domingo, 5 de setembro de 2021

Muito bom Norman: Confie em Mim (filme /crítica adoro cinema)

 Um simpático judeu com pinta de fracassado perambula por Nova York em busca de seu lugar ao sol, ao som de uma trilha de galhofa. Poderia ser mais um alter ego de Woody Allen, no mais novo filme de... Woody Allen, mas é Richard Gere, no primeiro longa-metragem de língua inglesa do israelense Joseph Cedar (de Beaufort e Nota de Rodapé, ambos indicados ao Oscar de filme estrangeiro).


Norman: Confie em Mim é centrado na figura de Norman Oppenheimer (Gere), uma peça – ao que tudo indica – esquecida do mercado financeiro, que, em busca de se tornar relevante, procura negociar informações privilegiadas. A grande chance acontece quando o protagonista conhece Micha Eshel (Lior Ashkenazi, ótimo), um jovem político israelense em ascensão na carreira.


Um magnata (Dan Stevens), um rabino (Steve Buscemi) e um “sobrinho” (Michael Sheen). O que parece o início de uma anedota judaica, na realidade, é a rede de contatos de Norman, a quem ele passa a atender/ ser atendido depois que Micha, seu amigo (?), alcança o cargo de Primeiro Ministro de Israel. Sabe aquela história (bem familiar, aliás) de tirar proveito de “Fulano, que é amigo de Beltrano, que conhece Sicrano...”?

Mais do que encenar uma “piada”, a trama do filme está para uma livre interpretação do conto do “Chantagista Judeu”, tão presente na cultura desse povo. De forma dinâmica, a produção acompanha o girar da roda que ora põe a figura central por cima da carne seca (kosher?), ora na pior. Bem-intencionado – aparentemente, pelo menos, afinal, a natureza dos negócios de Norman é, no mínimo, questionável –, o afável homem se vê envolvido em um tabuleiro de lobbies dentro do qual suas pecinhas parecem pequenas demais.


Para além da complexidade do jogo político-financeiro – e de todas as referências judaicas –, representada de forma fidedigna, o que o filme traça é um retrato da corrupção que foge ao maniqueísmo. E, em última análise, captura de forma tocante a melancolia – doce, até – de um tipo considerado descartável pelo capitalismo selvagem: o do experiente – ou velho mesmo.

Nesse sentido, a escalação de Gere como personagem principal soa tão irônica quanto adequada. Bem menos “presente” nos cinemas hoje – há quem diga que o engajamento do ator pela independência do Tibete teria desagradado o tão almejado mercado chinês e, consequentemente, feito “rarear” os papéis em Hollywood –, o ex-galã entrega aqui uma das melhores performances da carreira.

No fim, uma sátira que remete à boa forma de Woody Allen.

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