terça-feira, 27 de abril de 2021

Sem censo e sem bom senso, Pedro Hallal, FSP

A cada 10 anos, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística conduz o Censo Demográfico. Além de contar quantas pessoas vivem no Brasil, em cada estado, em cada cidade, o Censo identifica como vivem essas pessoas. Enquanto pesquisador, sempre aprendi que as perguntas são muitas vezes mais importantes do que as respostas.

Quantas pessoas vivem em área rural e urbana, e como isso vem mudando ao longo do tempo? Qual a pirâmide etária da população brasileira? Qual o impacto da pandemia na estrutura etária brasileira? Quais as taxas de fecundidade e de mortalidade no Brasil? Como se distribui a população em grupos étnicos? Quais bairros surgiram nas cidades brasileiras e quantas pessoas moram em cada um deles? Quantos brasileiros moram em comunidades? Em casas ou apartamentos? Quantos brasileiros possuem alguma deficiência física ou mental? Como vem mudando a escolaridade da nossa população ao longo dos anos? Quais as religiões predominantes no Brasil? Qual o percentual de desempregados no Brasil? Entre os empregados, quantos estão no mercado de trabalho informal? Qual o real impacto da pandemia sobre a economia brasileira?

Todas essas perguntas, que normalmente seriam respondidas pelo Censo Demográfico, ficarão sem respostas. Imaginem a onda de “fake news” decorrente da falta de informações. Já fico imaginando os grupos de WhatsApp lotados de mensagens falsas; e não teremos sequer a possibilidade de mostrar que as informações são mentirosas.

A não realização do Censo Demográfico prejudica muito a economia brasileira. Como investir ou decidir onde investir sem informações sobre o mercado? Isso sem contar nas milhares de oportunidades de emprego, mesmo que temporário, geradas pelo Censo. Onde essas pessoas buscarão trabalho?

A não realização do Censo Demográfico prejudica todas as boas pesquisas populacionais no Brasil –sejam eleitorais ou científicas, as quais baseiam-se nas informações coletadas no Censo. É com base nos dados do Censo que sorteamos estados, cidades, setores censitários (micro bairros), casas e pessoas para participarem de pesquisas populacionais, como o EPICOVID-19. É com base no Censo que os institutos de pesquisa sérios sorteiam brasileiros para responderam às pesquisas de opinião –para medir a aprovação do governo, por exemplo. É com base no Censo que as pesquisas eleitorais sorteiam suas amostras, seja em nível municipal, estadual ou federal.

Como muitas coisas no Brasil, o Censo Demográfico deveria pertencer ao Estado, e não poderia, jamais, ser cancelado por desejo de um governo. A falta de transparência é característica básica de qualquer governo corrupto e autoritário.

Por coincidência (ou não), fico lembrando da citação histórica do alemão Martin Niemoller:

"Quando os nazistas vieram buscar os comunistas, eu fiquei em silêncio; eu não era comunista.

Quando eles prenderam os sociais-democratas, eu fiquei em silêncio; eu não era um social-democrata.

Quando eles vieram buscar os sindicalistas, eu não disse nada; eu não era um sindicalista.

Quando eles buscaram os judeus, eu fiquei em silêncio; eu não era um judeu.

Quando eles me vieram buscar, já não havia ninguém que pudesse protestar."

No Brasil atual, já buscaram a imprensa, já buscaram os cientistas, já buscaram o Judiciário, já buscaram os professores, já buscaram até o Censo.

Você que está lendo essa coluna: até quando permanecerá em silêncio?

 

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