Temos insistido na importância do descolamento entre o desempenho da economia e o ambiente de turbulência e incerteza política permanente em que vive o país. Os números da atividade econômica surpreendem positivamente sob vários aspectos, e uma recuperação cíclica mais robusta é um passo importante na retomada do crescimento.
Não podemos, entretanto, esquecer o trabalho de pavimentar o futuro e trabalhar pelas reformas de que o Brasil precisa. A agenda de longo prazo é conhecida (elevação da produtividade, codinome do crescimento econômico, e investimento em capital humano, entre outros fatores), mas as reformas como a administrativa e a tributária são peças complementares a esse processo.
As discussões em torno da reforma tributária ocupam cada vez mais espaço relativamente à reforma administrativa. Embora ambas sejam de extrema importância e tenham obstáculos políticos distintos, a última parece merecer maior destaque no momento. A tributária não está madura. Não há um projeto coeso para a reformulação da tributação do consumo e da renda, e as disputas setoriais, entre entes federativos, e entre os grupos no Congresso continuam a impedir a construção de um denominador comum coerente.
No caso da reforma do Estado, as resistências estão onde sempre estiveram: numa casta de privilegiados que se apropriou do poder e do excedente produtivo. Um dos lobbies mais poderosos de Brasília agora conta com o reforço —explícito e de bastidores— da "tropa de choque" do Planalto. Não contente em proteger pequenos grupos na reforma da Previdência e em autorizar vencimentos extra-teto para servidores do Executivo, agora trabalha também junto a congressistas para barrar o avanço das discussões em torno da sua própria reforma. O primeiro termômetro desse processo pode ser visto no placar da votação do parecer da CCJ: 39 x 26, 9 votos contrários a mais do que os 17 dos partidos de oposição.
As dificuldades, mesmo de um projeto que trata "apenas" do futuro, são reveladoras e requerem empenho de toda a sociedade. Sob quase todas as métricas disponíveis (salários, critérios de avaliação e progressão de carreira, gastos per capita ou em % do PIB etc.), o Brasil destoa de seus pares e, em alguns casos, tem padrões nórdicos.
A única categoria que passou incólume em termos de renda e emprego na pandemia deve dar a sua contribuição, e o país precisa de um serviço público mais eficiente, produtivo, moderno e despido dos privilégios e dos penduricalhos flagrantemente imorais de que desfruta. Ao contrário do que a elite do funcionalismo pensa, ela não vive num "miserê danado".
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