Deputados confundem conservadorismo com preconceito até em questões burocráticas
Um surto de obscurantismo quase custou R$ 10 bilhões por ano ao governo. A Câmara gastou quase 30 minutos na última semana batendo boca sobre o uso da palavra “gênero” em cadastros do INSS. Por pouco, a medida provisória de Bolsonaro para rever benefícios previdenciários não foi derrubada.
O texto em discussão no plenário na noite de quarta (29) dizia que registros enviados pelos cartórios deveriam conter nome, CPF, gênero, data e local de nascimento ou morte dos indivíduos. Deputados que confundem conservadorismo com preconceito protestaram. Enxergaram ideologia num trecho burocrático e tentaram tirar o termo da lei.
Os parlamentares queriam trocar “gênero” por “sexo”, como se isso fizesse diferença na papelada. A mudança não foi possível, porque a proposta já havia sido aprovada numa comissão. O tumulto se instalou, e os partidos de esquerda atacaram. “Tem gente que quer voltar para a Idade Média, talvez das trevas”, disparou Fernanda Melchionna (PSOL).
Deputados alinhados à agenda econômica do governo perceberam que o impasse era perigoso. Kim Kataguiri (DEM) tentou enterrar a questão. “Nós estamos discutindo o sexo dos anjos aqui!”, queixou-se.
A bancada evangélica não desistiu. O pitoresco Pastor Sargento Isidório (Avante) —aquele que se ofereceu para uma conversa de doido com doido com Bolsonaro— era o mais impaciente: “Deus criou macho e fêmea, homem e mulher. Gênero é cadeira, é mesa, é sapato...”.
O PSOL tentou falar a mesma língua. “Cadeira é do gênero feminino, e não é sexo. Nunca vi cadeira trepando! Isso aqui é uma casa de loucos!”, resumiu Edmilson Rodrigues.
No fim, o Planalto pediu que o texto fosse aprovado e disse que apresentaria um projeto para mudá-lo depois. Como se vê, o retrocesso continua na agenda do governo. Na sexta (31), Bolsonaro aproveitou um evento com pastores para criticar o julgamento do STF que deve tornar crime a homofobia. Em partes de Brasília, o atraso ainda está na moda.
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