27 de maio de 2020 | 04h00
Assim como acontece com as estimativas para o desempenho do PIB brasileiro, que vêm sofrendo seguidas revisões para baixo, ainda pairam incertezas sobre qual será o impacto completo no mercado de trabalho das medidas de restrição à atividade econômica, adotadas por Estados e municípios, para conter a disseminação do coronavírus.
O IBGE divulga hoje a taxa de desemprego referente ao trimestre encerrado no mês de abril, o pior em termos de atividade econômica desde o início da pandemia do coronavírus, com o consenso entre os analistas apontando um aumento de 1 ponto porcentual nessa taxa, passando de 12,2% no trimestre encerrado em março para 13,2% em abril.
Esse indicador está longe de refletir a realidade: a queda rápida da população econômica ativa (PEA), com o aumento no número de pessoas que deixaram de procurar trabalho, acaba gerando um efeito estatístico, limitando a alta na taxa de desemprego. Em março, por exemplo, houve até quem estimasse que a queda na taxa de participação da força de trabalho tirou quase 1 ponto porcentual da taxa de desemprego.
Além disso, a leitura desse indicador para o trimestre encerrado em abril ainda estará contaminada pelos números de fevereiro, antes das medidas de distanciamento social terem quase paralisado a atividade econômica no País.
Espera-se, portanto, que a taxa de desemprego suba com mais força a partir de maio e que o seu pico aconteça no terceiro trimestre, devendo superar o patamar de 18%, nos cálculos de alguns analistas. Em dezembro de 2019, a taxa de desemprego foi de 11,9%.
Outras métricas dão uma noção do tamanho do estrago da pandemia no mercado de trabalho: os pedidos de seguro-desemprego aumentaram 76,2% na primeira quinzena de maio ante o mesmo período de 2019. Em abril, houve alta de 22,1% nesses pedidos. Mas o Ministério da Economia estima que haja uma fila de 250 mil solicitações represadas do período em que as agências do Sine estavam fechadas.
Para Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria Integrada, a taxa de desemprego não é uma boa métrica isoladamente.
“Primeiramente, porque a PEA está caindo, pois as pessoas não têm procurado emprego”, diz. “Assim, é importante olhar o comportamento das pessoas que estão fora da PEA, ou seja, métricas ligadas a desalento e inatividade. Além disso, acompanhar a subocupação, pois a pessoa pode seguir ocupada, mas por menos horas.”
Por enquanto, Alessandra mantém uma estimativa de queda do PIB brasileiro de 4,1% em 2020 e, nesse cenário, a taxa de desemprego atingiria o pico de 15,5% em julho. Ela projeta um crescimento do PIB de 3,6% em 2021. Com isso, a taxa de desemprego somente voltaria aos níveis de 2019 no fim de 2024. Mas essas estimativas de PIB, segundo a sócia da Tendências, estão sob revisão e, portanto, a taxa de desemprego poderá ser pior do que ela está prevendo atualmente.
A coordenadora do Boletim Macro do Ibre/FGV, Silvia Matos, projeta um aumento da taxa de desemprego para 18,7% em 2020. Essa estimativa embute uma previsão de queda de 10,5% na população ocupada e um recuo esperado da PEA de 3% que devem atenuar o aumento do desemprego no ano.
Ela espera uma queda de 5,4% do PIB neste ano e um crescimento da economia de 2,5% em 2021, mas alerta para risco de uma recessão mais profunda neste ano, sem uma retomada mais forte no ano que vem.
“Como o choque ocorre em setores intensivos em mão de obra, a queda da renda também será intensa, mesmo com as medidas de benefícios temporários”, diz Sílvia. O setor serviços, por exemplo, emprega em torno de 70% de toda mão de obra do País.
“Estimamos uma queda da massa de rendimento ampliada de 10,7%. Essa destruição de emprego e renda nunca foi observada em outros períodos; é um quadro sem precedentes.”
Setores da economia percebidos como de alto risco frente aos efeitos da pandemia concentram 42% da população ocupada no País. E dados do Sebrae apontam que cerca de 52% da população ocupada está concentrada em empresas com até cinco funcionários, justamente as que não têm conseguido acesso a crédito neste momento. Ou seja, a situação do emprego pode ser bem pior que os indicadores oficiais mostram.
*É COLUNISTA DO BROADCAST
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