Beatriz Bulla - Correspondente/Washington e Júlia Marques, O Estado de S.Paulo
15 de junho de 2019 | 16h30
A cultura da filantropia nos Estados Unidos, estimulada por incentivos fiscais, levou a um recorde de US$ 46,7 bilhões (R$ 182 bilhões) a universidades de graduação e pós-graduação no ano fiscal de 2018. Os dados são do Conselho para Avanço e Suporte à Educação e mostram o aumento, pelo 9.º ano consecutivo, de doações a faculdades.
Do total, 26%, ou US$ 12,1 bilhões, vieram de ex-alunos. Ou, como são chamados nos corredores de universidades, os “alumni”. Desde antes da graduação, os universitários são estimulados a participar ativamente da comunidade de “alumni” após a diplomação e contribuírem, com cifras, com sua alma mater. No site da Universidade Harvard, por exemplo, é fácil localizar a página com informações para doações.
Só em doações, Harvard arrecadou em 2018 quase o orçamento da Universidade de São Paulo (USP) para 2019. Entre repasses do governo estadual, valores oriundos de recursos próprios e federais, a verba para 2019 da USP é de R$ 5,7 bilhões.
Harvard foi destino de 28% das doações a universidades dos EUA em 2018 e recebeu quantia perto de R$ 5,5 bilhões. Depois de Harvard, as maiores recebedoras são Stanford, Columbia, a Universidade da Califórnia em Los Angeles e em São Francisco e a Johns Hopkins, em Maryland.
Com deduções fiscais, são estimuladas doações a fundações, museus e faculdades. Mas uma reforma tributária aprovada pelo Congresso e encampada pelo presidente Donald Trump ameaça as cifras doadas.
A mudança não deixa de prever deduções na doação a faculdades, mas diminui o número de contribuintes elegíveis à dedução. Ainda não há dados disponíveis que meçam o efeito da legislação, em vigor desde 2018.
As universidades contam ainda com os presentes maiores: doações de ex-alunos que darão nome a um novo prédio, por exemplo, a ser construído, ou financiarão bolsas. Uma contribuição de US$ 2 milhões pode ajudar a construir um novo centro esportivo. O tamanho da doação para ter uma sala ou prédio com seu nome depende do tamanho da universidade.
Nem só de ex-alunos vivem as faculdades - e os universitários. Em maio, rodou o mundo o vídeo do bilionário que surpreendeu uma turma de mais de 400 alunos ao anunciar que pagaria as dívidas estudantis de todos os formandos. Nos EUA, estima-se que 40% dos que concluem a faculdade precisam pagar algum empréstimo do tipo.
Robert F. Smith, empresário com fortuna estimada em mais de US$ 4 bilhões, promete pagar cerca de US$ 40 milhões de dívidas dos alunos da Universidade de Morehouse, em Atlanta, historicamente composta por alunos negros. Smith, também negro, já havia anunciado doação de US$ 1,5 milhão à universidade este ano, mesmo tendo se formado em outras instituições: Cornell e Columbia.
Sem incentivo, lei de endowments pode virar letra morta
Doações a universidades americanas vão para fundos perpétuos, os endowments. No Brasil, embora já houvesse endowments nas universidades, não havia lei sobre esses fundos. Em janeiro, o presidente Jair Bolsonaro sancionou norma que regulamenta esses fundos, mas vetou, entre outros pontos, incentivos fiscais a doadores. Por isso, afirmam especialistas, a lei não ajuda a fomentar doações e pode burocratizar os processos.
“No Brasil, as pessoas têm medo de fazer algo novo sem uma lei”, diz Carlos Gouvêa, doutor em Harvard e professor da USP. Para ele, a cultura de doação, celebrada nos Estados Unidos, não vem do nada. Mecanismos transparentes de controle dos recursos, por exemplo, ajudam a dar segurança aos doadores.
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