PEDRO DORIA
Ao unir plataformas, Mark Zuckerberg pretende dificultar eventual processo antitruste que o governo dos Estados Unidos pode impor
22/04/2021 | 19h19
Por Pedro Doria - O Estado de S. Paulo
Mark Zuckerberg, presidente executivo do Facebook
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Quem abriu o sistema de mensagens do Facebook ou do Instagram, ao longo da última semana, deve já ter visto a pergunta. "Deseja integrar os dois sistemas?"
Não houve grande anúncio, o Face tratou até com bastante discrição o passo que deu no Brasil. Nos Estados Unidos, a integração já havia ocorrido. Não quer dizer que vá ser um Messenger só. Mas será possível enviar e receber textos, fotos, vídeos e emojis de uma rede social para a outra. Só tem Insta e seu amigo só tem Face? Pronto, resolvido. Já dá. O próximo passo da companhia será levar esta união também ao WhatsApp. De um será possível mandar torpedos para os outros dois.
A decisão de integrar os três sistemas de mensagens não é técnica e, embora faça algum sentido de estratégia de negócios, ela é principalmente ação defensiva e contra-ataque. Uma resposta aos governos dos EUA e Europa.
O Facebook já enfrenta três ações antitruste diferentes nos EUA e está sob intensa pressão da União Europeia (UE). No centro do problema está a convicção de que a companhia liderada por Mark Zuckerberg é adepta de práticas anticompetitivas e usa seu tamanho no mercado para esmagar rivais. Uma das táticas sempre foi a de comprar concorrentes ou, quando não dá, reproduzir aquilo que fazem para tornar pouco atraente a ideia de migrar para outra plataforma.
Conforme vai fazendo com que Facebook, Instagram e até o WhatsApp sejam cada vez mais uma coisa só, o que a empresa faz é tornar os reguladores mais desconfiados. Uma das condições para a autorização da compra do Zap pelo Face, pela UE, foi justamente a promessa de que não haveria intercâmbio de informação de usuários entre as plataformas. O poder de uma não seria usado para alavancar a outra. Pois é. O Facebook prometeu e está faz já algum tempo descumprindo a promessa abertamente.
É defensivo e é um contra-ataque por isso.
É defensivo porque o maior temor do Facebook é a pena máxima imposta em casos de antitruste. Ou seja: separar as empresas. Quanto mais os softwares que mantêm as plataformas se tornam um só, mais difícil será dividir. Nos nossos celulares, pode ser que vejamos ícones diferentes. Mas o sistema de publicidade, o que rege as mensagens, o gerenciador de usuários, o algoritmo que controla o que conteúdo que aparece na tela — se tudo aos poucos vai virando uma só plataforma, separar vai virando um pesadelo.
Dividir uma companhia telefônica nacional, como ocorreu nos anos 1980 nos EUA, é fácil. Os cabos e circuitos de cada região são atribuídos às empresas-filhas e pronto. Mas são uma coisa física. Software é diferente. É uma estrutura lógica.
É por isto que é um contra-ataque. O Facebook está fazendo uso de, por assim dizer, um bug no sistema do Estado de Direito. Processos antitruste, nessa escala, são necessariamente longos, complexos e imprevisíveis. Tendo ciência disso, e compreendendo que o governo dos EUA deverá empreender pelo menos três batalhas assim simultaneamente — há processos contra o Google e, espera-se, haverá também contra a Amazon —, o Face que fazer com que o seu seja o mais difícil de resolver.
Um contra-ataque, pois: ciente de que seria processado e que demorará de três a cinco anos para um último juiz tomar sua decisão final, o Facebook escolheu quebrar promessas e compromissos e usar o tempo para fazer com que dividir em três empresas fique ainda mais difícil. É impossível ver a ação sem ser como ataque. Afinal, está repetindo as ações que fazem reguladores considerá-lo uma ameaça.
Mas audácia e agressividade sempre foram marcas de Zuck como CEO.
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