quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Virtude na marra, Helio Schwartsman, FSP

A criançada não está curtindo muito o cardápio vegano em escolas na Bahia

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O veganismo é perfeitamente válido como escolha individual. Entra na mesma categoria das religiões, credos filosóficos, opções políticas, gostos literários e fetiches sexuais. Isso significa também que o Estado não tem legitimidade para impô-lo a ninguém e nem mesmo para incentivar cidadãos a segui-lo --da mesma forma que não pode puxar a sardinha para nenhuma fé religiosa.
À luz desses truísmos, é esquisita a história da militante vegana e promotora de Justiça Letícia Baird, do Ministério Público da Bahia, que vem obrigando escolas públicas de algumas cidades do sertão baiano a assinar termos de ajustamento de conduta nos quais se comprometem a reduzir paulatinamente o teor de proteínas animais na merenda servida aos alunos até substituí-las por produtos vegetais. Hoje, 32 mil estudantes de 154 escolas da região já consomem duas vezes por semana um cardápio sem itens de origem animal.
Crianças comem salada de frutas na creche Cheiro de Amor, na cidade de Serrinha (BA) - Raul Spinassé/Folhapress
Obviamente, o MP baiano não descreve o programa Escola Sustentável como evangelização vegana, hipótese em que estaria confessando um desvio, mas sim como uma iniciativa destinada a melhorar a saúde das crianças, reduzir gastos e diminuir o impacto ambiental da merenda.
A narrativa tem dois problemas. Em primeiro lugar, embora alguns profissionais de saúde, em geral veganos, afirmem que crianças podem adotar sem problemas uma dieta exclusivamente vegana, o consenso médico recomenda que, nestes casos, haja suplementação de ferro e de algumas vitaminas. E é complicado pensar em suplementação numa área em que a metade da população tem renda mensal inferior a meio salário mínimo.
Em segundo lugar, a criançada não curte muito o cardápio vegano e deixa grandes quantidades de sobras no prato, o que compromete a ideia de que a iniciativa promove a eficiência do gasto público.
O mundo melhoraria bastante se as pessoas parassem de tentar determinar como os outros devem viver.
 
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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