Publicado por Luiz Flávio Gomes - 1 dia atrás
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Se a tolice não fosse também uma característica humana (faz 70 mil anos que oHomo Sapiens aprimorou sua linguagem, com a Revolução Cognitiva, para expressar coisas que não existem, nas quais os humanos acreditam), [1] jamais os demagogos populistas seriam capazes de nos “vender” o mito da segurança grátis.[2] A construção de sociedades razoavelmente civilizadas e seguras exige muito planejamento, políticas preventivas eficientes, excelente escolarização de todos, muitos custos e gastos bem orientados, certeza do castigo e um gigantesco pacto nacional (a segurança é assunto de cada um e de todos nós).
Três modelos de sucesso: 1º) países escandinavos (com 1 assassinato para cada 100 mil pessoas); 2º) EUA (4 para cada 100 mil); 3º) alguns países asiáticos (2 para cada 100 mil). O que esses países de sucesso em matéria de criminalidade nos ensina? Que não se faz omelete sem quebrar ovos. Na economia, o neoliberal Milton Friedman cunhou a famosa frase que diz:“There is no such thing as a free lunch” (não existe esse negócio de almoço grátis).
Em que consiste o mito da segurança grátis? É o que promete distribuir segurança e tranquilidade para todos com a mera edição de uma nova lei ou reforma penal, sem custos para ninguém. O legislador brasileiro de 1940 a 2015 já promoveu 156 reformas penais (das quais, 75% são leis mais duras) e a criminalidade nunca baixou (ao contrário, só aumenta: em 1980 tínhamos 11 assassinatos para cada 100 mil pessoas; fechamos 2013 com 28,2). O legislador não é o único, mas é o grande responsável pela “venda” do “mito da segurança grátis”, que acredita na força (repressiva e preventiva) da alteração legislativa como “solução” para os graves problemas da (in) segurança pública.
Essa política nefasta e infértil (os resultados estão aí para comprovar sua ineficácia) já teria sido extirpada do solo brasileiro se as massas rebeladas (objetivamente indignadas) não caíssem esporádica ou frequentemente na tolice de acreditar no mito da segurança grátis. O Brasil não tem conseguido sair do atoleiro do semi-desenvolvimento (continua na vergonhosa posição 69ª no ranking mundial do IDH – Índice de Desenvolvimento Humano). Um dos termômetros desse sub ou semi-desenvolvimento é a questão da insegurança pública, que é alimentada por uma trágica criminalidade galopante (mais violenta nos criminosos das classes populares e mais corrupta e fraudulenta nos criminosos das classes dominantes).
Existe muita coisa de particularmente errado na formação histórica da sociedade brasileira (permissiva, anômica, não cumpridora das leis etc.), mas nada se compara com as classes dominantes (lideranças extrativistas) que a governa. São sucessivos governos de mau uso do dinheiro público: perdulários, preservadores de privilégios, fisiologistas, patrimonialistas, corruptos etc.
Não é por acaso que o Brasil é o 12º país mais violento do planeta. Esse é o resultado encontrado no levantamento do Instituto Avante Brasil, dentre 185 países, com dados de 2011, 2012 ou 2013 (fontes: UNODC e Ministério da Saúde, Datasus). Entre os 10 mais violentos, 9 estão na América Latina e Caribe, com exceção da África do Sul. São eles: Honduras, na primeira posição por mais um ano (2013: 84,3 mortes para cada 100 mil habitantes), Venezuela (53,6), Belize (45,1), Jamaica (42,9), El Salvador (39,8), Guatemala (34,6), São Cristóvão e Nevis (33,4), África do Sul (31,9), Colômbia (31,8) e Trinidad e Tobago (30,2). Em comum, todos esses países registram alta taxa de desigualdade econômica e social, escandaloso índice de corrupção e baixa escolaridade. O Brasil (em 2013), atrás de Bahamas, registrou uma taxa de mortes de 28,2 por cada grupo de 100 mil habitantes. Em números absolutos, está na primeira posição isolada, com 56.804 homicídios (de acordo com o Datasus).
Os países considerados menos violentos estão em sua maioria na Europa e na Ásia. Liechtenstein e Andorra dividiram a primeira posição com nenhum homicídio nos anos disponíveis. Em seguida vêm Luxemburgo (0,2), Islândia (0,3), Cingapura (0,3), Japão (0,3), Brunei (0,5), Bahrein, Eslovênia (0,5) etc. (são 78 países com mais de 5 assassinatos para cada 100 mil pessoas; 106 com 5 ou menos). Todos esses países se encontram no grupo do IDH elevado ou muito elevado, têm baixo ou médio índice de corrupção, pouca desigualdade econômica e social e bons ou ótimos índices de escolaridade. Os países com até 5 assassinatos para cada 100 mil pessoas possuem essas características; eles comprovam que não existe o mito da segurança grátis. Nos comportamos de forma muito tola quando acreditamos nesse mito.
Veja mais informações sobre este artigo aqui: http://luizflaviogomes.com/brasil-12o-mais-violento-do-planeta/
Colaborou Flávia Mestriner Botelho, socióloga e pesquisadora do Instituto Avante Brasil