terça-feira, 31 de outubro de 2017

Oposição e aliados de Alckmin se unem contra teto de gasto em SP, Cruzeiro do Sul


 
   
Em momento raramente visto na Assembleia Legislativa paulista, servidores públicos, deputados do governo e da oposição se uniram contra um projeto que estabelece um teto de gastos para o Estado de São Paulo.

A forte reação dos deputados de São Paulo nesta quinta (26) sinaliza que o discurso sobre a necessidade de um ajuste fiscal convenceu o Congresso Nacional, mas está longe de obter o mesmo consenso na esfera estadual.

O discurso mais contundente partiu do líder do governo de Geraldo Alckmin, deputado Barros Munhoz (PSDB), que qualificou o projeto de "burro" e defendeu a suspensão do texto por um mês para discussão.

Capitaneada pelo PT, a oposição apoiou o líder do governo e questionou a necessidade da adoção de um limite de gastos por um governo cujas contas estão sob controle. São Paulo tem dívida de cerca de de R$ 230 bilhões.

"O envio do PL [projeto de lei] para esta Casa foi a maior burrice que já vi na minha vida", disse Munhoz, ao se referir aos três anos em que servidores estão sem reajuste.

O projeto determina que as despesas correntes primárias do Estado (que incluem salários, gastos com saúde, segurança e educação) não podem crescer acima da inflação por pelo menos dois anos.

O crescimento dos gastos segue hoje a inflação mais o PIB (Produto Interno Bruto).

A trava excluiria apenas despesas obrigatórias, como as transferências constitucionais aos municípios, além de gastos com investimentos e o pagamento de juros.

O limite de gastos foi uma imposição do governo federal, quando, em meio à recessão, no fim de 2016, aceitou renegociar a dívida dos Estados, alongando por 20 anos o pagamento à União.

Em apresentação aos deputados, o secretário da Fazenda estadual, Helcio Tokeshi, lembrou que a arrecadação do de São Paulo recuou ao nível de 2010, enquanto a renegociação da dívida teria economizado R$ 14,2 bilhões em juros entre 2016 e 2017.

Segundo a Fazenda, o teto não representaria riscos ao pagamento de salários, já que a proposta de orçamento para 2018 estaria R$ 5 bilhões abaixo do limite. A não aprovação do projeto, no entanto, impediria o Estado de contratar novas operações de crédito e dificultaria a liberação de operações já contratadas, no valor de R$ 4,5 bilhões.

O projeto tem até o fim do ano para ser apreciado. Questionado se o governo teria um plano B, Tokeshi não respondeu à reportagem. (Folhapress)

Abordagem do Estado em São Paulo vai de "fisco-policial" para "fisco-cidadão", Conjur

