quinta-feira, 9 de maio de 2024

Hélio Schwartsman - Crianças são crianças, FSP

 SÃO PAULO

Sempre um gentleman, Pierpaolo Cruz Bottini escreveu uma réplica à minha coluna "Vontade de punir" (3/5), sobre o caso de racismo numa escola de elite paulistana. O artigo é muito bom. Quase me convenceu a mudar de opinião. Quase.

Pier traça uma distinção forte entre o direito penal, campo em que ele concordaria com a ideia de que as sanções precisam ser mais moderadas quando aplicadas a menores, e a vida escolar, esfera em que a expulsão das garotas que perpetraram o ato de racismo estaria justificada. Tenho dificuldades com essa separação. O direito penal não é algo que nos foi um dia dado por Deus no alto do monte Sinai, mas um desenvolvimento —esperemos que para melhor— de mecanismos biológicos e culturais de promoção da sociabilidade que sempre existiram entre humanos. E não só humanos.

A atriz Samara Felippo durante entrevista ao Fantástico sobre caso de racismo sofrido pela filha em escola
A atriz Samara Felippo durante entrevista ao Fantástico sobre caso de racismo sofrido pela filha em escola - Reprodução - Reprodução

O princípio segundo o qual jovens devem ser tratados com maior tolerância transcende nossa espécie. Frans de Waal, que nos deixou há poucos dias, conta que até entre os ultra-hierárquicos babuínos —a extrema direita dos primatas—, macacos pequenos podem quase tudo, inclusive saltar na barriga de machos alfa sem ser incomodados. É possível que a própria assimilação de regras sociais tenha como pressuposto um período de aprendizado no qual elas não são impostas de modo draconiano.

Mesmo tendo cometido um abjeto ato de racismo, as garotas são crianças e como tal deveriam ser tratadas, no direito e na vida. Uma sanção escolar precisa ser aplicada, mas não creio que devamos logo de cara usar a mais drástica delas, que é a expulsão. A escola que opta por isso nega seu próprio DNA de instituição dedicada a ensinar, mais do que a punir.

Quanto à vítima, ela deve ser acolhida e receber solidariedade, mas não há como desfazer a agressão que sofreu. Ela terá de conviver com isso e com o racismo da sociedade, que, apesar de progressos recentes, não desaparecerá da noite para o dia.

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