A tentativa de detenção de Guilherme Boulos (PSOL) por policiais militares durante ato de campanha em São Paulo é sinal aparente da corrosão política que o governo de Jair Bolsonaro patrocina no Brasil. Boulos não é apenas candidato a deputado federal, é ativista de esquerda, com notória carreira voltada para a reforma urbana e para o direito à moradia. O recado é claro.
Agentes da segurança recebem estímulos do próprio presidente da República para transformar a divergência ideológica, raiz da democracia, em caso de polícia. Por isso, pequenos desmandos tornam-se rotina.
Em redes sociais, soldados da PM postam, sem medo de punição, frases como "cacete, bala e bomba nesses esquerdas". Um certo coronel Washington Lee, bolsonarista que se declara descendente de samurai, deputado estadual no Paraná, acha "interessante" a ideia de militares tomarem o poder por um golpe de Estado.
O que aconteceu com o coronel Aleksander Lacerda, militante bolsonarista e comandante da PM em Sorocaba, afastado por Doria em agosto de 2021, por atacar autoridades federais não alinhadas ao ideário fascista de Jair Bolsonaro? Está preso? Foi expulso? Ou, "arrependido", permanece na corporação, em algum "Estado-Maior Especial", recebendo salário e conspirando contra a democracia?
O que aconteceu com o patético e suspeito general Eduardo Pazuello que, na ativa, desrespeitou os regulamentos militares e participou de ato político-partidário? Nada. É candidato bolsonarista no Rio de Janeiro.
Segundo reportagem do UOL, em Jundiaí, interior de São Paulo, oficiais instruem a tropa a votar em Jair Bolsonaro e na figura também repulsiva de Tarcísio de Freitas.
A politização das PMs faz parte de um processo complexo e gradual, que evidentemente não se inicia em 2018, mas a figura nefasta de Jair Bolsonaro, com o discurso de legitimação da letalidade policial e de defesa da impunidade para abusos contra direitos humanos, estabelece uma situação de inegável conforto para tropas vocacionadas para a violência e para o racismo.
Cresce a chamada bancada da bala no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas. Governadores são omissos e convivem com a insubordinação. A Justiça Militar reafirma periodicamente sua tolerância infinita.
O recente informe "Policiais, Democracia e Direitos", publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, merece uma leitura pessimista. Se os resultados globais indicam adesão majoritária dos profissionais de segurança pública à "democracia", há indicadores alarmantes.
Estima-se que entre 15% e 40% dos respondentes "podem ser considerados radicalizados ou potencialmente radicalizáveis, a depender da conjuntura política e institucional". Estes são os que "não discordam ou relativizam um golpe de Estado".
Se Jair Bolsonaro é considerado legítimo representante do povo, da família e dos cristãos, líder democrata perseguido pelo autoritarismo infame e patife do Supremo Tribunal Federal, vítima do arranjo fraudulento das urnas eletrônicas, a mobilização de forças de segurança em favor de ruptura institucional não parece algo distante ou surpreendente.
Mesmo que seja derrotado domingo ou no segundo turno, mesmo que Lula assuma a Presidência da República sem um visível trauma institucional, Jair Bolsonaro deixa bombas-relógio nos quartéis do Brasil. Desarmá-las é um dos principais desafios da nossa conturbada democracia.
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