Lula fez campanha dizendo que não pretendia se reeleger. Durou pouco a promessa, se é que alguém acreditou. Não há quem duvide que o presidente tenha em mente um quarto mandato. Poderá até abrir mão da tentativa, a depender das circunstâncias –e essa possibilidade, por remota que seja, mantém acesa a disputa entre aspirantes a candidatos no campo governista.
No território da direita, a decisão judicial que tornou Jair Bolsonaro inelegível resolveu uma parte da equação. Mas complicou a outra. Não haverá ‘mito’ na urna eletrônica, mas o ex-presidente e o bolsonarismo estarão presentes –e muito– na disputa. Resta saber quem será o nome apoiado pelo ex-capitão. Os pretendentes estão fazendo a corte.
Em encontro com Bolsonaro num seminário realizado em abril, os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado, e de São Paulo, Tarcísio de Freitas, derramaram-se em elogios ao que seria "o maior líder político do Brasil hoje".
A grande incógnita chama-se Michelle Bolsonaro. Cogitada para o Senado, é personagem com carisma, que segundo a recente pesquisa Genial/Quaest se credencia a possível candidata ao Planalto, e também a levar o processo eleitoral para um cenário perigoso, encarnando uma espécie de Isabelita Perón do bolsonarismo.
Considerando quem votou em Bolsonaro em 2018, 74% afirmam que votariam em Michelle. Tarcísio teria o voto de 50% desse conjunto. Ela poderia ser vice numa chapa com o governador?
No todo, Lula conta com a intenção de 47% e ainda é o nome com maior potencial. Michelle teria 33%. Ambos têm rejeição em torno de 50%. Tarcísio é menos rejeitado, mas também menos conhecido.
Apesar do alto percentual de Lula e do fato de estar no topo da máquina, não se pode afastar a possibilidade de fiasco num segundo turno, especialmente num quadro em que não surja do outro lado uma clara ameaça institucional, como seria Michelle numa cabeça de chapa.
Hoje, o leque da candidatura lulista só tende a se fechar. As perspectivas de alguma adesão vinda do centro e centro-direita podem se complicar ainda mais caso se aprofundem equívocos em curso, como o ânimo intervencionista, a ambiguidade na área fiscal, o palavrório bala perdida e uma visão desenvolvimentista por vezes aloprada e sem convicção ambiental. A aparição de Paulo Pimenta e sua jaqueta vistosa para assumir o esquisito cargo de ministro para reconstrução do RS não pegou bem.
A própria personalidade autocentrada do petista, numa fase já mais avançada da vida (faz 79 em outubro), deixa dúvidas no ar.
Lula, em muitos aspectos, faz um bom governo. Em outros, não. Comete erros dispensáveis e vive a tropeçar nele mesmo. O status de aiatolá do progressismo não ajuda. Favorece um comportamento ególatra, irritadiço e avesso a críticas.
O presidente é um político antiquado e desatualizado em vários assuntos. Não hesita muitas vezes em desafiar evidências, no afã de mostrar que já tem a chave do sucesso. Embora seja um craque da negociação, as pressões que sofre em seu entorno nem sempre são as mais benéficas –em especial as do petismo raiz anacrônico.
Na hipótese de desistência de Lula, Haddad seria em tese o primeiro da fila do PT, mas vê crescer, cada vez mais, a companhia concorrente de Rui Costa, da Casa Civil, com seu estilo "deixa que eu chuto", que ganha terreno no governismo.
É muito cedo para prognósticos, nada está definido, mas o cenário, um ano e meio depois da vitória de Lula, vai se tornando mais enroscado e sugestivo. É possível que as eleições municipais venham a falar alguma coisa a mais sobre isso.
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