terça-feira, 21 de maio de 2024

Alvaro Costa e Silva - Saudade dos bordões do futebol, FSP

 Nas ondas do rádio, João Saldanha era o "realmente técnico", referência a seus tempos no comando do Botafogo e da seleção brasileira. Saldanha era tudo, menos técnico: emotivo, irreverente, sem papas na língua. Com seu estilo para lá de coloquial, comentava os jogos como se estivesse discutindo futebol no botequim.


Certa vez os refletores do Maracanã apagaram antes de um clássico. O jeito era esperar. Deixaram o microfone aberto com Saldanha para que ele se virasse. Durante 50 minutos, uma eternidade no rádio, falou pelos cotovelos até que a partida pudesse ser iniciada. A conversa consigo mesmo fez com que a transmissão batesse picos de audiência.


A quarta (15) foi um dia aziago para a crônica esportiva. No espaço de poucas horas, morreram Washington "Apolinho" Rodrigues, Silvio Luiz e Antero Greco. O primeiro também poderia preencher qualquer tempo morto, entretendo "geraldinos" e "arquibaldos". A lista de expressões que adaptou da linguagem popular é enorme: "dar um chocolate", "cuspir maribondo", "mais perdido que surdo no bingo", "feliz que nem pinto no lixo", "briga de cachorro grande".


Formado no jornalismo gutenberguiano, Antero tinha o dom de informar com fino humor. Silvio Luiz era o "olho no lance", o "pelas barbas do profeta", inventor de formidáveis bordões que transformavam a pelada italiana numa atração imperdível: "foi lá no gogó da ema", "balançou o capim", "subiu a flanela", "agora é fechar o caixão e beijar a viúva", "o que é que eu vou dizer lá em casa".

Na comunicação dos três, não havia o "último terço do campo", para eleger um só pedantismo de hoje. As coisas mudam. Não adianta ter mania de passado nem "querer ficar do lado de quem não quer navegar", como no samba de Paulinho da Viola. Mas que os bordões dão uma saudade imensa, dão. Ouvi-los é como recuperar a infância e a juventude. Jogar botão outra vez, narrando os lances.

Retratos em preto e branco de Apolinho, Antero e Silvio Luiz
Apolinho, Antero Greco e Silvio Luiz, ícones do jornalismo esportivo - Reprodução/Rodrigo Capote/Folhapress

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