O negacionismo na área da saúde da gestão Jair Bolsonaro (PL) saiu de cena com a mudança de poder, mas ainda há rastros de insensatez. Em relação à dependência química, tanto Planalto quanto Congresso Nacional desafiam princípios de tratamento preconizados pela OMS e pela lei brasileira.
É o que se vê no suporte às comunidades terapêuticas (CTs). Só em emendas parlamentares individuais (sem contar as de bancada e comissões), foram destinados R$ 56 milhões no Orçamento deste ano a essas entidades controversas.
As CTs realizam um trabalho baseado em isolamento social, abstinência e religião —em 2020, 74% delas eram católicas ou evangélicas.
No entanto a Lei Antimanicomial, de 2001, veda "a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares".
A privação total do acesso à droga é criticado por especialistas, já que o paciente em algum momento não estará internado e precisará lidar com a oferta de psicoativos. Daí os melhores resultados da combinação de convívio social e familiar com a redução de danos.
Quanto à religião, a espiritualidade pode ser fator importante para a saúde física e mental. O problema é o foco em uma crença específica.
Pior, inspeções realizadas em parceria entre o Conselho Federal de Psicologia e Ministério Público Federal, além de estudos técnicos, mostram punições de pacientes e violações de direitos.
Por isso a legislação indica que o cuidado público de dependentes seja realizado pelo SUS, por meio da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Entretanto, em 2022, só 1% do orçamento nacional em saúde foi destinado a essa rede —a OMS recomenda 6%.
Bolsonaro inflou o aporte às CTs. Apesar da redução sob Luiz Inácio Lula da Silva (PT), até março ainda havia 262 unidades financiadas pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social.
É de lamentar que parlamentares direcionem dinheiro público a políticas públicas baseados em ideologia ou crença religiosa, não em critérios de eficiência e eficácia —e que o governo se submeta a pressões desse tipo.
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