Fonte: G1 - 04.09.2022 |
Bruno Leoni/g1 São Paulo - O impacto ambiental gerado pelas mudanças climáticas tem levado tanto a população a repensar sua forma de viver como setores da economia a repensarem os serviços e produtos oferecidos. E isso não tem sido diferente no setor imobiliário.Lançada na terça-feira (30) no Residencial AlphaVille, no bairro Santa Rose Ipes, em Piracicaba (SP), a Casa Verde, que conta 300 metros quadrados, se propõe a ser uma referência em relação às habitações sustentáveis, com recursos que vão de telhas que geram energia a um solo que permite a permeabilidade da água, para manter nutrientes. O g1 Piracicaba entrevistou os responsáveis pelo projeto e o dono do empreendimento, a fim de criar um guia sobre o que é uma residência com certificação de sustentabilidade, bem como suas tecnologias e o processo envolvido. Possível saída para a crise climática Produzida a partir de um estudo em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), a Fundação Vanzolini e a arquiteta Mirtes Luciani, que também é professora, a casa foi pensada exclusivamente para servir de exemplo em acessibilidade e saúde, além de englobar as questões ambientais que uma residência possui. “É a saída para as mudanças climáticas, e creio que será uma tendência no mercado. Temos que avaliar o custo de um móvel para o meio ambiente, e isso vai muito além de entender o impacto sobre terreno. É necessário entender como o solo é afetado, consumo de energia, enfim, como esse imóvel afeta meu bairro, minha cidade, até mesmo meu vizinho”, afirma Mirtes. Telhas fotovoltaicas e solo que respira A estrutura da residência é completamente voltada para atender as exigências ambientais das certificações, que avalia todo o sistema que envolve a construção, sendo a primeira no Brasil a usar tecnologia da telha fotovoltaica, que é capaz de transformar energia solar em energia, além de controle de resíduos, recursos naturais e um biodigestor para tratamento de esgoto. “Precisa de estudo sério para fazer uma casa assim, é um investimento. A casa possui sistemas inteligentes de, por exemplo, coleta de água da chuva. Pensamos também no terreno, sendo assim, fizemos um chão, no lado externo da casa, em que água penetra o solo, fazendo com que os microrganismos e a própria terra respirem e tenha nutrientes. Telhado, piso, tipo de tinta, tipo de parede, tudo foi pensado para a eficiência. ”, diz a arquiteta. O engenheiro Marcos Aprilanti, que participou da produção da casa, fala que a tendência é que o mercado tenha que ficar mais responsável. “Veja bem, estamos falando de um processo que começa desde a avaliação da origem dos materiais usados na construção até a forma como uma janela é posicionada para causar mais claridade. A humanidade deve caminhar para isso”, afirma. Água com captação da chuva e energia solar Segundo os dados levantados pelos engenheiros da residência, estima-se que o consumo anual será de 15.278 kWh/ano, sendo a geração de energia solar em 10,903 kWh/ano. Dessa forma, 71% da energia elétrica utilizada será renovável. Além disso, a arquiteta afirma que até mesmo a métrica das torneiras foi pensada. “Toda a água de vaso sanitário daqui é colhido da chuva, então temos vários pensamentos em pequenos detalhes que no final fazem a diferença. Como a residência é certificada, precisamos pensar antes, então, no planejamento, já se define aonde se pode chegar, no caso, o proprietário quis focar no consumo de energia e água, então toda a estrutura é voltada para esse pensamento”, pontua a arquiteta. Já no caso da água, a casa tem sistemas de aquecimento da água do banho que usa energia solar e energia fotovoltaica. A gestão de economia é feita com reservatórios que captam águas da chuva. Com o sistema, a estimativa é de redução de 46% no consumo do recurso. “No caso dos pontos de saída de água, o projeto usou torneiras com metragem reduzida, justamente para evitar desperdícios e um consumo desnecessário”, comenta. Retorno financeiro em cinco anos Segundo a estimativa feita pelo projeto, o retorno do investimento igualado a um imóvel padrão é de cinco anos, dependendo de como o investimento for feito. “Tudo depende do planejamento. Onde vai ser gasto? Qual a proposta? Eficiência, economia, ou os dois? Aqui não é mais caro, a única coisa é que o investimento inicial é maior, mas ao longo do tempo, esse investimento se dilui no quesito de manutenção, durante os anos. Quanto custa a manutenção de uma casa hoje?”. Certificação nacional e internacional A residência possui 11 requisitos do nível máximo da certificação AQUA-HQE, que por definição é uma construção de alta qualidade ambiental. A certificação foi possível graças a uma parceria com o governo francês, pelo Centro Científico e Técnico para a Construção. Além dessa certificação, outras estão presentes no imóvel, como a da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a NBR 9050, de acessibilidade universal no imóvel. A casa também conta com a Etiqueta do Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE-Edifica), de eficiência energética. Como foi possível? “Foram estudados, por especialistas, certificadores sustentáveis pelo mundo, e chegou-se à conclusão de que um dos melhores era um projeto francês, desenvolvido cerca de vinte anos atrás. Os franceses se demonstraram animados após o conato, transferirem ‘know-how’ para adaptação, pois a legislação é diferente, as normas são diferentes, a forma como se constrói é diferente, e em um ano e meio, trouxemos a certificação para cá, em 2008”, afirma Bruno Casagrande, gerente de marketing da Fundação Vanzolini. Para conseguir uma certificação, deve-se atender a uma série de requisitos, disponíveis no site da Fundação Vanzolini, que possui um departamento técnico com todos os critérios, que são públicos, mas que devem ser seguidos para ser obter a certificação. Qualquer interessado pode consultar os critérios, sendo obrigatórios para obter qualquer tipo de certificação. As certificações são diferentes entre si, atendendo critérios diferentes e projetos diferentes. Quanto custa? Segundo o engenheiro e proprietário do imóvel, Fernando Berssaneti, o metro quadrado ficou em R$ 6 mil, mas valeu a pena. “Não queria que coisas triviais de uma residência comum incomodassem. A residência é para meus pais, que são idosos, então pensamos em sermos ecologicamente corretos de fato, mesclando com elementos da acessibilidade.” Dificuldades na formalização O maior desafio do projeto foi a formalidade e o fornecimento, que deve atender requisitos das certificações, grande parte, voltado para a origem dos produtos, bem como a origem do fornecedor. “Tivemos que verificar se tudo era formal, se a mão de obra é legalizada, se recolhia os tributos. Tivemos que inclusive abrir empresas para certos setores, para a emissão de nota fiscal. Tornar o trabalho formal foi o mais desafiador”, conta. |
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