Cientistas do Brasil, Argentina, EUA e Inglaterra conseguiram adicionar mais uma peça ao quebra-cabeça da zika. Eles descobriram que a falta de proteína na dieta da mãe está associada a uma maior chance de o filho sofrer com os efeitos da infecção.
Os pesquisadores, coordenados por Patrícia Garcez, da UFRJ, relatam os novos achados na última edição da revista Science Advances.
Já se sabia que a maior parte dos casos da síndrome congênita da zika (ou SCZ, cujos efeitos vão além da microcefalia) surgiram no Nordeste, especialmente em regiões pobres. Os cientistas calcularam que existe uma correlação baixa, porém significante (ou seja, que não pode ser desprezada) entre as taxas de crianças nascidas com microcefalia e de pessoas desnutridas em 24 estados com áreas na região tropical.
Na primeira etapa da pesquisa, 83 mães de crianças com SCZ residentes no Ceará foram entrevistas para avaliar seus hábitos alimentares durante a gestação. Dessas, 37% tinham uma ingestão proteica abaixo do recomendado (61 gramas ao dia). A ingestão das mães da amostra em média era de 64 g/dia, abaixo da média regional, de cerca de 70 g/dia.
A proteína é um macronutriente está presente em quase todos os alimentos, mas em maior quantidade em carnes, ovos, iogurte, queijo, ervilha, feijão e soja, por exemplo.
Trata-se de uma das frações mais valiosas da dieta de uma pessoa, tanto no sentido monetário quanto metabólico. No caso de desnutrição proteica, é possível que a pessoa esteja até mesmo acima do peso, por causa do excesso dos outros macronutrientes (carboidratos e gorduras). Seu organismo, contudo, se ressente, com a imunidade e funções de reparo e regeneração prejudicadas.
Numa segunda etapa do estudo, foram utilizados camundongos para entender experimentalmente se a desnutrição materna poderia de alguma maneira favorecer a infecção pelo vírus da zika em fetos.
Havia quatro grupos: grupo controle (camundongos sem intervenção), grupo infectado com zika, grupo com dieta de baixa proteína e o grupo infectado e que recebeu dieta de baixa proteína.
Alguns animais do grupo infectado submetido a dieta hipoproteica apresentaram anormalidades da placenta, com uma estrutura degenerada que permitia uma mistura do sangue da mãe com células do feto.
Faz sentido pensar que essa degeneração pode funcionar como uma avenida para o vírus da zika infectar o feto. E os filhotes, de fato, apresentaram um cérebro menor, com menos proliferação celular, e cortex cerebral (área considerada mais nobre) reduzida.
“A infecção pelo vírus da zika é um processo patológico complexo no qual a magnitude das anomalias congênitas não está somente associada à carga viral em cada tecido. Fatores indiretos como o dano à placenta também pode ter papel importante”, escrevem os autores no artigo. Para eles, aprofundar o conhecimento da síndrome é crucial para encarar futuras epidemias.
“Só melhorar a dieta não vai ajudar a proteger contra as infecções pelo vírus da zika, mas ela pode determinar a severidade da síndrome congênita”, diz Zoltán Molnár, professor de fisiologia de Oxford, em comunicado à imprensa.
Além da desnutrição, outros fatores podem ajudar a explicar a síndrome congênita da zika: carga genética, infecção anterior pelo vírus da dengue e até mesmo contaminação por uma toxina.
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