OPINIÃO


O projeto de lei do Programa de Estímulo à Conformidade Tributária do Estado de São Paulo foi enviado para a Assembleia Legislativa em 13 de setembro (PLC 25/2017). O programa apresenta uma série de inovações e foi reconhecido por vários articulistas por seus méritos[i], mas como não poderia deixar de ocorrer gerou dúvidas e até desconfiança de alguns quanto a suas intenções. Este artigo se propõe a analisar a fundamentação teórica do projeto, fazer um paralelo com a experiência internacional e esclarecer alguns pontos que geraram dúvidas e críticas[ii].
Inicialmente é interessante ter em mente que os princípios básicos do projeto estão alinhados com as recomendações da Ferramenta de Avaliação de Diagnóstico de Administração Tributária (TADAT)[iii]. Trata-se de uma ferramenta difundida pelo Fundo Monetário Internacional que visa o desenvolvimento das Administrações Tributárias no mundo todo. Tais princípios estão comentados abaixo:
  1. Integridade da base de dados do contribuinte inscrito –a avaliação da divergência entre escrituração e documentos emitidos ajuda a identificar e corrigir inconsistências;
  2. Avaliação do risco de conformidade no sistema tributário – ao incorporar a cadeia de fornecedores no processo de classificação o modelo ajuda a propagar boas práticas e diminui o risco de conformidade de forma sistêmica;
  3. Apoio à conformidade voluntária – o uso de incentivos a conformidade previstos no projeto de lei é a maior inovação do modelo;
  4. Extensão do preenchimento das obrigações acessórias de restituição e aproveitamento de crédito – o sistema facilita o cumprimento das obrigações para os níveis de risco mais baixos;
  5. Extensão do pagamento das obrigações – o sistema avalia não só um contribuinte, mas toda a cadeia produtiva;
  6. Precisão de relatórios – a divulgação e transparência da classificação ajuda a melhorar a precisão dos relatórios;
  7. Adequação da resolução do contencioso administrativo fiscal – o emprego de procedimentos adequados a cada segmento melhora o processo de solução de litígios;
  8. Eficiência da administração tributária – a alocação de pessoal, sistemas e outros recursos para os casos com menor conformidade aumenta a eficiência do sistema com um todo; e
  9. Nível de responsabilização e transparência – a divulgação das classificações e o diálogo com as partes interessadas são pilares do projeto.
A proposta também está alinhada com o preconizado pela USAID (2013)[iv], de que estratégias eficazes de fiscalização executam cinco ações:
  1. Identificar o grupo-alvo (agrupado por tamanho e comportamento) para determinar as prioridades da Administração Tributária, levando em consideração os contribuintes, os contadores e outros terceiros envolvidos na facilitação da conformidade tributária – O modelo prevê a segmentação não só dos contribuintes, mas a adequação da estrutura da administração tributária alocada a cada segmento;
  2. Determinar exatamente o que os contribuintes necessitam, através de entrevistas, pesquisas e outros procedimentos de coleta de dados – o modelo tem passado por consultas públicas, além de diversos debates com entidades empresariais e com instituições acadêmicas;
  3. Estabelecer uma cultura organizacional que apoie a prestação de serviços aos contribuintes, com missão, visão e objetivos focados em "receita" e "serviço" – esta é uma etapa interna de implantação do modelo de conformidade, que está em andamento;
  4. Implementar um conceito de estratégia de serviços focado em stakeholders externos, usando canais de comunicação como Internet, e-mails, SMS, quiosques interativos, telefone, cartas, distribuição em massa e atividades de divulgação – o modelo foi divulgado para a imprensa, foi usada a internet e há um esforço claro em criar canais de atendimento adequados; e
  5. Implementar um conceito de estratégia de serviços focado nos stakeholders internos – o treinamento e a criação de estratégias específicas por segmento de contribuintes busca a adequação a este quesito.
No processo de consulta pública, vários melhoramentos[v] foram incorporados ao projeto, alguns tratando inclusive de itens que foram objeto de dúvidas e críticas de especialistas, merecendo especial atenção os critérios de segmentação de contribuintes:
