“É a economia, estúpido”, respondeu o marqueteiro de Bill Clinton, James Carville, quando afirmou, contra tudo e contra todos, que George Bush não era invencível. Aqui, a frase é: “É a Constituição, estúpido”!
Um bom conceito de Constituição é: “trata-se de um remédio contra maiorias”. Outro: “é o estatuto jurídico do político”.
Foi a partir do segundo pós-guerra que reinventamos o conceito. A Constituição virou norma jurídica. Tem de ser cumprida.
Dentro da Constituição temos “um quarto do pânico”, onde nos protegemos dos bárbaros. Quando vêm os inimigos, temos as cláusulas pétreas. Não é de qualquer jeito que se pode mudar a Constituição.
As democracias contemporâneas são sólidas porque, fundamentalmente, fazem o filtro da política por meio do direito. Isto é, a política paga pedágio ao direito —às Constituições.
Ninguém na Europa (Espanha, Alemanha, Portugal, França, Inglaterra) pensa em propor golpes ou alterações constitucionais quando surgem crises políticas ou econômicas. Mas aqui, no Brasil, não absorvemos essas conquistas. Por aqui é: quem paga pedágio para a política acaba sendo o direito.
As recentes decisões do Supremo Tribunal Federal tendem a demonstrar que é o direito que pode salvar a democracia. A história mostrará o acerto do STF. Fora do direito, portanto, do respeito à Constituição, não existe salvação.
As democracias fortemente atacadas como a nossa podem ser salvas pelo direito? Para mim, a resposta é positiva. Sou otimista, como o autor de "Fragilie Democracies", Samuel Issacharoff. E isso passa pelo papel das Supremas Cortes, mormente em países periféricos. E o somos.
Nesse ponto, o Brasil é um caso exemplar. Daí a importância da incisiva atuação do Supremo Tribunal Federal. Tanto na pandemia como na preservação da democracia, delimitando os espaços institucionais transpassados constantemente pelo presidente da República.
O presidente, de tanto atravessar o Rubicão, já fez ponte. A questão é saber como lidaremos com isso.
Bolsonaro aposta na desinstitucionalização. Dia a dia. Na degeneração do direito. E, por consequência, naquilo que sustenta a Constituição: o Supremo Tribunal Federal. Por isso a ênfase nas críticas e ataques à Suprema Corte.
Regimes populistas somente se mantêm quando as instituições são fracas. Ou enfraquecidas. Se o discurso golpista vingar, isso mostrará que fracassamos. E ficará claro que o direito, no Brasil, ficou relegado a um desossado braço da política. E, assim, manipulado por quem tem poder. Com tantas faculdades de direito, formamos uma multidão de reacionários e antidemocratas? A ver.
Bolsonaro aposta nisso. Tirando do direito (Constituição) o papel de filtro da política e contraponto do poder, o caminho fica livre para golpismos. Ou o caos institucional. “Vamos enquadrar os ministros”, diz o presidente.
Não fosse por nada, isso pode configurar vários crimes. Até mesmo, a depender dos arroubos do 7 de Setembro, pode configurar crime previsto na lei que recentemente ele mesmo sancionou. Além disso, pode ser coautor intelectual de uma tragédia.
Avisos não faltam. Por isso, permito-me, republicanamente, “dar uma” de assessor de Clinton: “É a Constituição, estúpido”.
É ela que vai nos segurar. Sem o seu cumprimento, você estará como o sujeito que mora com vários inimigos. O que impede que o joguem do 10º andar onde moram? Simples. Uma cláusula que diga que, sob hipótese alguma, estará em jogo qualquer votação que diga respeito à vida e à integridade física da minoria: você. É a cláusula pétrea, estúpido. É a democracia, estúpido. E a dignidade de uma nação!
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