É costume da elite do Sudeste apontar o dedo aos nordestinos para acusar as práticas de coronelismo e clientelismo político. Muitas vezes de forma estereotipada e cheia de preconceitos. Mal sabem que bem aqui, debaixo de nosso nariz, o clientelismo mais arcaico anda à solta há muito tempo.
Nesta segunda (16), em excelente reportagem de Carolina Linhares e José Marques, esta Folha revelou que o governo Doria liberou mais de R$ 1 bilhão em emendas parlamentares em 2021 para atender deputados estaduais, federais e uma senadora. Esse valor refere-se somente às emendas extras, sem contar as que são asseguradas por lei aos deputados estaduais. A soma até julho é seis vezes maior do que os R$ 182 milhões de 2020.
Além de representar uso escandaloso da máquina pública como trampolim à pré-candidatura de Doria à Presidência —inclusive para influenciar nas prévias de seu partido— e de Rodrigo Garcia ao governo estadual, a operação desvela um modus operandi do PSDB que ajuda a explicar sua permanência no poder de São Paulo por 25 anos.
É o clientelismo tucano, conhecido como política do cafezinho. Anularam ao longo dos anos a capacidade de planejamento regional, hoje terceirizada a consultorias ligadas à Fipe e à FGV, o que teve como ápice a extinção da Emplasa por Doria em 2020. Esvaziaram as gerências regionais, que deveriam fazer a interface com os 645 municípios do estado para mapear as demandas e distribuição orçamentária, centralizando todas as definições no Palácio dos Bandeirantes.
Com isso, consagrou-se o padrão da relação clientelista com os prefeitos e deputados, liberando a conta gotas verbas para as regiões em troca de apoio à eleição do candidato tucano ao governo, em encontros regados pelo famoso cafezinho. O preço disso é o desmonte de um planejamento de políticas públicas que considere as vocações e carências de cada região e viabilize um projeto de desenvolvimento econômico e social para o estado mais rico do país. Não por acaso, São Paulo está há tempos numa inércia sem rumo nem ousadia.
Sem citar a falta de transparência. É simbólico que os jornalistas que revelaram a farra das emendas tenham sido obrigados a trabalhar a partir de 5.000 folhas de papel. São Paulo não tem até hoje uma Controladoria, mas tem 26 mil cargos comissionados, de indicação política, em vez de abrir concurso para servidores de carreira. Quem assinou a ficha de filiação do PSDB em 1995 tem mais estabilidade que qualquer servidor concursado.
Estamos falando do estado que representa 30% do PIB e tem orçamento de R$ 250 bilhões. Passa da hora de jogar luz nas engrenagens mofadas do poderio tucano em São Paulo.
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