Faz alguns anos que o maior assunto da política é a ascensão da nova direita. As esquerdas, que antes —dizem— teriam oprimido intelectualmente todos nós, agora estão na descendente. Uma estrela cadente, digamos.
A realidade, como sempre, é mais complexa do que a narrativa. Ao chegar ao poder e ter que, de fato, governar, a nova direita se tornou "as direitas". Liberais-na-economia-conservadores-nos-costumes, libertários, religiosos, lava-jatistas, militaristas, faria-limers etc. haviam abraçado o bolsonarismo oportunisticamente, para chegar ao poder. Agora, descobrem, uns surpresos, outros nem tanto, que não fizeram o Rei. O Rei é que os instrumentalizou para estar onde está. E com o seu completo consentimento.
O poder corrompe até quem se elegeu discursando sobre corrupção pelo poder. É possível que o Aliança pelo Brasil herde do partido Novo mais do que só a novidade. As direitas brasileiras brigam entre si pela pureza direitista valendo-se de um método já conhecido: jogando seus novos desafetos para o lado de lá.
Paralelamente ao racha da direita, surgem indícios de uma rearticulação das esquerdas. A volta do kirchnerismo na Argentina em 2019. A eleição de Arce na Bolívia. O "sim" em prol de uma nova Constituição no Chile, abandonando de vez a herança de Pinochet. A possível --quase provável-- vitória de Joe Biden nos EUA.
Talvez seja muito forte dizer que é uma tendência. Afinal, quatro anos atrás estávamos comentando que os EUA elegeriam sua primeira mulher presidente. Mas tudo isso tampouco quer dizer que o nacional-populismo vai desaparecer do debate público. O tema chegou para ficar.
Pode ser apenas uma consequência do fato de que a maior crise já enfrentada em gerações chegou exatamente quando a nova direita estava se assentando no poder. Mas serve para lembrar que nunca se deve ficar muito confortável, mesmo com a caneta na mão, e nunca se deve perder a esperança, mesmo diante do inimaginável.
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