  1. Obrigações pecuniárias tributárias vencidas e não pagas (Conformidade) – A versão enviada à Assembleia[vi], refletindo as sugestões recebidas no processo de consulta pública, passou a excluir desta apuração “os créditos tributários com exigibilidade suspensa ou objeto de garantia integral prestada em juízo, ou de pequeno valor fixado em regulamento”. Mesmo que esta previsão não seja suficientemente abrangente na visão de alguns, o projeto ainda pode sofrer alterações para contemplar outras situações ou eventual decisão judicial em caso especifico pode excluir outros créditos da apuração. Além disso, a previsão de existência de regulamento pode contemplar outras situações, em que a exigibilidade seja considerada suspensa, em conformidade com a previsão legal.
  2. Aderência entre a escrituração e os documentos fiscais emitidos pelo contribuinte (Consistência) – neste caso algumas críticas estimam que o fisco será incapaz de tratar inconsistências e identificar divergências. A partir desta crítica e de outras sugestões recebidas no processo de consulta pública foi fixado um percentual de 98% de divergência para fazer parte do grupo “A+”. No entanto, as divergências por problemas de software e data base de apuração tendem a ser eliminadas pelo processo de integração de plataformas de dados, restando casos de efetivo desvio por parte do contribuinte em relação a legislação.
  3. Perfil de fornecedores do contribuinte (Conformidade da cadeia) –neste caso as críticas concentram-se na suposta ilegalidade em relação a divulgação da situação fiscal de uma contraparte. No entanto, para conhecer a situação de qualquer empresa basta consultar o CNPJ da empresa no site do referido ente da Administração Tributária. O argumento que esta classificação não poderia ser implementada pois implicaria em se atribuir os efeitos dos atos de uma empresa a outra também não parece adequado. Se acolhido, uma empresa poderia aceitar mercadoria roubada[vii], produzida com trabalho escravo[viii] ou infringindo normas ambientais sem problemas, visto ter sido o ato praticado por um fornecedor. No entanto, todas estas situações são objeto de previsão legal específica, atribuindo inclusive, em vários casos, penalidades à empresa compradora.
Extrapolando o âmbito jurídico, percebe-se claramente que a atuação de empresas âncora é um dos maiores difusores de boas práticas e conformidade em cadeias de fornecedores.Isso pode ser observado em programas de qualidade, pela observância das normas ISO e ABNT por fornecedores, no gerenciamento de ativos conforme as normas do IAM - Institute of Asset Management[ix], entre outras iniciativas.
As empresas com melhores classificações além dos incentivos à conformidade fiscal especificados no projeto tendem a ter melhor reputação e avaliação de risco de crédito, especialmente por fazerem parte de uma cadeia produtiva mais estável e confiável, de forma análoga a existente em processos de certificação de qualidade.
O estimulo à conformidade nas cadeias de fornecedores é um dos principais pontos positivos do projeto. Esta abordagem é aderente ao desenvolvimento de arranjos produtivos locais e cadeias produtivas no estado de São Paulo, o que é demonstrado por diversos estudos[x] como importante para o desenvolvimento industrial, inovação e melhora do ambiente de negócios. 
Por fim, a incorporação no ambiente tributário de uma perspectiva com controles estruturais que busque uma estratégia colaborativa entre fisco e contribuintes, aproxima o fisco de São Paulo das melhores práticas da Administração para construção da confiança em relacionamentos interorganizacionais[xi], com a criação de canais de diálogo, aumento da frequência de comunicação, preferência pela solução de divergências sem o uso de penalizações desnecessárias, favorecendo a conformidade fiscal voluntária e melhorando o ambiente de negócios. A proposta, com todas estas inovações, tem o potencial de trazer grandes benefícios para o contribuinte, a sociedade e a administração pública. Trata-se de uma verdadeira mudança, uma disrupção no formato de atuação da Administração Tributária evoluindo de uma abordagem “fisco-policial” para uma abordagem “fisco-cidadão”[xii], moderna, transparente e eficiente.
Este artigo é de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, opinião, estratégia e posicionamento da Secretaria da Fazenda de São Paulo e do BNDES sobre o assunto.

