terça-feira, 17 de abril de 2018

Governo de SP desiste de decreto para tirar Polícia Civil da Segurança Pública , FSP


    Rogério Pagnan
    SÃO PAULO
    ​A ideia do novo governador de São Paulo de transferir a Polícia Civil da Secretaria da Segurança Pública para a pasta da Justiça esfriou após uma série de críticas da sociedade civil, além de um descontentamento de membros da própria corporação.
    A proposta de Márcio França (PSB), conhecida somente na semana passada, vinha sendo desenhada desde que ele atuava como vice de Geraldo Alckmin (PSDB), com apoio de representantes de classe dos delegados de SP.
    A ideia inicial do governador, também candidato à reeleição, seria sacramentar a mudança por meio de um decreto —que deveria ser publicado ainda nesta semana.
    A Polícia Civil seria deslocada para Secretaria da Justiça, e a Polícia Militar seguiria na Segurança —sendo que essa pasta passaria a ser dirigida por um oficial da PM, provavelmente o atual comandante-geral corporação, coronel Nivaldo Restivo.
    Mas, diante da repercussão negativa e de aconselhamentos técnicos contrários, França deu um passo atrás. Desistiu do decreto e solicitou à Secretaria da Segurança Pública a elaboração de uma proposta para um projeto de lei a ser enviado para avaliação da Assembleia Legislativa.
     
    “Eu não acho ruim fazer essa modificação. Entretanto quem tem que decidir isso, a rigor, são as duas categorias e, principalmente, a Assembleia Legislativa que foi eleita pelo povo para poder decidir essas coisas”, disse França em entrevista à rádio Bandeirantes nesta segunda (16).
    Como se trata de ano eleitoral, no qual assuntos polêmicos costumam sumir da pauta dos deputados, os próprios integrantes do governo dizem não enxergar grandes chances de o assunto progredir neste ano na Assembleia.
    Segundo a Folha apurou, as cúpulas das polícias Civil e Militar assim como a própria Secretaria da Segurança foram informadas da intenção do governador somente na última quarta-feira (11).
    Nas reuniões que se sucederam, na quinta (12) e sexta-feira (13), nem mesmo os delegados chamados para discutir o assunto defenderam a mudança de pasta. Disseram que não se tratava de um pleito da Polícia Civil, mas de alguns policiais, numa referência aos presidentes do Sindicato dos Delegados, Raquel Kobashi Gallinati, e da Associação dos Delegados, Gustavo Mesquita Galvão Bueno.
    Raquel disse à Folha que a transferência não é um pedido da classe, mas, sim, uma proposta do próprio governador que eles apoiam. Ela disse ver uma chance de uma maior autonomia da Polícia Civil e, com ela, a prestação de um trabalho mais eficiente de polícia investigativa.
    “Há uma necessidade latente de um choque de gestão. Fazer uma assembleia geral? Não, não fizemos porque a ideia não partiu da gente, a ideia veio do próprio governador, e nós achamos excelente”, disse. “Isso [choque de gestão] é algo que a base vem pedindo não de agora.”

    ​PROBLEMAS

    Um dos primeiros empecilhos detectados pelo grupo de estudo sobre uma mudança por decreto é a existência de uma lei em vigor que coloca as Polícias Civil e Militar na secretaria da Segurança. Assim somente uma outra lei poderia alterar a primeira.
    Além disso, ponderaram os policiais ao governador, há inúmeros convênio firmados —incluindo com o governo federal— nos quais o recebimento de repasses de verbas depende de trabalhos conjuntos entre a PM e a Civil.
    Até mesmo o pagamento de bônus de policiais utiliza análise de estatísticas da CAP (Coordenadoria de Análise e Planejamento), que funciona com dados elaborados pelas duas polícias. Assim, uma mudança de tal porte necessitaria de grande reengenharia ainda não planejada.
    Além disso, delegados ouvidos pela Folha avaliam que essa mudança poderia trazer mais prejuízos à Polícia Civil do que benefícios. De benefício, seria, por exemplo, conseguir reajustes salariais à carreira, ao desvincular os pagamentos da folha da PM.
    Um mês atrás, esse era o principal motivo que os representantes dos delegados apontavam como motivo de levar a Civil para outra pasta, segundo pessoas ligadas a eles ouvidos pela reportagem.
    Pelo lado negativo, o principal temor dos policiais civis seria dar ainda mais poderes à Polícia Militar, com uma secretaria própria, e abrir caminho para a implantação do chamado ciclo completo.
    Por este sistema, a PM poderia atuar em pequenos crimes desde o registro na rua, até apresentação do caso à Justiça —algo vetado hoje. Isso, para alguns policiais, seria o primeiro passo para a extinção da Polícia Civil.
    Além de tudo, a proposta do governador deixou descontentes os representantes da Polícia Técnico-Científica que, primeiro, não participaram da reuniões para opinar sobre o tema na pasta da Segurança.
    Segundo, porque seriam levados para a pasta da Justiça como um apenso da Polícia Civil —também contrariando a vontade da classe de autonomia dessa polícia.

