terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Pablo Ortellado - Censura no Instagram, FSP

Censura no assassinato de general iraniano mostra risco de concentrar comunicação em empresas estrangeiras

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O Instagram excluiu perfis e publicações de usuários que comentaram o assassinato do general iraniano Qassim Suleimani. Não foram censuradas apenas contas do governo iraniano. Segundo a Federação Internacional dos Jornalistas, pelo menos 15 jornalistas iranianos tiveram suas contas excluídas por publicações a respeito do assassinato. 
O Instagram era a única das grandes plataformas de mídia social que não havia ainda sido proibida pelo governo iraniano. Justamente por isso tinha 24 milhões de usuários, cerca de 40% da população adulta. Cidadãos do Irã que utilizavam o Instagram para escapar da censura do regime sofrem agora censura da empresa.
Em abril de 2019, a Casa Branca classificou a Guarda Revolucionária como organização terrorista estrangeira. Logo em seguida, o Instagram derrubou o perfil da Guarda Revolucionária e do próprio Suleimani.
Mas essa leva recente de remoção excluiu também publicações de pessoas sem qualquer filiação com o governo, como mostrou reportagem do site americano Coda. O caso mais proeminente foi o do jornalista Emadeddin Baghi, um notório crítico do governo iraniano, que teve excluídas publicações aparentemente por designar o assassinato de Suleimani como "martírio". Publicações fora do Irã também foram excluídas. A executiva Bahareh Letnes, que vive na Dinamarca, teve uma publicação censurada por chamar Suleimani de "herói de guerra". 
O Instagram alegou para o site Coda que apenas cumpre as sanções exigidas pelas leis americanas após o governo considerar a Guarda Revolucionária terrorista.
A censura no Instagram deveria acender sinais amarelos por aqui. O Instagram é cada vez mais utilizado no Brasil para debater temas políticos. Atualmente, temos pelo menos 40 perfis políticos com mais de 500 mil seguidores. Além disso, o episódio nos lembra que somos completamente dependentes de empresas que operam sob jurisdição americana.
Os Estados Unidos estão atualmente em campanha comercial, alertando para o perigo de países que estão construindo suas redes 5G adotarem tecnologia chinesa que estaria sujeita a interferência política. Esse, aliás, parece ser um dos motivos do atraso do leilão brasileiro do 5G, que favoreceria empresas americanas, tecnicamente menos qualificadas que a chinesa Huawei. 
O caso da censura do Instagram, somado à memória recente das denúncias de Edward Snowden, mostra que, enquanto não tivermos operadores nacionais competitivos na área de comunicação digital, teremos que escolher entre nos submeter ao arbítrio dos americanos ou da ditadura chinesa.
Pablo Ortellado
Professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.

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