quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Na crise, construção sofreu menos do que esperava. Gazeta do Povo


Giulia Fontes

No início da crise do novo coronavírus, a expectativa do setor da construção civil não era das melhores. Afinal, em tempos de contração econômica e incertezas, parecia claro que a tendência seria de retração também na compra de imóveis. A realidade, porém, se mostrou completamente oposta: além de sofrer menos do que o inicialmente esperado, o setor conseguiu se recuperar rapidamente. Junho, de acordo com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), foi o melhor mês para a indústria da construção civil no Brasil em quatro anos.


O comportamento do setor na pandemia se reflete no número de postos de trabalho com carteira assinada na construção civil. De acordo com a última divulgação do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, os meses de março, abril e maio tiveram saldo negativo no estoque de empregos formais na construção (-17.317, -71.292 e -20.950, respectivamente).


Mas, em junho, o setor começou a recuperar os postos de trabalho, e teve saldo positivo de 17.270 vagas. Além da construção, só a agropecuária registrou mais admissões do que contratações (saldo de 36.836) na última divulgação do Caged.



“Um dos problemas que a gente tem agora é de falta de material de construção. Produtores de cimento desligaram os fornos, pensando que haveria menos demanda. De aço, a mesma coisa. Agora começou a faltar, porque nem eles imaginavam que teríamos bons resultados na pandemia”, diz José Carlos Martins, presidente da CBIC.


O que explica os bons resultados, mesmo na crise

Não há apenas um fator que explica como a construção civil conseguiu ter bons resultados mesmo com a crise do coronavírus. Um conjunto de medidas deu apoio às construtoras e impediu que o baque não fosse tão grande quanto era esperado no começo da pandemia.


De início, as empresas do setor conseguiram manter suas operações mesmo quando boa parte das atividades produtivas estava suspensa. Assim, obras que já estavam sendo realizadas não foram paralisadas, o que afetou pouco os cronogramas já estabelecidos.


“As obras não pararam completamente, mas tiveram que passar por um período de adaptação. Tivemos que fazer turnos diferentes para evitar aglomeração, medir a temperatura dos funcionários, mudar os refeitórios. Isso tudo ocorreu principalmente no primeiro mês. Depois, a gente começou a ver uma normalidade”, diz Matheus Lauand, diretor executivo do grupo que engloba as construtoras Bild Desenvolvimento Imobiliário (de empreendimentos de alto padrão) e Vitta Residencial (de residenciais populares).


Com lojas fechadas, construtoras investiram em vendas online e visitas virtuais a imóveis

Como efeito da pandemia, as construtoras perceberam, ainda, um aumento no interesse pela aquisição de imóveis. A lógica é simples: na quarentena, as pessoas começaram a passar mais tempo em casa e perceberam necessidades que antes não ficavam tão evidentes.



Mesmo com o interesse do consumidor, as empresas tiveram de contornar o fechamento de lojas. A aposta foi por tentar digitalizar ao máximo a venda de imóveis, incluindo a visita a apartamentos decorados.


“Mesmo nos lugares em que era possível deixar as lojas abertas, preferimos fechar e fazer as vendas 100% online. O que notamos foi que o volume de vendas ficou estável, os clientes continuaram interessados. Deu muito certo”, diz Renan Sanches, CFO da construtora Tenda, de imóveis populares.


No caso da Bild, a aposta foi por criar vídeos que possibilitassem a visualização de todo o apartamento, do prédio e das áreas de lazer, para contornar a impossibilidade de fazer as visitações in loco. “O cliente se adaptou a essa realidade e está sentindo segurança em fechar o negócio”, afirma Matheus Lauand, diretor-executivo do grupo.


Fatores econômicos, além disso, ajudaram a tornar o investimento em imóveis mais atrativo. Com a taxa básica de juros (Selic) em seu menor patamar histórico (caiu a 2% ao ano no início de agosto), deixar o dinheiro guardado na caderneta de poupança, por exemplo, ficou pouco vantajoso para os consumidores que não se aventuram em investimentos mais arrojados.


Ações da Caixa Econômica Federal também contribuíram para dar ânimo ao mercado. No início da pandemia, o banco estabeleceu um período de carência para o começo do pagamento de financiamentos de imóveis. Já em julho, a Caixa autorizou a inclusão do Impostos sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e dos custos cartorários nos contratos, reduzindo o montante que o consumidor precisa ter à mão na hora de comprar um novo imóvel.

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