    Fundador de Israel defendia via de dois Estados, diz neto, FSP

    Fundador de Israel defendia via de dois Estados, diz neto

    Segundo descendente, David Ben-Gurion não celebrou criação de Israel por prever conflito com árabes

    Alon Ben-Gurion, neto do fundador de Israel, David Ben-Gurion, na casa do avô, hoje um museu em Tel Aviv - Diogo Bercito / Folhapress
    Diogo Bercito
    TEL AVIV
    Alon caminha pela casa de David Ben-Gurion, fundador do Estado de Israel e seu premiê inaugural. A antiga construção no norte de Tel Aviv é hoje um museu à história do homem que redigiu e declarou há 70 anos a independência do país.
    Alguns turistas observam os móveis sóbrios e as estantes forradas de livros em variadas línguas, como hebraico, inglês, espanhol e grego. Alon, porém, se detém em um canto. Coloca as mãos atrás do corpo, pesca uma memória e diz à Folha: “Era aqui que ficava nosso piano.”
    Alon, 66, é neto de Ben-Gurion, de quem ele herdou o sobrenome da dinastia. Não é político nem ocupa cargo público, mas conheceu a fundo um dos heróis do país e circulou naquela casa, razões pelas quais é uma requisitada testemunha da história.
    Consultor de hotéis de luxo nos EUA, onde vive, ele viajou a Israel para as celebrações da independência, que começam noite de quarta-feira (18), seguindo o calendário judaico. A data no calendário gregoriano é 14 de maio.
    Alon tinha 22 anos em 1973, quando Ben-Gurion morreu aos 87 anos após uma hemorragia cerebral. “A última vez em que eu vi meu avô ele estava nesta cama, dormindo. Eu estava de folga no Exército, tinha me ferido, e decidi fazer uma visita. Não quis acordá-lo”, conta.
    Ele ainda se lembra de uma das lições aprendidas com seu avô, uma mensagem que considera pertinente mesmo hoje, sete décadas depois do estabelecimento de Israel: “Ele nos dizia para não considerarmos a existência dos judeus como algo garantido.”
    A Alemanha nazista matou seis milhões deles durante o Holocausto. Nas últimas décadas, Israel esteve em guerra com todos seus vizinhos --Egito, Jordânia, Síria e Líbano-- e foi ameaçado por outros inimigos, em especial o Irã, com seu desaparecimento do mapa-múndi.
     

    SIONISMO

    Nascido na atual Polônia em 1886, David Ben-Gurion migrou em 1906 para a então Palestina, um território do Império Otomano e mais tarde um mandato britânico.
    Ele acreditava que, perseguidos na Europa, os judeus precisavam criar ali seu próprio país --um movimento do século 19 chamado de “sionismo”, a partir da ideia de retorno à terra de Sião.
    “Meu avô era um homem simples. Não se importava com as coisas materiais, como ir a um restaurante caro ou se vestir bem”, diz Alon. “Ele sempre dizia que sua preocupação era criar um Estado para o povo judeu, e foi por esse objetivo que ele trabalhou toda a sua vida.”
    Mas, ao chegar ali, Ben-Gurion deparou com um fato inescapável: o território já era habitado há séculos pelos palestinos, com quem precisaria conviver. “Quando a ONU propôs a criação de um Estado judeu, ele sabia que haveria um conflito com os árabes”, conta Alon.
    A proposta da ONU de 1947 era criar um país para os judeus e outro para os árabes. Os judeus aceitaram, mas os árabes, não. A situação, já de atritos entre ambos os lados, tornou-se um confronto internacional com a participação dos países vizinhos.
    “Foi por isso que, ao contrário das pessoas que foram às ruas celebrar aquele dia, ele me disse que não ficou feliz. Sabia que nós pagaríamos um preço por aquela guerra. Mas foi adiante e venceu.”
    Os palestinos também pagaram um preço: a independência de Israel é conhecida em árabe como “Nakba”, o seu “desastre”.
    Durante a guerra, mais de 700 mil palestinos tiveram de deixar suas casas e parte de seus descendentes ainda vive em campos de refugiados. O território da Cisjordânia, onde querem ter o seu Estado, é ocupado por Israel desde a Guerra dos Seis Dias, travada em 1967. Por essa razão, palestinos têm convocado marchas em protesto ao aniversário de Israel.
    Ciente do peso de suas declarações como herdeiro do fundador do país, Alon prefere não falar tanto sobre política. Mas conta que até sua morte o avô acreditava em solucionar a crise com a criação de um país para os judeus e outro para os palestinos.
    Ben-Gurion também foi contrário à ocupação da Cisjordânia. Um ano depois da guerra, afirmou: “Se eu tivesse de escolher entre a paz e os territórios que conquistamos, preferiria a paz”.
    “Ele dizia que iríamos sobreviver pela superioridade moral, e não pelo Exército”, conta Alon.

