Um racha entre partidos de centro ameaça deixar para depois das manifestações do dia 15 de março a análise dos textos enviados pelo governo Jair Bolsonaro para a divisão do chamado Orçamento impositivo.
Nesta terça-feira (10), as tentativas de aprovar os projetos de lei sobre a divisão de recursos federais fracassaram. O controle do dinheiro público motivou mais uma crise entre Planalto e Congresso.
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), estavam dispostos, até a noite desta terça, a liquidar o assunto nesta semana e votar os textos.
Uma parte das siglas do chamado centrão pressiona a cúpula do Congresso para votar ainda nesta quarta-feira (11) os projetos com o objetivo de virar a página.
A questão, porém, não é consenso entre os principais líderes. Um grupo defende que não há clima político para votar as mudanças no Orçamento em razão das manifestações pró-governo e anti-Legislativo.
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O clima piorou após provocações feitas pelo presidente ao Congresso, durante uma viagem a Miami (EUA).
Lá, onde falou a empresários brasileiros, o presidente voltou a criticar o Legislativo e sugeriu que, se deputados e senadores desistirem de controlar parte do dinheiro do Orçamento, as manifestações de domingo poderiam ter menor adesão.
A atitude de Bolsonaro surpreendeu o Congresso, uma vez que, na semana passada, ele havia enviado projetos de lei para pôr fim ao impasse da partilha dos recursos federais. Isso indicava a celebração de um acordo.
As novas declarações do presidente, contudo, trouxeram instabilidade e acentuaram a divisão dentro dos próprios partidos de centro que costuraram esse trato. Um dos temores é que Bolsonaro vete os dispositivos.
Com isso, os congressistas ficariam com o desgaste de ter aprovado um projeto supostamente em benefício próprio, em uma narrativa que inflamaria ainda mais a base de apoio do governo contra o Legislativo.
Mesmo se não vetar a divisão dos recursos, parlamentares temem que Bolsonaro siga inflamando sua base de apoio contra os deputados.
Na noite de segunda-feira (9), em jantar que se estendeu até a madrugada, uma parte dos líderes de partidos do centrão expressou a Maia a preocupação com o desgaste provocado por Bolsonaro.
Eles sugeriram deixar para a próxima semana a análise dos projetos para votar a matéria com a temperatura mais baixa.
A maioria do grupo, porém, argumentou que o Congresso não pode se pautar pelas manifestações. Seria preciso então liquidar o quanto antes esta pauta. Maia encampou esta última tese.
Para tentar aparar arestas, aliados dos chefes de Poderes costuraram uma reunião para esta quarta. O encontro pode levar a novo entendimento sobre o acordo envolvendo o Orçamento impositivo.
A discussão da proposta nesta terça foi interrompida por manobra de congressistas do Novo e do grupo "Muda, Senado!", que obstruíram a sessão desde o meio-dia. O PT referendou a medida.
No fim da tarde, uma falha no microfone do relator dos projetos, deputado Cacá Leão (PP-BA), cortou a sessão da CMO (Comissão Mista de Orçamento) por quase meia hora.
Depois disso, alegando quórum baixo, o presidente da CMO, senador Marcelo Castro (MDB-PI), suspendeu a sessão, afirmando que irá retomá-la nesta quarta.
Leão deixou o plenário do colegiado demonstrando irritação e não falou com os jornalistas.
Paralelo a isso, congressistas de partidos como Novo, Podemos, Rede, PSL e Cidadania começaram a recolher assinaturas de apoio a uma carta que pede a Bolsonaro que retire um dos projetos enviados pelo Executivo.
A proposta trata exatamente do texto que permite ao Congresso controlar R$ 15 bilhões dos R$ 30 bilhões que inicialmente estavam sob decisão do relator do Orçamento, deputado Domingos Neto (PSD-CE).
Entre os signatários de carta estava o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente da República.
Alguns deputados disseram acreditar que, longe do Brasil, Bolsonaro foi influenciado por auxiliares da área mais ideológica do governo. Eles o acompanham desde sábado (7) na viagem aos Estados Unidos.
"O presidente mente, provoca o país usando artifícios como este do Orçamento", disse o deputado Zeca Dirceu (PT-PR).
"Não duvide que, aprovado este projeto do governo, com o voto unânime dos congressistas, o governo não vá para a rua dizendo: 'Olhe, fomos chantageados de novo pelo Congresso'."
Quem apresentou os PLNs [projetos de lei] foi o presidente Jair Messias Bolsonaro. Estamos aqui analisando os seus projetos", afirmou o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).
Caso Bolsonaro, que chega dos Estados Unidos na madrugada desta quarta-feira, decida recolher o PLN 4 (projeto de lei do Congresso Nacional nº 4), pode agravar a crise entre governo e o Congresso.
Nesta quarta, o presidente irá se encontrar com os ministros Paulo Guedes (Economia), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Jorge Oliveira (Secretaria Geral) para definir o que será feito. A retirada do PLN 4 está em avaliação pelo governo.
Na semana passada, em uma reunião com Alcolumbre e líderes partidários, Maia chegou a dizer, segundo relatos de participantes, que, se o governo descumprisse o acordo, não votaria nenhum outro projeto de remanejamento orçamentário do governo até o fim do ano.
O Executivo apresentou na semana passada três projetos em troca de que o Congresso mantivesse os vetos que Bolsonaro fez ao Orçamento impositivo.
Dos três PLNs apresentados no trato, apenas um, o mais simples, que apenas regulamenta o Orçamento impositivo, foi aprovado na CMO. O texto mais complexo, que trata da divisão de mais de R$ 30 bilhões, ainda não foi apreciado.
Na Câmara, diante das divergências, ainda há o receio de que o Senado não tenha votos suficientes a favor dos projetos. Os textos precisam de maioria simples —metade mais um dos presentes— para serem aprovados.
Os senadores mais otimistas, no entanto, passaram a Alcolumbre o cálculo de que havia ao menos 50 votos a favor dos textos enviados pelo governo. Com isso, garantiriam o acordo sobre o Orçamento impositivo.
Parte da resistência passa pelo receio de senadores de que Alcolumbre não distribua as emendas igualmente entre os parlamentares.
O presidente do Senado já indicou a aliados que não quer mesmo contemplar aos integrantes do "Muda, Senado!" uma fatia do dinheiro. O argumento é que eles não endossaram o acordo. Logo, não têm direito aos recursos.
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