A má fama dos répteis elide que foram os primeiros vertebrados a conquistar, de rastos, o mundo terrestre. Uma ordem dessa classe, os quelônios, manteve relação estreita com a água —fonte da desgraça que se abateu sobre Richard Vogt.
O cientista americano do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia especializou-se em tartarugas de rios. Deu contribuições significativas para a ciência, como na elucidação do papel da temperatura na determinação do sexo da prole.
Por tal razão, recebeu uma homenagem da Liga dos Herpetologistas em reunião realizada há um mês em Nova York. No dia seguinte, a associação voltou atrás e cancelou o prêmio, apontando conduta inapropriada do laureado.
A homenagem naufragara quando a palestra de Vogt colidiu com as sensibilidades de pesquisadoras presentes. Implicaram com imagens de estudantes em biquínis trabalhando nas praias fluviais.
A reação foi desencadeada, paradoxalmente, por um ato de censura. O coordenador do evento, alegando impropriedade nas fotografias, determinou que fossem exibidas com tarjas azuis cobrindo partes “reveladoras demais”.
Nada havia de provocativo nas cenas —com mulheres e homens em trajes sumários, adequados para o ambiente aquático, sob temperatura equatorial. Não se viram tarjas sobre o torso nu de homens, tampouco protestos por sua exibição.
Na lógica enviesada pelo puritanismo, a presente afecção infantil do feminismo, tais imagens, se exibidas por um integrante masculino da elite da especialidade, são prova definitiva de machismo e sexismo.
A liga reconheceu erro na aplicação das tarjas sem anuência de Vogt, mas mesmo assim lhe retirou o prêmio. Seu novo presidente lamentou a escolha de Vogt, obra do antecessor, que renunciara no dia da apresentação tida por ofensiva.
Não se trata de defender o cientista, a priori, sobre o qual pesam outras alegações de conduta duvidosa. Há que investigá-las e, eventualmente, comprová-las.
Já os dirigentes da liga preferiram condená-lo sem direito a defesa. Como anfíbios, mantiveram um pé na terra firme e outro nas águas tépidas da pusilanimidade.
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