quarta-feira, 27 de maio de 2020

A relação entre vidas perdidas e erro na tomada de decisão política, OESP


No Brasil, será importante ver quantas mortes poderiam ter sido evitadas com medidas precoces de isolamento

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Um estudo publicado nos Estados Unidos nesta semana pela Universidade Columbia calcula o número de mortes que poderiam ter sido evitadas se as medidas de isolamento social tivessem sido decretadas uma semana antes do que foram no país. A tomada de decisões por governos em contexto de crise salva ou aumenta a perda de vidas. São, portanto, ações políticas da maior relevância. Os EUA, em toda a Segunda Guerra, perderam 200 mil vidas e, somente em três meses da pandemia do coronavírus, perderam 100 mil vidas. A decisão pela guerra implica, sobretudo, em perda de vidas. A decisão pelo não isolamento na crise da Covid-19, também. O estudo da Columbia diz que se o lockdown nos EUA tivesse ocorrido apenas uma semana antes, 36 mil mortes teriam sido evitadas.
No Brasil, lamentavelmente, passamos de 23.600 mortes. Projeções alertam que podemos vir a ser o primeiro país em número de mortes no mundo. Nossas desigualdades muito contribuem para isto, mas a falta de alinhamento entre as lideranças políticas com o presidente, que desestimula reiteradamente o isolamento social, é fator preponderante para o agravamento deste quadro. Pior do que nos EUA —que atrasaram, mas decidiram— a falta de decisão pelo isolamento no Brasil cobra com vidas.
A Argentina perdeu para a pandemia 450 vidas (10 mortes por milhão de habitantes) até o momento e tem 11 vezes menos mortes que o Brasil (112 mortes por milhão de habitantes). Decisões rápidas por isolamento social e alinhamento entre as diferentes esferas de governo reduziram perdas de vidas.
Portanto, para o bem e para o mal, há uma responsabilidade das lideranças políticas no maior ou menor número de mortes. Da mesma maneira que a democracia permite o reconhecimento de governos, deve também ser capaz de responsabilizar os dirigentes por erros graves de tomadas de decisão. Amadureceremos como sociedade e democracia à medida em que cobrarmos mais a responsabilidade de políticos em suas tomadas de decisão.
O enorme sofrimento que estamos vivenciando com a crise humanitária tem que contribuir para uma mudança de padrão na relação entre a sociedade e os políticos. Os líderes políticos são avaliados nas eleições e na checagem do apoio ao governo nas pesquisas de opinião. Mas, além disso, podem ser responsabilizados judicialmente pelo número de mortes que poderiam ser evitadas.
O aumento de mortes nos EUA, como mostra o estudo, poderá ensejar ações judiciais que responsabilizam o presidente da república. No Brasil, será importante compreendermos quantas mortes poderiam ter sido evitadas caso as medidas de isolamento social tivessem sido tomadas a tempo.
A lição que podemos aprender depois dessa trágica experiência que vivemos tem a ver com a importância da política, o papel do Estado, a melhoria da saúde, a necessidade de apoio aos mais vulneráveis e, também, com formas de responsabilizar líderes por tomadas de decisão erradas que custam vidas.
Jorge Abrahão
Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

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