sexta-feira, 18 de março de 2022

Aliados de Lula agora defendem Alckmin e criticam delação da Ecovias, FSP

 17.mar.2022 às 4h10

BRASÍLIA e SÃO PAULO

Aliados do PT e do ex-presidente Lula saíram em defesa do ex-governador paulista Geraldo Alckmin após seu nome aparecer em delação premiada de um executivo da Ecovias, empresa que possui concessão de rodovias em São Paulo.

Como mostrou a Folha, Marcelino Rafart de Seras, ex-presidente da Ecovias, disse em acordo de colaboração que a empresa repassou R$ 3 milhões como caixa 2 para Alckmin. Os pagamentos, disse ele, foram efetuados em 2010 (R$ 1 milhão) e em 2014 (R$ 2 milhões), em valores da época.

Cotado para ser vice de Lula, Alckmin negou as acusações, disse não conhecer os termos da delação e afirmou lamentar que, "depois de tantos anos, mas em novo ano eleitoral, o noticiário seja ocupado por versões irresponsáveis e acusações injustas".​ ​

O ex-governador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Lula se reencontram em jantar promovido pelo grupo Prerrogativas
O ex-governador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Lula se reencontram em jantar promovido pelo grupo Prerrogativas - Ricardo Stuckert

A apuração relativa ao caixa 2 também é investigada pela Delinst (Delegacia de Defesa Institucional), da Polícia Federal, que apura questões eleitorais.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que integra o grupo que debate o programa de governo a ser apresentado por Lula, disse à Folha que a citação na delação e a investigação da PF não atrapalham a possibilidade de Alckmin ser vice do petista.

Segundo ele, a palavra do delator não constitui prova, e o PT defende o princípio da presunção da inocência. "Estranhamos esse fato vir à tona às vésperas da eleição", diz Teixeira.

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Coordenador do grupo Prerrogativas, que organizou o jantar entre Lula e Alckmin em dezembro de 2021, o advogado Marco Aurélio Carvalho defendeu Alckmin e disse que é chegada a hora de debater o instituto da delação premiada.

Segundo ele, não se pode permitir que delações sejam construídas para atender objetivos políticos.

"Não há surpresa alguma na tentativa de se atingir a honra do Alckmin, em especial agora quando o seu nome é cogitado para compor a chapa do Lula, franco favorito para as próximas eleições presidenciais. Velha receita, criminosa, oportunista e nem um pouco criativa", diz ele.

Em anos anteriores, petistas fizeram críticas a Alckmin em casos de suspeita de corrupção e questionavam o que consideravam seletividade na comparação entre investigações contra o PT e contra Geraldo Alckmin.

Enquanto alguns petistas comentaram a citação ao ex-tucano, a cúpula do partido, o secretário nacional de comunicação e líderes do Congresso se mantiveram em silêncio nas redes sociais e não quiseram comentar quando procurados pela Folha.

Em 2018, o então líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), classificou de "escândalo" a decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de enviar para a Justiça Eleitoral de São Paulo a investigação contra Alckmin.

O ex-governador foi citado em delação de ex-executivos da Odebrecht, no âmbito da Lava Jato. Ele foi acusado na época de receber mais de R$ 10 milhões em caixa dois.

"É inadmissível que, de maneira irregular, essas acusações tenham sido retiradas do âmbito da Lava Jato e tenham sido destinadas para investigação no âmbito da Justiça Eleitoral de São Paulo. É algo gritante do ponto de vista da seletividade."

"Ao longo dos últimos anos, inúmeras situações semelhantes a essa, envolvendo especialmente lideranças ligadas ao Partido dos Trabalhadores, não tiveram esse tratamento", disse Pimenta.

Em 2014, o então presidente estadual do PT, Emídio de Souza, falou sobre os ataques promovidos por dirigentes e congressistas do PSDB ao PT no escândalo da Petrobras.

"Os tucanos que hoje gritam contra o PT são os mesmos que emudeceram quando o PSDB foi apanhado no trensalão em São Paulo", disse, em referência à investigação do Ministério Público paulista sobre um cartel em licitações de trens nas gestões Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra.

Em maio do mesmo ano, a CPI dos Pedágios foi criada para apurar eventuais irregularidades nas tarifas cobradas pelas concessionárias nas rodovias paulistas e eventual responsabilidade do governo Alckmin no caso. O deputado estadual Antônio Mentor (PT) foi o proponente e também o vice-presidente da CPI.

​Em abril de 2015, o site do PT publicou texto fazendo acusações de corrupção contra Alckmin.

O texto assinado como "Agência PT de Notícias" diz que, "dos R$ 40,3 milhões arrecadados com doações de campanha pelo então candidato tucano Geraldo Alckmin, ao Governo de São Paulo, em 2014, R$ 12,37 milhões tiveram origem nas 13 empresas denunciadas por fraudes e formação de cartel em contratos relativos à linha 5 do metrô paulistano, o chamado caso do 'trensalão tucano'".

