Câmara e Senado forçaram o governo a mostrar sua índole verdadeira
O fim do compra-e-vende entre a Presidência e congressistas, mais do que chegar ao fim como promessa, o faz sem a menor consideração com os ex-presidentes Sarney, Collor, Fernando Henrique, Lula e Dilma.
Os R$ 20 milhões para cada deputado e cada senador, acenados pelo governo Bolsonaro em troca de aprovações no Congresso, compõem uma soma humilhante para os antecessores e sem precedentes na corrupção política por governos: R$ 11.800.000.000,00.
Câmara e Senado forçaram o governo, mesmo sem planejar fazê-lo, a mostrar sua índole verdadeira na concepção de política. As reprovações e aprovações de projetos e medidas provisórias têm sido por critérios que independem das pressões do governo. Se é apenas temporário não se sabe, em meio à incerteza generalizada, mas o Congresso está com cara de Congresso.
Bolsonaro, por sua vez, quer a imagem de Collor. Arrancada de Batman em jet-ski, ida a pé ao Congresso, outra ida para entregar o besteirol sobre trânsito, encontro com Neymar para abraçá-lo pelo mais caro vexame: todos os dias, uma demonstração do vazio de suas horas de trabalho e decisão. É a imitação do exibicionismo vulgar de Collor, como meio de deter a ruína no conceito tanto dos aliados ideológicos, como dos apoiadores por ignorância.
Para trabalhar a imagem, porém, em princípio Bolsonaro dispõe de mais tempo do que para outras possibilidades de desastre.
Além da recusa a mais uma tentativa de Flávio Bolsonaro contra as investigações que o afligem, cresceram em número e gravidade as suspeitas e evidências que o circundam. No mesmo sentido, ressurge o tema dos negócios que questionam Paulo Guedes.
Trata-se dos sobrepreços em aquisições por ele conduzidas como gestor, com empresa sua, de investimentos dos fundos de Previdência de funcionários da Caixa, Banco do Brasil, Correios e Petrobras.
Há coisas assombrosas mesmo, para somar R$ 385 milhões pagos a mais, com dinheiro dos fundos. E explicações, quando existiram, que invadem o infantilismo. O Ministério Público do Rio e, no caso de Guedes, o Federal estão merecendo atenções que ainda não lhes foram dadas. Os R$ 385 milhões correspondem a uns 120 apartamentos como o da condenação de Lula.
IN-JUSTIÇA
A redução de empregos nos meios de comunicação poderia dispensar juízes de se tornarem, também eles e por maus motivos, contrários ao exercício do jornalismo. Ocorre agora mais um exemplo dispensável.
Na dívida bilionária que pôs em coma a Editora Abril, inclui-se uma condenação proveniente de reportagem na Veja em 2001.
A editora reconheceu, conforme convenção de que é signatária, a responsabilidade pela indenização a pagar, que de início visava também ao repórter. O pagamento não foi incluído nas dívidas relacionadas para a recuperação judicial porque a editora ficou de quitá-la. Não o fez.
O processante reagiu com o pedido de que a dívida fosse cobrada à outra parte acusada, o repórter. E foi atendido em nova decisão judicial. O repórter é que deveria pagar dívida reconhecida pela e da empresa.
O comprador ficou de pagar pela editora, que já dirige, e até agora não o fez. O repórter está com a conta bancária bloqueada, e sob risco iminente de uma ordem judicial destrutiva: o valor original de R$ 150 mil é hoje de R$ 750 mil, e lhe faltam meios para pagá-lo. Mas o absurdo dessa questão que se estende há 18 anos vai além do problema humano e financeiro.
O lado interno da imprensa não é alcançável pelas vistas externas. Nem sempre, por exemplo, o repórter que assina um texto é o responsável, ou único responsável, pelo que chega ao leitor. É comum que o original receba alterações, seja por motivos formais ou por seu sentido.
Além disso, todas as decisões sobre o que e como será apresentado escapam aos repórteres: são dos editores. No caso, para exemplificar, um dos motivos do processo foi o uso, não permitido, de fotos de menores. O repórter, muitas vezes, só constata coisas assim, como também títulos e eventuais resumos, ao depará-las já no jornal ou na tela.
André Rizek é íntegro, competente, há anos na Sportv, sempre capaz de dizer respeitosamente o que deve ser dito e muitos nunca diriam. A prevalecerem decisões como essa que o atinge, as consequências começarão assim: é preferível nada assinar, dispensando-se o rigor e a dedicação que o anonimato não exige. Perdem os repórteres, as publicações e os leitores. Daí para pior.
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