sábado, 22 de março de 2014

Horizonte árido (Alias, Benedito Braga)

'Questão de natureza política, a água deve ter agenda própria com leis, infraestrutura e campanhas para consumo consciente', diz engenheiro

22 de março de 2014 | 16h 00

Juliana Sayuri
Secou. Desta vez, faltaram as águas de março fechando o verão. O Cantareira, principal reservatório a hidratar a Grande São Paulo, marcou 14,5% de volume armazenado na sexta-feira, cravando novo recorde negativo desde 1974. São Pedro não colaborou desde dezembro, o cidadão abusou, o político tergiversou e, no fim, São Paulo poderá amargar dias mais secos neste outono.
Na véspera do Dia Mundial da Água, 22 de março, indiana caminha numa tempestade de areia - Anupam Nath/AP
Anupam Nath/AP
Na véspera do Dia Mundial da Água, 22 de março, indiana caminha numa tempestade de areia
"Política é a arte de firmar compromissos. Nesse campos ambientais, isso é muito difícil - Kyoto está aí pra não desmentir ninguém", afirma Benedito Braga, engenheiro civil, Ph.D. por Stanford e professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. "No limite, é competência da cidade. Está na Constituição: prover água é prerrogativa constitucional das prefeituras. Seria do governo do Estado se estivéssemos discutindo obras. Mas agora, para resgatar o Cantareira, nem adianta correr atrás de obras, que ficariam prontas em talvez três anos - e até lá já teríamos morrido de sede", critica. Que fazer? "Racionar. É a única saída. Não me refiro ao rodízio, que fique claro: racionar é consumir menos que o usual."
Ex-diretor da Agência Nacional de Águas, Braga preside desde 2012 o World Water Council, um think tank que reúne Nações Unidas, scholars, técnicos, políticos, executivos e ativistas. "Precisamos compreender que água é uma questão de ordem política. Para mudar e melhorar essa situação, é preciso discutir alternativas, ideias inovadoras, soluções inteligentes", diz. Que essa fonte não seque.
A questão da água está sendo muito discutida nos últimos dias, com a situação do Cantareira. Água é uma pauta política?

