quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Hélio Schwartsman- Gula obscena, FSP

 É meio escandalosa a decisão do Parlamento de reservar R$ 4,9 bilhões do Orçamento para o fundo eleitoral destinado aos partidos no pleito deste ano. Nas eleições municipais de 2020, a verba foi de R$ 2 bilhões. E vale recordar que isso é só parte da conta. As milionárias despesas com o horário de rádio e TV, por exemplo, são pagas por meio de abatimento nos impostos das empresas de telecomunicações.

Sobre as negociações dos dois novos partidos políticos do Brasil para filiar cerca de 50 deputados federais que envolvem a entrega a eles do comando político das siglas nos Estados e a promessa de um generoso rateio do dinheiro do Fundo Partidário, algo entre R$ 3 e R$ 3,80 por voto recebido pelos congressistas. Os partidos Solidariedade e Pros (Partido Republicano da Ordem Social), que foram chancelados no dia 23 de setembro pela Justiça Eleitoral, vão receber mais de R$ 30 milhões por ano dos cofres públicos em recursos do fundo, que é uma das principais fontes de financiamento das legendas. Diz legenda: "No seu partido ou no meu?"
Charge de João Montanaro, de 2013, sobre repartição de verbas do fundo partidário entre novos partidos - João Montanaro - 27.set.2013/Folhapress

Estou entre os que acham preferível custear pleitos com recursos públicos à situação anterior, em que eram firmas privadas que injetavam o grosso do dinheiro usado nas campanhas. A captura de políticos por interesses particulares ficava muito favorecida. Mas a mudança de paradigma, determinada por uma decisão do STF de 2015, não implica que devamos destinar cada vez mais recursos públicos às eleições, muito pelo contrário.

Penso que as campanhas podem e devem ser muito modestas, franciscanas mesmo. Há uma série de atividades em que a quantidade de dinheiro que é investido impacta na qualidade final. Prédios construídos com materiais mais nobres são melhores que os edificados com acabamento vagabundo; comidas feitas com ingredientes de primeira são mais saborosas que as cozinhadas com itens inferiores.

Esse, porém, não é o caso de eleições. Não importa qual seja o total investido, serão eleitos sempre o mesmo número de governantes e parlamentares. E não há nenhum indício de que gastando mais obtemos melhores representantes. Mais, como a quase totalidade das verbas vêm do fundo eleitoral, uma redução uniforme dos montantes pouco afeta a disputa.

 O plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília, durante a sessão de posse dos parlamentares eleitos
O plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília, durante a sessão de posse dos parlamentares eleitos - Pedro Ladeira - 1º.fev.2023/Folhapress

superdimensionamento das verbas serve principalmente para fortalecer os caciques dos partidos, que viram fazedores de reis, e para dar aos parlamentares que já exercem mandato uma vantagem, a meu ver indevida, sobre candidatos que os desafiem.

O interesse público exigiria a redução do fundo eleitoral, jamais aumentos obscenos.


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