Os brasileiros poderiam gastar um terço do valor que pagam hoje na conta de luz com o uso de geladeira caso o país adotasse o padrão de eficiência energética recomendado pela ONU (Organização das Nações Unidas), aponta uma pesquisa do Instituto Escolhas.
Hoje, o custo médio mensal com uma geladeira é de R$ 45,50. Caso o padrão da ONU fosse adotado, esse valor cairia para R$ 15,40 —uma economia de R$ 30,10 por mês ou de, ao menos, R$ 360 no ano. Entre 2021 e 2030, isso significaria uma redução total de R$ 101 bilhões na conta de luz dos brasileiros.
A classificação energética em vigor hoje, sob responsabilidade do Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia), foi implementada em 2006 e está defasada há mais de dez anos, segundo o instituto.
Nesse padrão, as etiquetas vão de A (mais eficiente no consumo de energia) até E (menos eficiente). Embora todas as geladeiras comercializadas no Brasil hoje tenham selo A, como a exigência para obter esta nota está defasada, a economia na conta de luz ficou menor.
“Naquele momento [em 2006, quando o padrão atual foi implementado], a ideia era ajudar o consumidor a escolher. Como é um dos itens que mais consome energia dentro de casa, serviu de fato para auxiliar o consumidor, mas está defasado faz tempo”, diz Clauber Leite, coordenador do programa de Energia do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).
Para fazer essa comparação, a pesquisa analisou três cenários. No primeiro, o padrão atual de etiquetagem do Inmetro é mantido. No segundo, o padrão estabelecido pela ONU, conhecido como U4E, é avaliado. No terceiro, a pesquisa considera a proposta de atualização do Inmetro, que está em discussão.
Caso o padrão da ONU fosse adotado, o gasto mensal com uma geladeira na conta de luz cairia dos atuais R$ 45,50 para R$ 15,40. No cenário em que a proposta do Inmetro é implementada, a redução é menor, para R$ 27 (diferença de R$ 18,50).
Assim, entre 2021 e 2030, a proposta do Inmetro significaria uma economia total de R$ 16,4 bilhões para os consumidores, avalia a pesquisa do Instituto Escolhas, o que equivale a apenas 18% da economia propiciada pelo padrão da ONU, de R$ 101 bilhões.
Além da etiquetagem, o Instituto Escolhas aponta que há um problema na política brasileira de incentivos para geladeiras mais eficientes.
Desde 2013 quem oferece produtos que geram mais economia paga 10% de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) em vez de 15%, alíquota que vale para o restante da indústria. A ideia original era de que os recursos conseguidos com a redução do imposto fossem investidos no aprimoramento dos produtos.
No entanto, como os refrigerados já estão dentro da melhor categoria do Inmetro, as empresas não têm motivo para investir, beneficiando-se apenas da isenção, diz Rafaela Silva, coordenadora de projetos do Instituto Escolhas.
“Com os mesmos padrões de 2006, não existe incentivo para melhoria. Quem ganha é a indústria, enquanto o governo perde em arrecadação e os consumidores ficam com uma conta de luz mais alta”, afirma Silva.
A proposta do Inmetro, atualmente em consulta pública, é dividida em três fases, explica Danielle Assafin, coordenadora do PBE (Programa Nacional de Etiquetagem) do Inmetro.
Na primeira fase, serão estipuladas três subcategorias: A+, A++ e A+++, sendo esta última 30% mais eficiente do que a etiqueta A na classificação atual. Na segunda fase, a partir de 2027, uma nova norma técnica, hoje em elaboração, entrará em vigor.
Por fim, em 2030, na terceira etapa, novas etiquetas poderiam ser implementadas segundo outros critérios para além da eficiência energética (como emissão de poluentes, por exemplo).
Na avaliação de Rafaela Silva, do Escolhas, a proposta do Inmetro tem limitações porque considera padrões mais brandos do que os estabelecidos pela U4E —e sem uma justificativa.
“O mercado no Brasil é constituído, em sua maioria, por multinacionais, que já têm essa tecnologia em países com regulamentação mais rígida, e podem colocar em prática aqui”, afirma Silva.
Leite, do Idec, classifica a demora de atualização da classificação como "inaceitável". “Entendemos a dificuldade do Inmetro, mas o país tem condições de produzir essa tecnologia aqui, e não é algo complexo”, afirma.
Assafin, do Inmetro, destaca que quase todas as geladeiras comercializadas no Brasil hoje estão na classificação A e reconhece que esse é um bom e um mau sinal.
“É uma evidência de que a etiquetagem funcionou, e os produtos são mais eficientes que antes, mas é ruim porque agora temos que subir a régua", diz. "Colocar isso em prática de uma vez teria um impacto muito grande. As empresas então saindo do Brasil, temos que considerar este cenário.”
Ela defende que a proposta da instituição é um "meio termo" entre todos os lados envolvidos na questão. "A indústria nacional não teria condição de se adequar de uma hora para outra. Elas geram empregos, precisam fazer isso gradualmente”, diz.
Para Renato Alves, diretor setorial linha branca da Eletros (associação de fabricantes de eletroeletrônicos), focar em sustentabilidade demanda investimentos. Por isso, o processo para colocar a mudança de etiquetagem em prática deve ser de longo prazo.
“Temos uma crise econômica anterior, que foi agravada com a pandemia”, diz. “No fim, nós sofremos e os consumidores também, porque esse valor é repassado para eles”.
Para Alves, a proposta do Inmetro é adequada, sobretudo implementação em fases, embora considere a terceira fase "mais agressiva". "Em algum momento, teríamos que parar e analisar [as exigências].”
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