sexta-feira, 6 de julho de 2018

Após queda, Tite fica com olhos marejados e evita falar de futuro na seleção, FSP

Técnico evitou fazer análise dos erros cometidos por Fernandinho na partida

Tite durante derrota da seleção brasileira para a Bélgica
Tite durante derrota da seleção brasileira para a Bélgica - Luis Acosta/AFP
KAZAN
técnico Tite entrou na sala de imprensa da Arena Kazan com os olhos marejados após a eliminação contra a Bélgica nesta sexta (6), pelas quartas de final da Copa do Mundo. Ele não quis comentar se permanece à frente da seleção brasileira até o Mundial do Qatar.
"É inapropriado falar sobre futuro. É um momento de emoção, não tenho como te responder essa pergunta", disse o treinador.
O técnico Tite ingressou no cargo em 2016 e tem contrato até o fim desta Copa do Mundo, mas ainda não definiu seu futuro.
A seleção sofreu dois gols no primeiro tempo em falhas individuais do volante Fernandinho. No primeiro, ele fez contra após cruzamento na área. No segundo, perdeu bola para Lukaku no meio de campo em lance que originou contra-ataque para De Bruyne ampliar.
Perguntado sobre as falhas, Tite não quis falar sobre os erros do atleta.
"Quero fazer uma análise e não vou entrar em individualidades porque é desumano. Entendo o futebol, mais do que a vida, como um contexto. Foi um grande jogo, tivemos a maior parte dominando. Na efetividade, a Bélgica conseguiu traduzir em gols", disse Tite.
O treinador do Brasil aproveitou para elogiar a atuação da Bélgica e quase se emocionou ao falar de um dos últimos lances da partida, quando Courtois defendeu com a ponta dos dedos chute de Neymar.
"A Bélgica tem jogadores tarimbados. Lukaku, De Bruyne, Hazard, Kompany, Courtois que estava iluminado... O Neymar bateu a última bola, eu levantei para gritar e ele tirou de mão trocada", relembrou Tite.
De acordo com as estatísticas da Fifa, o Brasil deu 26 chutes ao gol da Bélgica. Os europeus finalizaram oito vezes apenas. Para o técnico brasileiro, os belgas foram mais competentes.
"Não gosto de falar em sorte. O futebol tem um aleatório, mas não considero sorte. Sorte quando é a nosso favor é uma maneira educada das pessoas desprezarem a competência da gente. Isto é desprezo de competência. É do jogo. Sorte, acreditem, não é. O Courtois esteve bem, fez grandes defesas, não deu, vou fazer o quê? Mas sorte, não. Não teve sorte a Bélgica, teve competência. Quando caiu no pé, fez", avaliou Tite.
Tite ficou 26 jogos à frente da seleção brasileira, com 20 vitórias, duas derrotas e quatro empates. Sofreu apenas oito gols, sendo seis deles de bola aérea, como o primeiro da Bélgica nesta sexta.
Durante toda a entrevista, o técnico da seleção ficou com os olhos marejados. E rejeitou falar sobre futuro no time brasileiro.
"A dor talvez fique mais aflorada na hora. Está muito difícil falar com vocês. O sentimento fica amargo, pesado, está difícil. Talvez pesem os 30 anos de carreira para ter discernimento e falar agora. Uma coisa é certa, o torcedor enxerga. Talvez por isso ele reconheça e passe esse carinho", afirmou Tite.
"Não quero falar de futuro, estou aflorado. Não quero ser demagogo aqui e colocar do meu sentimento. Já explanei o orgulho de trabalhar com eles. Talvez tenha faltado competência, mas não dedicação plena", continuou.
A seleção brasileira deve deixar a Rússia no sábado (7). A Bélgica segue na briga pelo título e encara a França na terça (10), em São Petersburgo.
Camila Mattoso , Luiz Cosenzo , Diego Garcia e Sérgio Rangel

Embraer não resistiria sozinha, diz especialista, FSP

Brasileira seria sufocada pela concorrência com a Airbus e chinesa

Anaïs FernandesJoana Cunha
SÃO PAULO
Apesar da reação negativa do mercado, que derrubou as ações da Embraer nesta quinta (5) diante da notícia do acordo com a Boeing, especialistas no setor aéreo avaliam que, sem a gigante americana, a brasileira seria sufocada pela concorrência.
Depois que a Airbus anunciou, em outubro, que comprou a linha de jatos regionais da Bombardier, entrando definitivamente para concorrer no segmento de aviões de médio porte —carro-chefe da Embraer—, ficou claro que não haveria espaço para tantos gigantes.
"A Boeing iria entrar nesse mercado de qualquer jeito, ou desenvolvendo o próprio avião ou comprando outra empresa que fabricasse", diz André Castellini, sócio da Bain & Company.
Na opinião de Guilherme Amaral, sócio do escritório ASBZ e especialista em direito aeronáutico, a operação previne uma entrada da Boeing nesse nicho por outros meios.
"Se ela entrasse por outros meios, isso poderia acirrar a competição e dificultar ainda mais a evolução da Embraer", afirma Amaral.
Soma-se a isso, o avanço do segmento de aviões de cem lugares na China, onde recentes mudanças regulatórias animaram fabricantes de aviões médios.
"Antes de começar a vazar informações dessa possível compra da Embraer, o valor das ações, que refletem as perspectivas para o futuro da empresa, estava sofrendo. A sobrevivência da Embraer a longo prazo era questionada. Dito isso, foi uma solução boa", afirma Castellini.
O especialista cita uma série de vantagens na transação. A Embraer poderia contar com a estrutura de capital da Boeing para enfrentar uma eventual recessão no segmento, com falta de encomendas.
A brasileira também se beneficia de escala, portfólio de clientes, capacitação na força de vendas e pesquisa. Do ponto de vista dos funcionários, Castellini também vê maior proteção ao emprego sob a Boeing.
"A longo prazo, os empregos dependerão da atratividade do Brasil como destino de produção industrial. Se o país não for capaz de gerar empregos, mesmo que a Embraer continuasse independente, ela iria quebrar", diz o especialista.
Na área tecnológica, a Embraer ganha porque vinha tendo dificuldade de se manter atualizada devido ao enxugamento do apoio governamental para investimentos na área, segundo Glauco Arbix, professor titular da USP e co-coordenador do Observatório da Inovação do IEA (Instituto de Estudos Avançados).
"A Boeing tem uma simbiose com o governo americano na área militar e com universidades na área civil. O acordo com a americana poderia trazer respiro à Embraer, que talvez tenha encontrado uma forma de sobreviver."
Arbix receia o enfraquecimento da Embraer como motor da cadeia de fornecedores do setor aeronáutico brasileiro.
"É difícil imaginar que a Boeing terá controle de 80% e vá utilizar fornecedores brasileiros. Acho que a construção de um setor robusto aeronáutico no Brasil ficou postergada ou terá mais dificuldade. A Boeing vai pegar o filé mignon da Embraer, sua engenharia, que é forte e invejada no mundo todo", afirma.

