Recentemente, o Congresso aprovou a lei de autonomia do Banco Central. Se tudo der certo, não haverá grandes mudanças na política monetária, só maior segurança de que a inflação permanecerá sob controle.
Autonomia não significa independência. As metas a serem perseguidas pelo BC continuam sendo determinadas pelo governo eleito, e seus dirigentes podem ser demitidos caso fracassem em atingi-las.
Como escrevi na última coluna, entretanto, temo que a redação da lei possa levar a questionamentos por parte dos órgãos de controle, comprometendo a gestão monetária.
Houve críticas à lei de autonomia que, contudo, combinam desconhecimento sobre o tema com julgamentos precipitados.
Guilherme Boulos escreveu, nesta Folha, que o BC estaria capturado pelo mercado. Muitos de seus dirigentes, incluindo presidentes, trabalhariam, antes e depois do cargo oficial, em bancos privados. “Porta giratória”, sintetizou.
“Bem, imaginem alguém, em qualquer área, com a função de fiscalizar seus ex-chefes e futuros chefes. Teria alguma isenção para contrariar interesses em nome do que é melhor para o país ou para o povo?”
“A autonomia do BC institucionaliza essa entrega do galinheiro nas mãos das raposas.”
Os fatos, no entanto, desmentem a conclusão de Boulos. A atual gestão do BC tem feito reformas que ampliam a concorrência no sistema financeiro. O resultado é o crescimento das Fintechs. A criação do PIX desconcertou bancões.
O valor de mercado de alguns bancos caiu bem mais do que o índice Bovespa em 2020. Tornou-se lugar-comum falar sobre seu declínio. Que raposas são essas que prejudicam seus “futuros chefes”?
Arminio Fraga instituiu o bem-sucedido modelo de metas de inflação, conduziu reformas que ampliaram o acesso ao crédito e criticou a compra da XP pelo Itaú.
Henrique Meirelles zelou pelo controle da inflação e coordenou a reação à crise de 2008.
Ilan Goldfajn iniciou a gestão monetária que resultou na menor taxa de juros desde o plano Real, sem comprometer a estabilidade dos preços. Além disso, retomou a agenda de reformas para reduzir o spread bancário.
Qual mesmo a evidência de que trabalharam a favor de grandes bancos?
O descontrole da inflação na última década ocorreu no governo Dilma Rousseff. Curiosamente, Boulos não citou os responsáveis pela gestão monetária que mais prejudicou o país no período. O presidente do BC à época era um servidor público, e não foi trabalhar em bancos privados depois do governo.
Devem-se discutir os detalhes da lei de autonomia e seus possíveis impactos. Acusar pessoas e atacar reputações, porém, requer provas.
Já tem gente demais ocupando gabinetes do ódio.
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