Focamos salvadores da pátria, mas não o que importa, as medidas que serão tomadas
É comum repetir o bordão: a educação é o futuro do Brasil. Caro leitor, imagine-se um ditador com plenos poderes. Você teria orçamento ilimitado para resolver nossas questões educacionais. Como começaria?
O primeiro passo seria aumentar em 500% o salário dos professores? Ou contratar 500 mil novos (da onde eles viriam)? O ideal seria começar pela educação básica ou pela superior? Não há como achar político que não se diga a favor da educação. Ainda assim continuamos na rabeira do mundo.
Se quisermos começar a trilhar o caminho dos países bem-sucedidos na área, como Coreia do Sul, precisamos mudar muita coisa. Mas a maior barreira é o fato de que o retorno social de investimentos aumenta quanto antes o fizermos. Ou seja, educação, na verdade, começa enquanto o bebê ainda não nasceu! Intervenções sociais para preparar a nova família geram muito mais retorno à sociedade do que tentar consertar mais à frente.
Infelizmente, não temos seguido essa lógica. Todos os programas ambiciosos que fizemos nos últimos 20 anos focaram o ensino superior. E por isso não vamos sair do buraco.
O Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) é um bom exemplo dos nossos erros. Uma ideia sensata, a de aumentar o acesso ao ensino superior, cujo fracasso se deve ao seu colossal custo, grande parte do qual poderia ter sido evitada.
O subsídio, que deveria ter ido para os alunos, acabou no bolso das universidades, que chegaram ao ponto de incentivar alunos já matriculados a se transferir para o programa: afinal, a inadimplência pública seria menor que a privada.
E o governo anterior ainda escondia seu custo ao disfarçar os desembolsos como sendo somente empréstimos. Mas, quando um aluno não paga, a conta sobra para todos. Quando criado, a inadimplência seria de 10%. É mais de 40% hoje.
O governo tornou transparente o problema em 2017, contabilizando como despesa no Orçamento mais de R$ 6 bilhões (os desembolsos totais foram de mais de R$ 30 bilhões, ou mais que tudo o que o governo gasta com o Bolsa Família!). Uma montanha de dinheiro.
O programa foi finalmente racionalizado, mas tarde demais. Os compromissos assumidos são de bilhões de reais por anos a fio.
Tão cara quanto o Fies foi a criação de dezenas de novas universidades federais. Podemos (e devemos!) ampliar o acesso ao ensino superior. Só que não podemos desperdiçar dinheiro aos bilhões.
A Coreia do Sul começou investindo na primeira infância, passando então ao ensino primário, secundário e assim por diante. Temos que seguir esse caminho, mas vamos precisar de 30 anos. Não tem solução mágica.
A verdade é que detalhes importam. Esse ciclo eleitoral revela o vício dessa nossa visão abstrata. Focamos salvadores da pátria e os potenciais nomes para ministérios, mas não o que realmente importa: quais as medidas efetivas que serão tomadas?
Essa tendência a fugir dos detalhes não está só em políticas públicas, é claro. Tente achar algum funcionário, público ou privado, que realmente entenda seu processo de avaliação de desempenho. Normalmente as "metas" a que estamos sujeitos são tão abstratas quanto as promessas de políticos.
Está na hora de sair das ideias para a realidade. Quais os detalhes do plano de governo? Quais serão as medidas concretas em saúde e educação? Como vai ser feita a reforma previdenciária e tributária?
No jogo de retórica, os candidatos prometem mundos e fundos. Está na hora de crescermos. Não há saída simples para nossos problemas complexos.
Rodrigo Zeidan
Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.
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