Fiz uma palestra nessa semana e, num dos últimos slides, mostrei três caracteres chineses. O primeiro simboliza "rio". O segundo, "dique". E o terceiro, que seria a soma dos dois? Logo se imagina que seria "reservatório" ou algo assim, mas não. É "ordem política". Nossos governantes já notaram isso. No Nordeste, todo político considera a questão da água. No Sudeste, até estes tempos, só discutíamos as inundações. Agora, diante desse quadro do Cantareira... Os políticos precisam compreender que a água deve estar na pauta, com orçamento e tudo mais, pois isso pode lhes custar as eleições. Política é a arte de firmar compromissos, formar consensos, resolver problemas. É muito difícil formar consensos nesses campos - Kyoto está aí pra não desmentir ninguém. A água permeia diferentes setores, como agricultura e energia, mas precisa de uma agenda própria - senão, cada setor faz o que bem entende, desperdiça recursos hídricos cá e lá, falta água... E aí? É uma questão de natureza política. O cidadão pode ajudar? Certamente. Elegendo políticos que tenham uma plataforma coerente. E, francamente, o único sinal que políticos realmente entendem é o voto. Se o cidadão compreender que a água é um tema tão importante quanto a saúde e a educação, o político também deverá compreender.
Cantareira é um bom sistema?
Sim. Foi idealizado por Eduardo Yassuda, professor brilhante da Poli. No início da década de 1970, ele disse: "São Paulo não pode resolver o problema da água com soluções pequeninas. Precisa de soluções de gente grande". Aí começou a procurar mananciais, Guarapiranga, Tietê, Taiaçupeba, Paraitinga, Ponte Nova. E viu que precisaríamos trazer água do outro lado da serra. Construíram esse sistema, que tem 800 milhões de metros cúbicos de armazenamento, uma vazão que, à época, supria toda a água de São Paulo. Foi uma boa ideia. Mas agora a situação é grave. Não interessa a quem culpar - a variabilidade do clima, o político, a Lua e o planeta Saturno. É tudo junto. Há uma falha na oferta - São Pedro não foi generoso neste verão. E uma falha na demanda - as pessoas não notaram a gravidade da situação e continuaram consumindo como sempre. E a infraestrutura não acompanhou o crescimento da demanda. Agora estão considerando usar o tal volume morto. O que é isso? Se você construir uma obstrução para armazenar água, esse volume contém sedimentos em suspensão. Reservamos um espaço no fundo do reservatório para depositar esse sedimento - e o sistema continua funcionando. O que a Sabesp tem? Tomadas de água, em diferentes alturas. Quando o nível do reservatório está alto, as duas tomadas funcionam. Vem a seca, uma das tomadas não funciona mais. No limite do volume morto, não há mais nada. O nível baixa e baixa, até que uma hora só há sedimentos e não dá para tirar mais nada. É uma alternativa viável do ponto de vista técnico. Mas não é a solução. A solução é parar de usar tanta água.
Racionar.
Racionar, mas não como a maioria imagina. Racionar é consumir menos que o usual. Há duas formas para isso. Primeiro, um rodízio, fechando e abrindo registros em diferentes setores das cidades. Segundo, um racionamento com medidas não estruturais, com bônus para quem economizar, multas para quem extrapolar. Isso deve ser feito por uma lei municipal.
Isso não é responsabilidade do governo do Estado?
Não. A competência legal é do município, nas esferas do Executivo e do Legislativo. Está na Constituição: prover água potável e saneamento é uma prerrogativa constitucional das prefeituras. Se estivéssemos discutindo obras, seria o governo do Estado. Neste momento, nem adianta correr atrás de obras. Eles estimam 18 meses, mas na verdade só ficariam prontas em dois, talvez três anos - e até lá já teríamos morrido de sede. O Estado dá concessão à Sabesp. Mas São Carlos, no interior, não usa Sabesp - e sim o Serviço Autônomo de Água e Esgoto São Carlos (SAAE); Limeira, também no interior, não usa Sabesp, mas a Foz do Brasil/Odebrecht. Diante de qualquer problema, a responsabilidade primeiro é da companhia, mas, no fim, é do prefeito. Que poderia passar uma lei municipal dizendo o seguinte: estamos vivendo uma situação muito grave e, por isso, cada domicílio terá um limite de consumo de 20 metros cúbicos por mês, com tarifa de R$ 10. Se ultrapassar, a tarifa passa a R$ 100. É uma forma de regular o uso, pois o cidadão que estava acostumado a pagar R$ 90 e vê a conta saltar para R$ 500 certamente freará o consumo. No mês seguinte, pode apostar que todas as torneiras vão estar fechadas, o cara não vai mais lavar calçada e não vai demorar no banho. Esse é o racionamento que deveria ser feito, obviamente acompanhado por uma campanha de conscientização para dizer: "Meu amigo, você não será pego de surpresa. Preste atenção, economize água". É melhor que o rodízio.
Por quê?
