Taxar o comércio de bebida, que jamais deixou de existir, tornou-se crucial após a crise de 1929
Completam-se nesta sexta (17) cem anos da proibição de venda de bebidas alcoólicas nos EUA, a chamada Lei Seca, uma noite que durou de 1920 a 1933.
A emenda constitucional que a instituiu não apareceu de uma hora para outra. Floresceu num caldo que levou décadas sob fervura, com atuação de grupos de pressão organizados, especialmente de religiosos e de mulheres.
O processo partiu de uma palavra muito ouvida ultimamente por aqui: abstinência. Era o que defendia a primeira manifestação em escala nacional contra o álcool, de 1840, como relata Daniel Okrent no livro “Last Call: The Rise and Fall of Prohibition”. Tratava-se do Movimento Washingtoniano, que não tinha ambição de mudar a legislação, e sim convencer as pessoas a não beber.
A Lei Seca teve sua Damares. Foi a professora Mary Hanchett Hunt, uma personagem decisiva no processo. “Hunt acreditava em sua missão de falar com as crianças, saturá-las de fatos —tais como ela os percebia”, diz Okrent. “Mas o que Hunt chamava de ciência era pura propaganda, e o que ela chamava de instrução era intimidação.” Os alunos passaram a ser bombardeados por mitos como “a maioria dos tomadores de cerveja morre de edema”.
Já naquela época a guerra passava por tornar repugnante o outro lado. Foi um militar transformado em político, o almirante Richmond P. Hobson, deputado do Alabama, que cravou a definição demonizadora do álcool: “uma excreção repulsiva de um organismo vivo”.
As peças fundamentais, como de praxe, moveram-se muito abaixo da superfície moralista. A revogação da norma derivou do vício não superado do governo americano em álcool —taxar o comércio de bebida, que jamais deixou de existir, tornou-se crucial após a crise de 1929.
Letra morta, a Lei Seca sobrevive como prova de que a intromissão do Estado sobre a vida privada e os direitos individuais tende ao fracasso, mais dia ou menos dia.
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