Por Jean Raupp e Caio Prestes, SP1, São Paulo
Um quinto da população do país vive no estado de São Paulo. São 45 milhões de habitantes e também o maior colégio eleitoral do Brasil. São 33 milhões de eleitores que, em outubro, estarão novamente diante da urna. As mulheres representam 52% do eleitorado paulista, mas dos 164 deputados federais e estaduais de São Paulo, 149 são homens (91%) e 15 mulheres (9%).
Na democracia representativa - que é o nosso sistema - o eleitor escolhe quem vai lhe representar para tomar as decisões. E a população poderia se ver refletida na Assembleia Legislativa, no Congresso Nacional, no governo do estado e na presidência. Mas no espelho do poder esse reflexo não costuma ser fiel à imagem da sociedade.
- Na Assembleia Legislativa, dos 94 deputados estaduais - 84 são homens (89%).
- A bancada paulista na Câmara dos Deputados tem 70 deputados - 65 homens (93%).
- Em toda a história, só duas mulheres ocuparam uma das cadeiras do estado no Senado.
O cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira, da FGV, diz que São Paulo tem uma deformação dessa representação. “Quem organiza pautas das mulheres são homens, o que, de certa forma, mostra que a população não está proporcionalmente representada em termos de segmentos que fazem parte da sociedade brasileiras”, diz o especialista.
Na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa o retrato dos nossos representantes é bem parecido: homem, branco, com mais de 50 anos que chegou à universidade e tem patrimônio milionário.
“O sistema eleitoral favorece quem está dentro do jogo”, diz o cientista político Fernando Abrúcio, da FGV. Não favorece quem está fora do jogo. E quem está dentro do jogo são os grupos que há anos se reproduzem no Congresso Nacional. É claro que há renovação política de cerca de 40% ao longo dos anos no Congresso, mas quem chega lá é do mesmo tipo. Quem chega lá foi secretário de estado, é ex-prefeito ou é alguém que tem muito dinheiro e pode pagar sua campanha.
- Nas duas casas, 6% dos deputados se declararam pretos ou pardos.
- Na Câmara dos Deputados, a bancada paulista não tem uma mulher negra.
- Na Assembleia Legislativa, 80% dos deputados estaduais chegaram à universidade. Na Câmara, são 90%.
- Em média, os deputados estaduais e federais de São Paulo declararam para a Justiça Eleitoral um patrimônio de R$ 1,8 milhão.
Nas ruas, é bem diferente. Os eleitores são jovens: 45% têm até 39 anos. E 35% dos paulistas se declaram pretos ou pardos. Só 16% chegaram à faculdade e a renda de 41% da população não passa de dois salários mínimos, R$ 1.874.
“O problema está no sistema partidário”, diz Glauco Peres da Silva, cientista político da USP. “O que a gente vê é um grupo muito diferente que está bloqueando o acesso de outros grupos para compor a elite política de um país. Então, no caso do Brasil você tem poucos negros, você vai ter poucas mulheres porque está bloqueado. Jovens pouco participam, pouco são votados em parte porque não têm acesso. Eles não são oferecidos como candidatos, eles não aparecem como candidatos viáveis em que os partidos põem dinheiro nas campanhas deles, e, portanto a gente nem cogita votar neles.”
Na luta para quebrar esse bloqueio e para mudar as estatísticas, Thiago da Conceição Braziel e Sylvia Virgínia de Souza coordenam um movimento que busca aumentar a representatividade dos negros na política, o Engaja Negritude, fundado no ano passado, promove debates com candidatos negros.
“Estatisticamente os candidatos negros são os que têm menos dinheiro para financiamento de campanha, então, se você não tem dinheiro, não tem como se financiar, você não vai ser visto. quem não é visto não é lembrado, e quem não é lembrado não é votado”, diz Sylvia.
Eles coordenam um movimento que busca aumentar a representatividade dos negros na política, o Engaja Negritude, fundado no ano passado, promove debates com candidatos negros.
“Independentemente da ideologia política, centro, direito, esquerda, o que a gente faz é abrir as portas para os candidatos negros que queiram se apresentar para população negra. Nosso objetivo: é despertar a consciência das pessoas negras para que elas se façam representar dentro da política, é engajar tanto as pessoas que querem se candidatar, na política, quanto os eleitores.
“Nós acreditamos que se não existir um grupo consolidado pronto pra resolver os problemas de seu povo, isso não vai acontecer”, diz Braziel, que é coordenador de políticas públicas da ONG Educafro.
Quem estuda a política diz que as regras do sistema partidário também precisam sem melhoradas e o eleitor precisa participar mais da vida política.
“Uma menor participação faz com que uma pequena parcela da população decida os interesses de todos”, diz Carlos Melo, cientista político do Insper.
Em São Paulo, uma audiência pública convocada para discutir o orçamento do estado para 2019 teve apenas assessores de parlamentares presentes na plateia.
“A sociedade tem que ter em mente que eleição é o momento inicial da vida democrática”, diz Marco Antonio Carvalho Teixeira, da FGV. “Não se pode eleger o presidente, governador, prefeito ou parlamentares e ficar quatro anos distante de acompanhar o que eles fazem, das decisões que eles tomam. Tem que eleger, tem que pressionar, tem que cobrar, tem que acompanhar e tem que, de certa forma, responsabilizar.”
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