Imagine uma tubulação, com juntas para outras tubulações. Quando os tubos estão cheios, ainda há perda de água na linha - eram 35%, agora são 25%. Quer dizer que há vazamentos no sistema. Quando o sistema está pressurizado, a água corre. Quando despressuriza, a água para e entra no solo, misturando-se e voltando às tubulações uma água de qualidade desconhecida. Por isso, o rodízio não é bom. Ainda dá tempo de racionar, mas nossos governantes precisam agir. Na seca, acontecerá o racionamento por rodízio, pois não haverá mais tempo hábil para o outro tipo. A Austrália também passou por uma situação grave. Ali foram dez anos de seca, só agora voltou a chover forte. Os australianos fizeram várias usinas de dessalinização e cortaram a água antes usada para irrigação. No nosso caso, o que poderia ser feito? O governo - alçada estadual no caso dos rios Jaguari e Jacareí, com o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE); e federal no rio Piracicaba, com a Agência Nacional de Águas - deveria visitar os lugares de irrigação e dizer: "Meu caro, o que você cultiva aí? Tomate? Pago sua safra, mas você não vai tirar nem um litro a mais de água do rio". Assim, a água deixa de ser destinada a um uso "menos nobre", e fica disponível para o consumo dos cidadãos.
Há um modelo de gestão hídrica no mundo?
Não há um país nota 10 em todos os quesitos. Em termos de uso de água no ambiente urbano, diria Cingapura, que reaproveita quase a totalidade de seus esgotos para consumo doméstico. Cingapura dependia da Malásia e, num esforço para se tornar mais autônoma, investiu num programa de reúso de água fantástico, mas muito caro, da ordem de bilhões de dólares. A Namíbia também tem um sistema de reúso de água potável há 40 anos. Talvez, no futuro, tenhamos que fazer isso em São Paulo: reaproveitar e beber o que era nosso esgoto. Em termos de gestão no ambiente agrícola, Espanha e Israel se destacam. Em termos de gestão de recursos hídricos, a França é um bom exemplo. É só lembrar o Sena, muito sujo há 50 anos, limpo agora. Muito dinheiro já foi investido para despoluir o Tietê - mas sinceramente, nem eu nem meus netos nem meus bisnetos veremos esse rio 100% limpo.
Do ponto de vista cultural, o que precisaria mudar para valorizar esse recurso?
A situação que vivemos agora é exemplar. Pense: quando o brasileiro começou a se preocupar em economizar energia? Em 2001, no tal apagão elétrico. Na ocasião, usamos um método de racionamento melhor, com multa. Na época, eu morava em Brasília. Gastava 1.200 quilowatts/hora por mês, passei para 400. E continuei vivendo da mesma forma, só com mais precauções: lembrar de apagar a luz, tirar a tomada, tomar banhos mais breves. Foi uma situação extrema, mas hoje aprendi: sei meus gastos de energia todo mês. Quem sabe agora o paulistano aprenderá o consumo consciente de água?
Qual é a maior agressão à água?
Poluição, sem dúvida. As metas do milênio estabelecidas pelas Nações Unidas em 2000, para serem cumpridas até 2015, previam reduzir à metade o número de pessoas sem acesso à água potável e ao saneamento improved, quer dizer, "melhorado". Essa expressão foi escolhida propositalmente, pois à época não tínhamos elementos para avaliar os custos para oferecer saneamento para todos. Além da coleta e da disposição de resíduos, precisamos discutir o tratamento do esgoto. Aí realmente a água é agredida. Por exemplo, não podemos viver num ambiente urbano, como nesta região paulistana com um dos metros quadrados mais caros do Brasil, onde o sujeito abre a janela e se depara com o cheiro fétido do Pinheiros. É inadmissível.
Um dia a água valerá mais que o petróleo?
Já vale em certos lugares, como na Arábia Saudita. Ali eles dessalinizam a água do mar - e gastam uma nota, queimando petróleo para poder cultivar trigo no meio do deserto. Há substituto para o petróleo (fontes como a energia hidroelétrica e a nuclear), mas absolutamente nada substitui a água. É um valor capital. A água é muito generosa, pois nos ajuda a crescer: é elemento essencial para sermos cidadãos mais igualitários, pois aumenta nosso desenvolvimento, nossa produção de energia e de grãos. É fundamental para as necessidades essenciais humanas, para o desenvolvimento econômico, para a sustentabilidade ambiental e, certamente, para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.
O sr. se considera otimista ou pessimista?
Um otimista inveterado. Um dia, haverá água para todos, desde que sejamos suficientemente inteligentes para gerenciá-la. Há água na região metropolitana de São Paulo, mas contaminada e poluída. Logo, precisamos de gestão e tecnologia adequadas. Muitos ambientalistas criticam os engenheiros, vistos como "destruidores" da natureza. É a falsa ideia de que a tecnologia é má. Graças à tecnologia, nossa expectativa de vida saltou de 50 para 70, 80 anos. Quem, como Malthus, previu cataclismos, até agora deu com os burros n'água. Há, sim, diversas questões a resolver. E, para resolvê-las, acredito na tecnologia e, principalmente, no ser humano. 

