STF reverteu instituto que ajudou a mudar a percepção sobre o alcance da lei
Não é simples explicar para o cidadão leigo por que o Supremo Tribunal Federal mudou três vezes, em menos de 11 anos, o seu entendimento sobre a possibilidade de um condenado à prisão começar a cumprir a pena após perder a apelação em segunda instância.
A tarefa se complica pois, nesse período curto para a dieta das jurisprudências constitucionais, dois ministros —inclusive o presidente, Dias Toffoli— mudaram de ideia. Gilmar Mendes alterou duas vezes a sua opinião, demonstrando eloquência comparável ao defender A, o contrário de A e novamente A.
O comentário realista diria que este é o Supremo Tribunal Federal de que dispomos. Embora longe do ideal, melhor tê-lo como um pivô do regime democrático do que qualquer alternativa. De fato.
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Ainda assim, não há dúvida de que a decisão da maioria dos ministros, consumada nesta quinta (7), significa retrocesso, seja para a expectativa de estabilidade na aplicação das normas, seja para a percepção de que a lei atinge a todos, ricos e pobres, sem distinção.
De 2005 —quando nesta Folha o então deputado Roberto Jefferson denunciou um esquema de compra de apoio ao governo— para cá, a única questão substantiva a ser alterada no panorama do direito penal brasileiro foi o aumento da probabilidade de enquadramento de poderosos, nas empresas e na máquina estatal, envolvidos em negociatas com recursos públicos.
O STF foi protagonista nessa trajetória ao julgar com rigor os desmandos revelados no mensalão e ao favorecer a aplicação de instrumentos que ajudaram a recuperar bilhões roubados dos cofres públicos e a condenar figuras que muitos pensavam imunes à punição.
As decisões da corte em 2016, que restituíram a jurisprudência de validar a prisão do condenado em segundo grau, constituíram vigorosa sinalização no mesmo sentido. Ajudaram a mudar a percepção sobre o alcance da lei penal no Brasil.
Infelizmente, o Supremo acaba de apagar esse instituto apenas três anos depois de tê-lo ativado.
As notícias de abusos de autoridades investigativas e judiciais que atuam em casos de corrupção deveriam levar, como estão levando, a revisões pontuais e circunstanciadas dos processos, bem como à punição dos violadores.
As notícias de abusos de autoridades investigativas e judiciais que atuam em casos de corrupção deveriam levar, como estão levando, a revisões pontuais e circunstanciadas dos processos, bem como à punição dos violadores.
É temerário adotar terapia sistêmica para esses males, pois seu efeito colateral provável será estimular os crimes do colarinho branco.
No horizonte das conquistas recentes contra a corrupção, sempre pairou a ameaça da associação tácita entre as possíveis vítimas poderosas e suas clientelas para colocar freios no processo. Após a decisão desta quinta, o STF terá trabalho para convencer o público de que não endossa o chamado acordão.
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