As imagens chocaram o mundo: multidões tomando as lojas do McDonald's em toda a Rússia, disputando os últimos hambúrgueres e sacos de batata frita antes do fechamento decretado pela rede em protesto contra a invasão da Ucrânia por Vladimir Putin. Os que conseguiam chegar aos balcões pediam dez ou 20 sanduíches para viagem. Um cidadão algemou-se à porta de uma unidade em Moscou, tendo de ser libertado à força pela polícia e levado pedalando o ar.
O choque se deve a que, por boa parte do século 20, a Rússia simbolizou a resistência aos prazeres fúteis do capitalismo. Não era bem a Rússia, como sabemos, mas a União Soviética, embora, para milhões, uma e outra fossem a mesma coisa. Dizia-se que os jovens russos podiam não ter a Coca-Cola, o cachorro quente e a sacanagem no banco de trás do carro emprestado pelo pai, mas não sentiam falta porque tinham escola, comida, emprego na fábrica e liberdade para idolatrar o camarada Stálin.
A ideia de que, um dia, os russos iriam se desesperar por causa de uma lanchonete americana nunca passaria pela cabeça de homens como Kaganovitch, Beria, Jdanov e Molotov, que ajudaram Stálin a erguer o império soviético. E o que achariam disso comunistas americanos históricos como o jornalista John Reed, o cantor Paul Robeson, a teatróloga Lillian Hellman e os escritores Howard Fast e Dashiell Hammett? E mesmo aqui, entre os nossos, como se sentiriam Oscar Niemeyer, Astrojildo Pereira, João Saldanha, o Barão de Itararé e o cantor e compositor Jararaca, autor de "Mamãe Eu Quero", todos dedicados comunas?
Eles teriam de se conformar. Essa mesma Rússia que não dispensa a mostarda e o ketchup também não pode ser confundida com a que invade um país, bombardeia maternidades, silencia seu próprio povo e está em franco processo de reestalinização comandado por um ex-meganha da KGB.
E, não por acaso, amigo de Jair Bolsonaro.
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