quarta-feira, 10 de junho de 2020

Até quando? Sergio Cimerman*, O Estado de S.Paulo


10 de junho de 2020 | 05h00

Todos os dias recebo inúmeras ligações, mensagens por WhatsApp e pedidos em redes sociais me arguindo: quando retornaremos ao convívio social e atividades diárias? Na verdade, não temos respostas para essas inquietudes. Estamos aprendendo a cada dia com o novo coronavírus

Em alguns países, pensávamos estar controlada a situação, novos casos surgiram e novas medidas de contenção têm sido realizadas, com fechamento de estabelecimentos comerciais e escolas. Por aqui, o novo epicentro da doença, com quase 700 mil pessoas contaminadas, estamos iniciando a flexibilização em decorrência da situação epidemiológica de cada Estado e município. Em determinadas regiões a reabertura da economia se mostra já em ação e tantas outras estão por vir. 

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A questão primordial seria termos, neste momento, um Ministério da Saúde atuante oferecendo diretrizes aos Estados e municípios, para que não fossem tomadas ações isoladas. Mas, como não provemos disso neste momento, temos de encarar o trabalho técnico e a seriedade de cada governante. Temos obrigação de trazer à luz das pessoas conhecimentos médicos. Ainda mais com a omissão de novos casos confirmados e óbitos de modo total, o que não demonstra transparência e confiabilidade.

Muito se comenta sobre fazer mais testes para, assim, isolar casos positivos mais precocemente e, consequentemente, diminuir a transmissão. Isso seria o mundo ideal. Para isso, temos de ter elo entre serviços de saúde para realizar busca ativa de contactantes. Como fazer isso em um país de área territorial imensa e com população que supera 200 milhões de pessoas? 

Os estatísticos e epidemiologistas não conseguem nos dar respostas porque é difícil mesmo. Os testes apresentam sensibilidade duvidosa, com resultado falso negativo e que geram mais dúvidas, atrapalhando condutas a serem seguidas. É sabido que vamos melhorar a sensibilidade dos testes, que serão feitos em larga escala e serão mais rápidos ainda. Mas, neste momento, engatinhamos. Aqui não é culpa do Brasil e, sim, do mundo todo, que foi pego de surpresa com a pandemia.

Em São Paulo, sofremos com o maior número de casos e mortes do País, e já estamos entrando na fase de abertura da economia. É uma tentativa justa e aceitável. Claro que para isso ser efetivo terá de existir queda do número de casos, menor número de internações em UTI e enfermarias, menor número de óbitos para que não tenhamos de regredir. A compra de novos respiradores no Estado de São Paulo poderá ser um divisor de águas levando à sustentação do sistema de saúde, sem colapsar, e gerando tranquilidade para os profissionais da saúde poderem gerir os casos que chegarão. A necessidade de recursos humanos se faz imperante e já se nota contratação de profissionais em caráter emergencial. Os governantes têm de ter em mente que a qualquer sinal negativo deve-se cancelar e propor nova atitude. A abertura do comércio, sobretudo, deve ser feita mediante protocolos rígidos de distanciamento social e medidas não farmacológicas já muito bem conhecidas pela população. O uso de máscaras, álcool em gel em 70%, escala rotativa de funcionários, dentre outras medidas a fim de se buscar sucesso. A rotina das pessoas deve voltar, porém, com as ressalvas para evitar situações desagradáveis. Outra situação que merece destaque: o retorno das aulas. Projeções são feitas, mas efetivamente como manter distanciamento em salas de aula? Usar algum anteparo? Dividir as turmas pela metade? Teremos de escutar os educadores para compreender as melhores opções. É fato que o aprendizado será extremamente prejudicado devendo ser reparado no ano vindouro com reforços em todas as matérias.

Além de retorno dos vários setores da economia, devemos pensar em retomar as consultas médicas de rotina, os procedimentos cirúrgicos (já existe nota técnica da Anvisa de 29 de maio), manter os tratamentos oncológicos e de diálises, dentre outros. Vamos voltando ao normal, mas os grandes eventos sociais só devem ser incorporados ao cotidiano bem mais à frente. Nós, como cidadãos, devemos nos policiar em relação a essas atitudes. Regras para os esportes coletivos estão sendo encorajadas para que, por exemplo, o futebol possa retornar aos campeonatos estaduais sem a presença de torcedores. O esquema de concentração mais prolongado e realização de exames da covid-19 previamente às partidas podem ser incorporados para segurança dos atletas. 

Até quando? Se flexibilizamos incorremos na possibilidade de nova onda do vírus levando a mais internações e mortes. Se fazemos o lockdown, destruímos a economia, geramos pobreza, as pessoas não terão o que comer, suicídios e violência podem ser inevitáveis. Atentem para a dificuldade de decisões. Temos de aprender mais ainda com a covid-19. Reinfecção, que é uma possibilidade não descartada, e vacina, que ainda está em horizonte longínquo, nos fazem ficar atentos e seguir medidas preventivas já conhecidas.

* EX-PRESIDENTE DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA

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