23 de abril de 2021 | 19h24
As cotações do câmbio deram os primeiros sinais de que começam a levar em conta as excelentes perspectivas das contas externas. Ensaiaram uma baixa.
Este ano será a primeira vez desde 2007 que o resultado em Transações Correntes deverá fechar no azul, conforme projeções do Banco Central . Esta é a conta que registra as entradas e saídas de moeda estrangeira com mercadorias, serviços e transferências. Só fica de fora o fluxo de capitais (investimentos e empréstimos). Ou seja, pelo comportamento das contas externas, a entrada de dólares neste ano tende a ficar mais forte do que a saída.
São duas as principais razões que explicam esse resultado, uma positiva e outra negativa. A explicação positiva é a boa fase das exportações de commodities (soja, milho, carne, petróleo e minérios), que tem a favor, além do aumento da produção, a alta dos seus preços em dólares. A explicação negativa é a ainda baixa atividade econômica, que vem segurando importações e despesas com serviços (turismo, transportes, seguros, etc.). Ou seja, tem a ver com a queda da demanda interna.
No entanto, até agora, o comportamento do câmbio não refletia essa melhora do balanço de pagamentos. Teimava em ficar mais perto dos R$ 5,80 do que dos R$ 5,00, principalmente pela falta de confiança no governo. O risco era o de que as contas públicas se desmantelassem, a dívida saltasse para 100% do PIB , a política de juros perdesse capacidade de torque (por dominância fiscal) e o País ficasse ingovernável.
A novidade é que houve acordo político em torno da aprovação do Orçamento da União, que não tem lá grande qualidade, mas que também não é o desastre tão temido. Foi o suficiente para uma distensão no câmbio (Veja o gráfico).
O relativo alívio na aprovação do Orçamento agiu também sobre o comportamento do índice de risco Brasil, medido pelo CDS5, que é o quanto os investidores internacionais vêm pedindo de remuneração extra para ficar com títulos do Tesouro do Brasil de 5 anos. (Veja o gráfico.)
Dois fatores podem agora trazer ainda mais dólares para o Brasil. O primeiro deles é o aumento da percepção de exuberância das contas externas, especialmente agora que a economia mundial ensaia grande recuperação. E o segundo, a ideia de que as cotações podem cair ainda mais e, por conta disso, exportadores e investidores, que vêm mantendo recursos lá fora, se sintam encorajados a trazê-los mais rapidamente para cá com o objetivo de aproveitar cotações ainda elevadas.
O mercado financeiro auscultado pela Pesquisa Focus, do Banco Central, vinha trabalhando com o dólar ao fim do ano em torno dos R$ 5,30 a R$ 5,40. A partir de agora, poderá baixar alguma coisa nessas estimativas. Se a tendência de baixa do dólar se confirmar, dá para esperar duas consequências para a economia. A primeira é o impacto deflacionário sobre os importados. Derivados de petróleo e alimentos podem ter suas cotações finais barateadas.
O mesmo deverá acontecer com insumos, matérias-primas e equipamentos trazidos do exterior. Poderá, também, aliviar o IGP-M cujo avanço tanto vem preocupando os que pagam aluguéis. A outra consequência poderá recair sobre a política monetária. Se a inflação recuar de maneira consistente, o Banco Central não precisará puxar tanto pelos juros.
O problema é que essa recuperação da confiança, que está na base da valorização do real (baixa do dólar), não é fava contada. A covid-19 está desenvolvendo novas cepas e não há segurança de que a imunização da população, que avança lentamente, será capaz de conter novas ondas e, com elas, nova deterioração da atividade econômica e da situação do emprego.
Além disso, há as incertezas inerentes ao jogo político. O governo Bolsonaro depende de apoios fugazes e continua sem rumo. E, quando falta rumo, ele próprio não sabe para onde vai.
CELSO MING É COMENTARISTA DE ECONOMIA*
Nenhum comentário:
Postar um comentário