Ministros e secretários da equipe econômica do governo Lula querem diminuir os gastos com benefícios previdenciários e assistenciais, mas ao mesmo tempo há um certo melindre em tocar no assunto e assumir esse desejo. Sabem que é um tema extremamente impopular. Não é à toa que com a mesma velocidade em que o corte das despesas previdenciárias é introduzido no debate nacional, dele sai rapidamente.
É um assunto controverso e que divide opiniões na própria base do governo. E a tática de falar em mudança e depois recuar funciona como uma espécie de balão de ensaio, para sentir o mercado financeiro e saber até onde vai a reação popular nesse tema indigesto.
A ameaça da vez é o benefício assistencial. Quando o dólar estava subindo e naturalmente preocupando a equipe econômica, surgiu mais um anúncio de que o BPC (Benefício de Prestação Continuada), concedido a idosos acima de 65 anos ou inválidos, poderia ser alterado para permitir que seja pago abaixo do salário mínimo. Mas também há a possibilidade de se fazer até o final do ano uma grande revisão de benefícios previdenciários, chamada de "pente-fino", para tentar enxugar as despesas.
Em maio, a desindexação do salário mínimo do benefício previdenciário foi falado. A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, na ocasião deu uma entrevista cogitando desvincular benefícios previdenciários do salário mínimo. Em junho, a ministra se manifesta publicamente dizendo que a desvinculação do piso das aposentadorias ao salário mínimo "não passa pela cabeça" do governo.
A necessidade de falar em cortar gastos previdenciários aparece toda vez que indicadores como o dólar, a inflação ou a dívida pública aumentam. E nesses seis meses iniciais do ano eles estão dando sinais ruins, o que sobra para a Seguridade Social.
Há uma sinergia entre os temas: despesa previdenciária, alta dólar, inflação, divida pública e juros da dívida.
A Dívida pública federal aumentou e nos primeiros três meses do ano ultrapassou R$ 6,6 trilhões. Já o dólar a partir de abril vem aumentando. Com efeito, a dívida pública no mercado externo também sofreu alta.
Nos primeiros quatro meses desse ano, os gastos previdenciários somaram R$ 80,7 bilhões, uma alta real de 17% em relação ao mesmo mês do ano passado. Chegamos a metade do ano e os gastos previdenciários continuam em alta, principalmente em razão do Atestmed, ferramenta que vem permitindo a concessão do benefício por incapacidade temporária sem perícia inicial, o que aumenta o número de fraudes e atestados médicos falsos.
Para reduzir a fila do INSS, é como se o governo tivesse feito vista grossa a eventuais fraudes e aberto a torneira de gastos. Como o benefício por incapacidade está sendo concedido ligeiramente, a velocidade do gasto do INSS também aumenta.
O governo quer fazer o ajuste fiscal e, para isso, busca a revisão de gastos na área previdenciária, mas com um nome pomposo: "modernização dos benefícios previdenciários". Desde quando pagar benefício (previdenciário ou assistencial) abaixo de um salário mínimo é modernizar? São assuntos que de fato estão interligados.
Por meio da dívida pública, o governo obtém dinheiro emprestado a instituições financeiras e investidores para honrar compromissos financeiros. Em contrapartida, assume o compromisso de devolver os recursos corrigido depois de um tempo, que pode se atrelar por exemplo a seguir a inflação ou o dólar.
A questão é que o gasto da seguridade social não é o único. Existe um outro que é tão ou mais relevante e quase não se fala: os juros pagos todos os anos para amortizar a dívida pública.
Apenas de 2023 a 2026, o orçamento reservado para o governo brasileiro gastar com os juros da dívida corresponde a R$ 1,7 trilhão, o que em média equivale a R$ 350 bilhões por ano.
Para fins de comparação, o INSS gastou no quadrimestre cerca de R$ 80,7 bilhões, enquanto o governo federal pagou R$ 116 bilhões apenas para os juros da dívida pública. Não é propriamente o valor principal da dívida, mas tão somente parte dele, os juros.
Esse gasto da dívida pública não vai para brasileiros extremamente pobres, que dependem do benefício assistencial, ou para a maioria da classe média que recebe aposentadoria do INSS de até dois salários mínimos.
Esse montante bilionário que o governo gasta mensalmente vai para instituições financeiras. E não há previsão de quando irá parar. Paradoxalmente, pouco se fala no assunto. Não gera por exemplo a indignação na mesma intensidade que o gasto previdenciário desperta em alguns analistas e membros do governo.