brasil retorna ao patamar estimado para 2018 e se distancia da meta proposta. Acontece que não temos mais o prazo de décadas para avançar no uso de energia limpa.
A experiência no uso do biodiesel comprovou ser uma excelente alternativa ao diesel mineral. Renovável e biodegradável, não contribuiu para desregular o ciclo do carbono, o que é essencial para que o país cumpra o acordo para a limitação do aquecimento global.
O cumprimento das metas firmadas pelo Brasil na NDC (sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada) é fundamental para continuarmos recebendo investimentos estrangeiros que superam a cifra dos bilhões e constituem, por exemplo, o Fundo Amazônia.
Já o CNPE acredita ser mais vantajoso, neste momento em que estamos às vésperas da Cúpula do Clima, a ser realizada em Glasgow a partir de 31 de outubro, apostar na redução do consumo do óleo de soja (grão no qual o país é o segundo maior produtor mundial), uma das principais matérias-primas do biodiesel, tendo em vista seu alto valor no mercado internacional. E estima que, com isso, poderia render uma economia de dois centavos ao litro de diesel.
No país que vê bater à porta uma inflação na casa dos dois dígitos, o que faz arrepiar qualquer cidadão que se lembre dos anos 1980 e chorar todos os que vão ao supermercado diariamente, a aposta incerta acerta um alvo: o lixo ambiental.
A aposta é a troca de uma energia comprovadamente limpa por maior utilização de combustível fóssil, importado a dólar caro e altamente poluente. Não apenas isso. A compensação da redução do biodiesel se dá na utilização de mais diesel S500 em detrimento do S10, o que significa 5.000 vezes mais poluentes no ar que respiramos.
Não fosse suficiente o impacto na cadeia produtiva, bastando por si só para minimizar os efeitos econômicos positivos almejados pela CNPE, o impacto ambiental leva o Brasil a uma situação cada vez mais delicada frente a investidores internacionais.
Fechar as portas para o biodiesel, para a energia limpa, para combustíveis renováveis, para a vocação e expertise brasileira é trocar bilhões certos por centavos incertos.
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