O governo não é perdulário


Sou intransigente defensora da disciplina fiscal por parte do governo. Sem ela, não é possível impedir a elevação da inflação, o mais injusto dos impostos, pois transfere renda dos mais pobres para os mais ricos, dado que os primeiros não têm como utilizar os mecanismos disponíveis no mercado financeiro para se protegerem da corrosão do poder de compra da moeda.
Da mesma forma, a elevação do deficit público força o Banco Central a aumentar a taxa de juro, o que restringe o investimento e reduz o crescimento econômico.
Exatamente por considerar a política fiscal assunto tão relevante, julgo imperativo que sua análise seja feita com a máxima seriedade, completamente desvinculada de ideologias e de objetivos eleitorais.
Infelizmente, não é o que ocorre no Brasil. Analistas transmitem à população, por meio da imprensa, a ideia de que o gasto público cresce em razão do comportamento perdulário do atual governo. Mordomias, passagens aéreas, gastos com publicidade, benesses aos funcionários públicos e o custeio da inchada máquina administrativa são os vilões preferidos.
Nesse sentido, maior austeridade e choque de gestão são as palavras mágicas. Não seria sensato ser contra a melhora da eficiência da administração pública, mas não se pode vender ilusão. Isso não resolveria o problema fiscal brasileiro.
Segundo dados coletados por reconhecidos especialistas em contas públicas, o dispêndio da União com pessoal (incluindo os inativos do regime estatutário) e com o custeio da máquina administrativa -exceto educação e saúde- era de 5,9% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2002, último ano da gestão Fernando Henrique Cardoso. No ano passado, caiu para 5,1% do PIB.
Não é justo chamar de perdulário um governo que age assim.
As despesas da União com a Previdência Social e com as políticas sociais aumentaram cerca de três pontos percentuais do PIB, no período 2003-2013.
Na relação destes gastos estão dispêndios com programas que visam a aumentar o bem estar das camadas mais pobres da população e devem ser mantidos, tais como o Bolsa Família, o seguro-desemprego e o Minha Casa, Minha Vida.
Como fazer então para frear o crescimento da despesa primária do governo como proporção do PIB?
De início, sou contra soluções aparentemente fáceis -e socialmente injustas- como cortar drasticamente os gastos sociais.
Creio que o problema deva ser enfrentado por duas linhas de ação.
A primeira é aumentar a efetividade e a vigilância sobre os programas sociais. É preciso saber, por exemplo, por que o Brasil gasta cerca de 2,5% do PIB com pensão por morte, quase cinco vezes mais do que países emergentes com estrutura etária semelhante à nossa.
Também temos que desvendar o enigma do forte crescimento dos gastos com o seguro-desemprego, quando a taxa de desemprego no Brasil alcança nível historicamente baixo.
Precisamos de um amplo debate nacional para, respeitados os direitos adquiridos, ajustar gradualmente a Previdência Social ao aumento da expectativa de vida da população.
Mas, acima de tudo, é hora de elevar a taxa de crescimento econômico. Se isso ocorrer, não haverá necessidade de sacrificar programas sociais para conter o crescimento do gasto público como proporção do PIB.
Para tanto, é preciso continuar acelerando o programa de concessão de infraestrutura, iniciado pela presidente Dilma, além de fortalecer a segurança jurídica e o direito de propriedade.
Há, ainda, que se ampliar o grau de abertura da economia para inserir o Brasil nas cadeias globais de produção e desburocratizar e melhorar o ambiente de negócios de modo geral.
Em resumo, o Brasil precisa aumentar os investimentos em educação e inovação e tecnologia para garantir mão de obra mais qualificada. Não por acaso, a produtividade do trabalhador norte-americano é seis vezes maior que a do brasileiro. Só assim, será criado o ambiente favorável para encorajar o investimento privado.
Isso já ocorreu, de forma espetacular, no setor agropecuário. Por que não poderia se estender para o restante da economia? 
kátia abreu
Kátia Abreu é senadora (PMDB-TO) e a principal líder da bancada ruralista no Congresso. Formada em psicologia, preside a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Escreve aos sábados.

Passarela para bicicletas começa a ser montada na Marginal do Pinheiros


Construção da ciclopassarela tem início neste sábado, às 16 horas; pistas serão interditadas pela CET

21 de março de 2014 | 18h 08

Adriana Ferraz - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Começa a ser instalada neste sábado, 22, uma passarela feita exclusivamente para ciclistas na Marginal do Pinheiros, zona sul da capital. Estão previstas interdições na altura da Ponte Cidade Jardim, sentido Castelo Branco, a partir das 16 horas. A ciclopassarela ligará o Parque do Povo à ciclovia existente nas margens do Rio Pinheiros, em paralelo aos trilhos da CPTM. A previsão é que o acesso passe a funcionar no fim de abril.
A obra faz parte do pacote de contrapartidas determinado na gestão Gilberto Kassab (PSD) para amenizar os impactos provocados pelo Complexo WTorre JK. Erguido no quadrilátero formado pelas Avenidas Presidente Juscelino Kubitschek, Chedid Jafet e a marginal, o conjunto comercial inclui torres de escritórios, o Shopping JK Iguatemi e o futuro teatro JK, em construção no prédio que abrigava a Daslu.
Com 180 metros de extensão, estrutura metálica e laje em concreto, a ciclopassarela terá um vão livre de 50 metros sob as pistas da Marginal do Pinheiros. O método construtivo de viga pré-moldada visa a provocar menos interdições no tráfego e o visual moderno segue o estilo adotado no viaduto construído ao lado pela WTorre como condição para a abertura do Shopping JK, em 2012.
"Será uma intervenção quase que cirúrgica. Com as peças principais montadas, começaremos a fazer os acabamentos para concluir a entrega por volta do dia 28 de abril", disse o superintendente da WTorre, Francisco Caçador. Para proporcionar maior segurança aos ciclistas e motoristas que passam pela região, um guarda corpo em aço, com placas de acrílico de 20 mm de espessura, envolverá toda a estrutura.
Com a obra pronta, quem utiliza a ciclovia da CPTM ganhará mais um acesso, que poderá ser feito diretamente pelo Parque do Povo. Hoje, existem cinco entradas. De acordo com a companhia, o movimento diário na via durante a semana é de 600 ciclistas, número que salta para 4 mil nos fins de semana. O horário de funcionamento ainda não está definido, mas deve seguir as regras de uso da ciclovia da CPTM, aberta diariamente das 5h às 19h30. A via tem 21,5 km.