    Saudades do que nunca existiu, por Luis Eduardo Assis, OESP (definitivo)



    Como tudo parece ruim agora, é natural que se pense que antes era melhor



    Luís Eduardo Assis, O Estado de S. Paulo
    02 Abril 2018 | 05h00
    É leitura obrigatória, cai na prova. O novo livro de Steven Pinker, Enlightment Now, reforça o tema que já havia sido abordado em seu trabalho anterior The Better Angels of our Nature e vende de forma convincente uma ideia contraintuitiva: o mundo vai bem. Nunca estivemos melhores. O predomínio da razão e o progresso material derivado do desenvolvimento científico, que vêm no rastro do Iluminismo a partir do final do século 18, transformaram o mundo em um lugar melhor. Vivemos mais, vivemos com mais qualidade, somos mais tolerantes, sabemos muito e nos matamos menos. Ainda assim, a ideia de que a vida era melhor no passado resiste como uma crendice popular. 
    O Instituto de Pesquisas Pew divulgou em dezembro de 2017 uma enquete realizada em 38 países sobre a percepção de progresso ao longo do tempo. A pergunta submetida a 43 mil pessoas foi bastante simples: para alguém como você, a vida no seu país está melhor ou pior do que há 50 anos? Em apenas 20 dos países consultados a percepção é de que a vida melhorou. O destaque da lista é o Vietnã, onde 88% das pessoas acreditam que a vida está melhor agora, seguido por Índia e Coreia do Sul. Na outra ponta, Jordânia, México e, claro, Venezuela são os países mais pessimistas. O Brasil não está bem na foto. Aqui entre nós, nada menos que 49% dos pesquisados acreditam que a vida neste meio século piorou, contra 35% que julgamque melhoramos. 
    Esta visão lúgubre não tem o menor respaldo na realidade. O Brasil melhorou extraordinariamente desde o final dos anos 60. A renda per capita, por exemplo, cresceu mais de 200% em termos reais de 1967 até 2013, quando se deu o pico da série histórica. 
    Mesmo depois da maior recessão de nossa história, a renda média de 2017 foi 175% mais alta que a registrada há meio século. Somos mais ricos. Somos, principalmente, mais saudáveis. A expectativa de vida ao nascer em meados dos anos 60 era de 57 anos, contra 76 anos hoje. A mortalidade infantil despencou, em virtude do avanço do saneamento e do serviço público de saúde, em especial as campanhas de vacinação. De 115 mortes a cada mil nascimentos na década de 60, o índice recuou para 13,8 em 2015. A maior taxa de mortalidade infantil do mundo hoje é a de Angola, com 88 mortes a cada mil nascimentos, bem menos que a do Brasil há 50 anos. Somos também mais instruídos. A taxa de analfabetismo para pessoas com mais de 15 anos recuou de 35% para 7,2% nas últimas cinco décadas. O porcentual de analfabetos no Brasil dos anos 60 era semelhante à taxa de analfabetismo de um país como Ruanda hoje. 
    Se a vida melhorou, qual a razão do passadismo? A própria pesquisa dá uma pista para a resposta ao verificar que há uma forte correção positiva (0,68) entre a percepção de que o passado era melhor e a avaliação da situação atual. Países onde os pesquisados acreditam que a situação hoje não é boa tendem a achar que a vida há 50 anos era melhor. Um típico caso de viés cognitivo em que o peso das observações recentes influencia de forma exagerada a percepção do passado. Como tudo parece ruim agora, é natural que se pense que antes era melhor. Isto dá uma ideia da gravidade do momento em que vivemos. 
    A concupiscência da classe política no trato da coisa pública, aliada à escalada do desemprego e da violência, ajuda a explicar nosso derrotismo. A campanha presidencial que se aproxima é oportunidade rara para discutir os rumos deste país. Temos saudades de um tempo que não vivemos, de um lugar onde nunca estivemos. Não temos passado glorioso. Mas o futuro será mais benevolente, se pudermos resgatar, pela política, as instituições que os políticos desgastaram. 
    ECONOMISTA. FOI DIRETOR DE POLÍTICA MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL 
    E PROFESSOR DA PUC-SP E FGV-SP. 
    EMAIL: LUISEDUARDOASSIS@GMAIL.COM