Nenhum brasileiro se sujeitaria a achar que não é especial e que deveria ficar no seu lugar sem chamar a atenção
Você não deve pensar que é especial. Você não deve pensar que é tão bom, inteligente ou importante quanto nós. Você não deve achar que qualquer um de nós se importa com você. Você não deve achar que pode nos ensinar qualquer coisa.
Essas formam parte das Leis de Jante. Esse código de conduta foi criado por um escritor dinamarquês-norueguês chamado Aksel Sandemose, numa sátira alegórica publicada em 1933.
Ainda hoje, as normas sociais dos países escandinavos refletem isso. A individualidade é muitas vezes suprimida pelo bem-estar coletivo.
Algumas adaptações são triviais —quando estou lá, todos os alunos se dirigem a mim pelo primeiro nome, já que somos todos iguais.
Outras são muito agradáveis —às vezes, mais de uma hora se passa até você comentar no que trabalha para alguém que acabou de conhecer.
Afinal, “no que você trabalha?” é usado por nós para estabelecer uma hierarquia clara quando somos apresentados a alguém.
Outras são bem estranhas —dar notas na Dinamarca significa escrever uma prova superdetalhada em que as regras de correção são claríssimas. Qualquer aluno pode pedir revisão de prova, que vai para uma banca, e o professor original não tem nenhuma participação no processo.
No Brasil, gostamos de usar o exemplo dos países escandinavos como modelos de sociedades que deram certo. De fato, são os países ocidentais mais desenvolvidos e deveriam sim ser o modelo de várias políticas públicas de sucesso.
Mas duvido que qualquer brasileiro vá querer seguir as Leis de Jante no dia a dia. E as normas sociais são parte integrante do desenho de políticas públicas e de como a sociedade se organiza.
Não adianta escrever: “Se a Dinamarca tem, por que não podemos ter no Brasil?”. Em parte, não podemos porque nenhum brasileiro se sujeitaria a achar que não é especial e que deveria ficar no seu lugar sem chamar a atenção. O senso de justiça e igualdade é o que move a sociedade, e regras são seguidas, mesmo quando não fazem sentido.
Na prática, muitas vezes juízes, médicos e garçons não são somente iguais —são perseguidos se acharem que são diferentes dos outros.
Mas você não pode ou deve tocar música alta, gargalhar no bar, dizer para seu filho que ele é lindo ou especial, fazer qualquer coisa que incomode os outros, tentar ganhar os louros por um projeto no trabalho, dançar bem na boate, ou qualquer coisa que signifique chamar a atenção.
Claro que diferença de classes, racismo e homofobia ainda existem, mas suas dinâmicas são diferentes.
Há também uma elite bem clara, com suas casas de praia e uma montanha de desigualdade que está relacionada ao sistema tributário —como impostos sobre dividendos são altos, mas não há Imposto de Renda para reinvestimento, empresários normalmente têm todos os seus gastos, até compras de supermercado (sem falar nos jatinhos etc.), pagos pelas empresas.
Há também uma elite bem clara, com suas casas de praia e uma montanha de desigualdade que está relacionada ao sistema tributário —como impostos sobre dividendos são altos, mas não há Imposto de Renda para reinvestimento, empresários normalmente têm todos os seus gastos, até compras de supermercado (sem falar nos jatinhos etc.), pagos pelas empresas.
Em parte, as normas sociais traçam o caminho de cada país ao desenvolvimento econômico. Não adianta querer importar soluções nórdicas e manter muito do que faz de nós brasileiros. Mas que podíamos pensar um pouquinho mais no coletivo, não resta dúvidas.
Numa campanha para presidente na qual um dos principais candidatos parece ter a inteligência de um chimpanzé e se comporta como tal, atirando excrementos para todos os lados, a busca por soluções que nos una a todos, em vez de nos dividir, deveria ser uma de nossas prioridades.
Rodrigo Zeidan
Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.
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