quinta-feira, 5 de julho de 2018

Contra os monopólios, a abertura - EDMAR BACHA, O Globo



O GLOBO - 30/06

O próximo presidente deve anunciar logo após sua posse um amplo programa de abertura do Brasil à economia mundial


Nossas elites defendem com unhas e dentes os monopólios de bens e serviços através dos quais exploram os trabalhadores e os consumidores brasileiros.

Três exemplos recentes ilustram essa afirmação. Documento preparado pela Confederação Nacional da Indústria para os presidenciáveis defende uma política de comércio exterior com reforço dos mecanismos de defesa contra as importações. Ofícios da Ordem dos Advogados do Brasil advertem a Eletrobras e o BNDES para não contratarem escritórios de advocacia estrangeiros. Liminar do ministro do Supremo Ricardo Lewandowski proíbe a venda de empresas estatais sem prévia anuência do Congresso.

Os exemplos se multiplicam. Os ruralistas há tempos impedem a importação de bananas do Equador, café robusta do Vietnã, alho da China. A Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) se insurge contra a proposta da equipe econômica do governo de reduzir as tarifas sobre bens de capital importados etc.

Essas manifestações caracterizam a atitude de nossas elites empresariais e corporativas de que podem continuar a explorar os brasileiros, contratando-os a salários baixos e vendendo-lhes bens e serviços caros e ruins, sem preocupar-se em gerar empregos melhores, com produção de qualidade para ser exportada. “Nossas” elites incluem as subsidiárias das empresas multinacionais que aqui se instalam para explorar o mercado interno, mas não reproduzem a experiência de suas congêneres na América do Norte, Europa e Ásia, que atuam de forma integrada nas cadeias mundiais de valor.

São poucos os países que desde a Segunda Guerra Mundial evoluíram da renda média e são hoje países ricos, mas todos chegaram lá através de uma integração crescente com o comércio internacional: Austrália, Cingapura, Coreia do Sul, Espanha, Hong-Kong, Irlanda, Israel, Grécia, Noruega, Portugal, Nova Zelândia, Taiwan. São países pequenos comparados com o Brasil, mas recentemente temos o exemplo da China, hoje o segundo maior PIB do mundo graças à decisão de Deng Xiaoping em 1978 de abandonar o maoísmo e abrir a economia para o comércio e o investimento internacionais.

A experiência desses países confirma que crescimento econômico deriva de aumento da produtividade e este de empresas que participam ativamente do comércio internacional. A razão é que ganhos de produtividade são gerados por empresas com acesso a tecnologia de última geração; com ampla escala de produção para reduzir os custos unitários; que se especializam em bens e serviços em que são mais competitivas; e que atuam num regime de concorrência indutor da inovação e da seleção empresarial.

As economias maiores que o Brasil são também grandes exportadoras. Já o Brasil tem 3% do PIB mundial, mas suas exportações alcançam apenas 1,1% das exportações mundiais. Um gigantinho em termos de PIB, o Brasil é um anão em termos de exportações. O que se constata nas exportações se repete nas importações. A parcela das importações no PIB brasileiro é de apenas 14%. Exceto por Nigéria e Sudão, esse é o menor valor entre todos os 160 países para os quais o Banco Mundial tem dados.

Impõe-se mudar esse estado de coisas e para isso é necessário confrontar as elites que travam uma maior integração do país ao comércio internacional. O próximo presidente deve anunciar logo após sua posse um amplo programa de abertura do Brasil à economia mundial. Um programa que reduza ou elimine a cornucópia de medidas protecionistas que hoje impede a geração de bons empregos e a melhoria do bem-estar da população: tarifas elevadas sobre bens industriais importados; proibições à importação de bens agrícolas; restrições à importação de serviços bancários e à contratação de profissionais estrangeiros; limitações à presença de empresas estrangeiras em diversos setores; requisitos de conteúdo nacional; preferências para compras governamentais; barreiras portuárias e alfandegárias.

A retomada de um crescimento econômico vigoroso tem mão dupla por estar associada a uma maior integração do Brasil ao comércio internacional. Ela implica um aumento substancial tanto das exportações como das importações no PIB do país. É abrir e abrir, não cabe um dilema hamletiano nesta questão.

Edmar Bacha é economista