Aliança oportunista entre Bolsonaro e Flamengo resulta em MP injustificada
Em mais um episódio do inesgotável histórico de promiscuidade entre políticos brasileiros e dirigentes de futebol, o presidente da República, Jair Bolsonaro, e o do Flamengo, Rodolfo Landim, selaram uma aliança com vistas a promover interesses mútuos.
Na sexta-feira (19), os dois mandatários surpreenderam o país e o mundo esportivo em aparição pública para anunciar o envio ao Congresso de uma medida provisória que modifica as regras de negociação de direitos entre clubes e emissoras de televisão.
A canetada tem como um de seus alvos principais o Grupo Globo, desafeto de ambos. Enquanto Bolsonaro não tolera o jornalismo praticado por veículos do grupo, Landim trava há tempos uma batalha para mudar as bases dos contratos firmados com a maioria das agremiações futebolísticas.
O dirigente flamenguista, não se discute, tem todo o direito, senão a obrigação, de buscar condições mais favoráveis à sua entidade na venda de suas partidas. Assim como o Executivo pode perfeitamente entender que a legislação em vigor merece ser revista.
É flagrante, contudo, que o caminho escolhido está longe de ser o mais apropriado. A MP é instrumento legislativo ao qual o Executivo só pode recorrer em situação de clara urgência e relevância, como estipula a Constituição.
Há, além desse aspecto, o fato de que os contratos já celebrados não poderiam ser simplesmente anulados por uma penada presidencial —ato que em gíria futebolística poderia ser caracterizado como uma reviravolta de tapetão, sem o necessário debate. O roteiro proposto só contribui para gerar discórdia e insegurança jurídica.
Enquanto o Flamengo tende a agir de modo unilateral, sem levar em consideração as demandas coletivas do setor e seu fortalecimento institucional, Bolsonaro aproveita-se da ocasião de maneira demagógica e personalista.
Tais considerações não implicam julgamento negativo quanto às propostas urdidas pelo dirigente e pela Presidência. Ao contrário, a ideia de que os clubes podem ampliar sua autonomia na venda de direitos e obter mais vantagens como mandantes das partidas é legítima e está em sintonia com o que se observa em países europeus. Tais mudanças, contudo, deveriam ser fruto de um processo mais amplo de discussão, com a participação dos interessados e em consonância com a agenda do Legislativo.
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