A escalada da violência, Nexo

O ano de 2016 foi marcado por 61.619 mortes violentas no Brasil, um número que inclui roubos seguidos de assassinatos, crimes passionais, mortes causadas por policiais e disputas entre criminosos. É um aumento de 4,7% em comparação com 2015, e o maior patamar da série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma entidade que reúne pesquisadores e policiais e que compila desde 2007 anuários da violência com base em registros de ocorrências do país inteiro. A taxa de mortes violentas para cada 100 mil habitantes também é a maior já registrada: foram 29,9, uma alta de 3,8%. As vítimas são na maioria das vezes homens negros, jovens e moradores das periferias. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública destaca que o número de mortes em 2016 equivale ao número daquelas causadas pela bomba nuclear que dizimou Nagasaki em 1945 no Japão. No primeiro semestre de 2017, a Guerra da Síria, por exemplo, custou 5.381 vidas de civis. Veja abaixo quatro pontos que ajudam a compreender o aumento das mortes violentas no Brasil em 2016. AS MORTES EM NÚMEROS     Violência está avançando no interior O Fórum Brasileiro de Segurança Pública destaca que as mortes nas capitais tiveram uma redução de 4,3%, atingindo 14.557 vítimas. Isso não ocorreu de maneira uniforme: Belém, Recife e Rio de Janeiro, por exemplo, tiveram alta no número de mortes em comparação com 2015. Mesmo assim, os números apontam que o aumento do número de vítimas no geral é puxado por cidades do interior. Em entrevista ao Nexo, a consultora sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Olaya Hanashiro afirma que a violência tem aumentado em cidades de pequeno e médio porte, principalmente no Nordeste, mas que isso também ocorre no interior de outras regiões do país. Ela avalia que a falta de equipamentos públicos adequados, e não só a falta de forças de segurança, podem levar à escalada de conflitos e gerar violência. “Se vizinhos brigam por um terreno que não está legalizado e não houver a presença do Estado como mediador de conflitos, provavelmente eles vão resolver a desavença entre eles.” Ela também avalia que a crise penitenciária, em que grupos como PCC e Comando Vermelho entraram em embates em prisões de diversos estados do país, indica o fortalecimento do crime organizado também no interior. Em entrevista concedida em março de 2016, o economista Daniel Cerqueira, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) afirmou que o aquecimento da economia brasileira nos anos 2000 pode ter impulsionado inclusive mercados ilegais no interior. “Na década de 2000, a renda cresceu muito. Muita cidade pequena que não tinha renda passou a ser um mercado viável para as drogas, o que traz consigo a violência”, afirmou. Mais roubos, mais latrocínios O número de roubos seguidos de morte teve uma forte alta nos últimos anos. Foram 2.514 em 2017, um número 14% maior do que o do ano anterior, e 64% maior do que o de 2008.  MORTES EM ROUBOS   Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o diretor executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques, avaliou que esse aumento das mortes em latrocínios é uma consequência do número maior de roubos no geral. “O latrocínio é um tipo de crime contra o patrimônio, não à toa as polícias falam que é o roubo que deu errado. Aumentando o roubo, como vimos em 2016, o latrocínio também vai crescer, gerando esses dados espantosos”. Mesmo com a alta, o número de registros de pessoas mortas por criminosos em roubos não representa nem 60% das mortes causadas por policiais. Polícia responde por 6,9% das mortes Policiais civis e militares, em serviço ou em horário de folga, responderam por 4.224 mortes em 2016. O número corresponde a 6,9% de todas as mortes violentas intencionais no Brasil em 2016, uma proporção inédita desde que esse tipo de levantamento pelo FBSP começou a ocorrer, em 2012. O perfil das vítimas da letalidade policial é similar ao de outros anos: 99,3% são homens, 81,8% têm entre 12 e 29 anos e 76,2% deles são negros. POLICIAIS RESPONDEM POR 6,9% DAS MORTES   Segundo Hanashiro, “se comparamos com qualquer métrica internacional ou com o número de policiais feridos em atividade, temos um número desproporcional”. Ela diz que é possível que parte da violência policial letal seja um último recurso para se proteger, e que esteja dentro da legalidade, mas “vemos por esses números que há alguma coisa errada”. A pesquisadora avalia que há uso irregular da força policial, sem passar por todas as regras de abordagem, e que há casos de execuções. Embora em proporção muito menor do que as mortes que eles causam, os policiais também são vitimados em grande número. “Temos a polícia que mais mata e mais morre, o que indica que as instituições não estão conseguindo viabilizar uma situação adequada para os profissionais” Houve em 2016 437 mortes de policiais, uma alta de 17,5% em relação ao ano anterior. Desses profissionais, 56% eram negros, 43% eram brancos e 1% pertencia a outras categorias. POLICIAIS SÃO VITIMADOS A maior parte das mortes, 268 no total, ocorreu quando os policiais estavam fora de serviço, uma realidade que se repete na maior parte do país. Segundo Hanashiro, é comum que policiais façam bicos como seguranças privados, se expondo à violência também nas horas vagas, mas sem o apoio da corporação. Além disso, muitos têm o costume de andar armados, o que faz com que sejam alvo de violência letal quando são identificados em assaltos, por exemplo. “Tem uma cultura de o policial achar que tem que agir 24 horas por dia e reagir a um assalto, mesmo quando não está trabalhando e não tem apoio”, afirma Hanashiro. Falta de política pública Apesar dos dados alarmantes, há poucas iniciativas estruturadas para reduzir a violência letal no Brasil, ao contrário do que aconteceu, por exemplo, no que diz respeito à ampliação do acesso à saúde e no combate à pobreza. Hanashiro destaca que houve em 2016 uma queda de 12,6% no número de armas apreendidas, mesmo sem haver indícios claros de que o número de armas em circulação tenha diminuído. Quando se somam gastos de União, estados e municípios houve uma redução de 2,6% nas despesas públicas com políticas de segurança pública, que totalizaram R$ 81 bilhões no total. Entre as políticas que tiveram aumento dos recursos esteve a convocação da Força Nacional, uma instituição sob comando do Ministério da Justiça formada principalmente por policiais militares, bombeiros, e policiais civis oriundos de forças estaduais. A Força Nacional costuma ser mobilizada para atender situações de crises na segurança pública dos estados. Segundo o Fórum, houve aumento de 292% no número de profissionais mobilizados em 2016, e gastos de R$ 319,7 milhões. Para Hanashiro, assim como a convocação das Forças Armadas, essa é, no entanto, uma política custosa e paliativa, que não se reverte em ganhos de segurança pública no longo prazo. A pesquisadora avalia que uma política estruturada precisaria contar com uma coleta melhor de dados pelo governo que permitiria criar políticas públicas e adaptá-las conforme o cenário muda, e que é preciso dar menos ênfase às forças de segurança. “De maneira geral, a questão da segurança pública tem um custo político muito alto. Ninguém gosta de chamá-la para si”, afirma Hanashiro. Em entrevista concedida em junho de 2017 ao Nexo, a advogada e consultora em segurança pública Isabel Figueiredo afirmou que acredita que a questão da violência letal não é priorizada porque “quem morre neste país é jovem, negro e homem, e é como se a morte dessa parcela da população não representasse um problema político grande para os governos”.