Em 2017, os petistas de São Paulo apostaram nas delações da Odebrecht para pedir a instalação de uma CPI na Alesp para investigar obras da empreiteira no estado. Alckmin foi citado na delação.

Dois anos depois foi a vez da CPI da Dersa. O requerimento, apresentado pela então deputada estadual Beth Sahão (PT), previa a análise de eventuais irregularidades praticadas por agentes públicos que "deram causa a fraude nas licitações e contratos do governo do estado".

Esses agentes públicos, diz o requerimento, são suspeitos de desviarem "recursos públicos, utilizando-se de empresas de fachada para lavagem de recursos de empreiteiras nessas obras viárias, por meio da atuação do Sr. Paulo Vieira de Souza, ex-diretor da Dersa, no período de 2007 a 2019".

Uma ou duas Rússias, Ruy Castro, FSP

 As imagens chocaram o mundo: multidões tomando as lojas do McDonald's em toda a Rússia, disputando os últimos hambúrgueres e sacos de batata frita antes do fechamento decretado pela rede em protesto contra a invasão da Ucrânia por Vladimir Putin. Os que conseguiam chegar aos balcões pediam dez ou 20 sanduíches para viagem. Um cidadão algemou-se à porta de uma unidade em Moscou, tendo de ser libertado à força pela polícia e levado pedalando o ar.

O choque se deve a que, por boa parte do século 20, a Rússia simbolizou a resistência aos prazeres fúteis do capitalismo. Não era bem a Rússia, como sabemos, mas a União Soviética, embora, para milhões, uma e outra fossem a mesma coisa. Dizia-se que os jovens russos podiam não ter a Coca-Cola, o cachorro quente e a sacanagem no banco de trás do carro emprestado pelo pai, mas não sentiam falta porque tinham escola, comida, emprego na fábrica e liberdade para idolatrar o camarada Stálin.

A ideia de que, um dia, os russos iriam se desesperar por causa de uma lanchonete americana nunca passaria pela cabeça de homens como Kaganovitch, Beria, Jdanov e Molotov, que ajudaram Stálin a erguer o império soviético. E o que achariam disso comunistas americanos históricos como o jornalista John Reed, o cantor Paul Robeson, a teatróloga Lillian Hellman e os escritores Howard Fast e Dashiell Hammett? E mesmo aqui, entre os nossos, como se sentiriam Oscar Niemeyer, Astrojildo Pereira, João Saldanha, o Barão de Itararé e o cantor e compositor Jararaca, autor de "Mamãe Eu Quero", todos dedicados comunas?

Eles teriam de se conformar. Essa mesma Rússia que não dispensa a mostarda e o ketchup também não pode ser confundida com a que invade um país, bombardeia maternidades, silencia seu próprio povo e está em franco processo de reestalinização comandado por um ex-meganha da KGB.

E, não por acaso, amigo de Jair Bolsonaro.

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Moscovitas fazem fila na inauguração do primeiro McDonald's na URSS, em 31 de janeiro de 1990 - Alexander Steshanov - 31.jan.1990/МАММ/Russian Photos

Num país decente, tentativa de censura derrubaria ministro, Hélio Schwartsman, FSP

 A única coisa que a Constituição de 1988 proíbe duas vezes é a censura, banida de nosso ordenamento jurídico tanto no artigo 5º, IX como no artigo 220. Com muito boa vontade, dá para discutir se um representante do Poder Judiciário, isto é, um magistrado, pode, em nome da preservação de outros direitos fundamentais, proscrever uma obra artística. Eu entendo que não, mas reconheço que esse é um ponto em que o debate é legítimo.

De líquido e certo, temos que o constituinte de 1988 tirou do Executivo o poder de censurar as artes, concedendo-lhe apenas a mui mais modesta missão de promover a classificação etária de filmes e espetáculos, que, nunca é demais ressaltar, tem caráter meramente indicativo. Ou seja, se os pais discordarem da avaliação dos burocratas do governo, são constitucionalmente livres para ignorá-la. A classificação indicativa até tem um impacto na TV aberta, já que há faixas de horário em que títulos considerados impróprios para certas idades não podem ser exibidos, mas é irrelevante no streaming, onde todos os filmes estão à disposição o tempo inteiro.

Se até eu, que nem diploma de direito tenho, sei dessas coisas, o ministro da Justiça deveria, "ex fortiori", saber mais. Anderson Torres, porém, ou sabe menos, o que já seria grave, ou escolheu faltar com as obrigações que seu cargo lhe impõe para bajular o chefe, o que é ainda mais grave. A determinação que o ministro deu para que o filme "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola" fosse excluído das plataformas é um tipo ideal daquilo que os juristas chamam de ordem manifestamente ilegal.

Num país decente, Torres já teria perdido o cargo e estaria respondendo a processo por abuso de autoridade. Num país um pouco menos indecente, teria sido convocado para explicar-se no Congresso.

Mas estamos no Brasil. É bem possível que ele venha a ser indicado para uma cadeira no STF, se Bolsonaro for reeleito.