Na Alemanha, propaganda contra subsídio à energia fotovoltaica não freou avanço
Não é este o espaço nem o colunista adequado para entrar no mérito do debate sobre subsídios à energia solar fotovoltaica, pois falta o conhecimento técnico necessário sobre a burocracia do setor elétrico e da tributação. Mas alguém precisa dizer que a maioria dos comentaristas da questão comeu na mão dos economicistas e perdeu de vista o benefício ambiental.
Querem discutir subsídios? Então que se inclua na discussão também o subsídio dado ao setor do petróleo, muito maior e mais deletério para a saúde e o futuro do planeta, como maior responsável pelo aquecimento global e pela consequente crise climática.
Não é segredo que a energia solar fotovoltaica representa a principal alternativa para a revolução energética que a humanidade precisa promover nos próximos 20 ou 30 anos. Sem ela, o mundo todo corre risco de enfrentar cenários dantescos como o que se presencia na Austrália neste momento.
Os cálculos do Ministério da Economia e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) projetam que somará R$ 34 bilhões até 2035 o subsídio dado à energia solar, por alegada isenção de taxas de uso da rede distribuidora quando se injeta nela eletricidade não consumida pela casa, comércio ou fazenda geradores. A conta dá uns R$ 2,3 bilhões por ano.
A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) diz que os burocratas da economia não estão agregando ao cálculo outras vantagens do investimento na inovação fotovoltaica, as quais implicariam um ganho de R$ 3 para cada R$ 1 invertido.
Considere-se por ora só o quanto se subsidia a indústria do petróleo, combustível fóssil no fulcro de nossa matriz energética (que não consome só eletricidade, mas principalmente o diesel e a gasolina dos transportes).
Há várias cifras por aí. O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) computou que, só em 2018, o petróleo consumiu R$ 85 bilhões de recursos da sociedade brasileira, na forma de renúncia tributária e outros subsídios diretos e indiretos. Mas é conta de ONG, então muita gente a desqualificou.
Tome-se, alternativamente, auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre um único programa de incentivos, o regime aduaneiro especial de exportação e importação de bens para pesquisa e lavra de petróleo e gás natural, o Repetro. Apenas essa modalidade de desoneração tributária implicaria subsídio anual, segundo o TCU, de R$ 10 bilhões –mais que o quádruplo do que iria para o fomento da solar a cada ano nas próximas décadas.
Nem é preciso lembrar que a maior beneficiária dessas vantagens, a Petrobras, esteve no centro de um dos maiores escândalos de corrupção do país, com prejuízo bilionário tanto pela subtração de recursos do povo ,num governo nominalmente dos trabalhadores, quanto pelo desarranjo de setores inteiros da economia resultante da cruzada ultra-udenista iniciada em Curitiba.
O setor petroleiro decerto mantém milhares de empregos, que não se podem desprezar. Mas quantos empregos novos ele cria neste exato momento? A Absolar afirma que produção, instalação e manutenção de painéis energia solar gera mais de 90 empregos por dia, mais de 33 mil por ano, número que seguirá crescendo com a rápida expansão da geração distribuída.
Bem agora querem retirar o subsídio que impulsiona essa decolagem. A Aneel vê espaço para cortar em 62% o incentivo, o que pode triplicar o prazo em que o investimento se paga, de poucos anos para uma ou duas décadas, tornando-o muito menos atraente.
Uma maneira alternativa de encarar o corte de subsídio à energia solar fotovoltaica, como tanta gente vem defendendo sem racionar muito, concluiria que se trata de uma opção pela energia fóssil, fadada a desaparecer em poucas décadas, em detrimento da energia do futuro, que cresce no mundo todo. Progressistas que têm a boca torta pelo cachimbo nacional-desenvolvimentista são entusiastas da estatal fadada à decadência.
Esse filme já passou na Alemanha. Quando a Virada Energética (“Energiewende”) pegou no breu, com crescimento explosivo da alternativa fotovoltaica sobretudo nos 14 anos de Angela Merkel como chanceler, a indústria convencional passou a papagaiar que os subsídios precisavam ser retirados.
A diferença é que lá o país é governado por uma mulher formada em física, não por um obscuro capitão reformado –que meio por acaso está do lado certo nessa história, embora renegue a emergência climática. E os alemães enxergam alguns palmos à frente do nariz, não caindo facilmente nos contos da carochinha economicista.
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