quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Governo avalia imposto do pecado para doces, afirma Guedes, FSP

DAVOS
O ministro da Economia, Paulo Guedes, pediu ao grupo responsável pela reforma tributária que faça simulações para reagrupar numa mesma categoria tributária todos os produtos que possam ser prejudiciais à saúde.
A lista em análise, além dos tradicionais cigarro e bebidas alcoólicas, inclui os produtos com excesso de açúcar, considerados um fator para a obesidade, especialmente a infantil, elevando o risco de desenvolvimento de doenças graves como o diabetes.
A ideia da equipe de Guedes é aproveitar a reforma tributária para fazer a modificação.
Um dos objetivos do governo na reforma é promover a simplificação, reduzindo o número de alíquotas e classificações, bem como as exceções às regras. O IPI, por exemplo —imposto federal que está na reforma—, é um dos mais intrincados. O conjunto de regras chega a ocupar mais de 400 páginas.
O governo federal já decidiu que não vai elaborar sua própria reforma tributária, mas enviar sugestões aos projetos que já estão tramitando na Câmara e no Senado.
As duas propostas que estão nas Casas já preveem, além do IBS (imposto único sobre o consumo parecido com o IVA), um imposto seletivo para desestimular o consumo de alguns produtos, o que pode incluir cigarro, bebidas e armas.
A novidade seria incluir os produtos com açúcar nesta lista.
"Pedi simulações para, dentro da discussão dos impostos seletivos, agrupar o que os acadêmicos chamam de impostos sobre pecados: cigarro, bebida alcoólica e açucarados. Deram esse nome porque, por exemplo, se o cara que fuma muito vai ter câncer de pulmão, tuberculose, enfisema e, lá na frente, vai ter de gastar com o tratamento, entrar no sistema de saúde. Então coloca um imposto sobre o cigarro para ver se as pessoas fumam menos", disse Guedes durante o Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos.
"Imposto do pecado" é como acadêmicos chamam tributos sobre produtos socialmente atraentes, mas que causam risco à saúde.
Na proposta da Câmara, a definição dos produtos será feita por legislação posterior, mas os autores sugerem tributar produtos como cigarro, bebidas alcoólicas e armas.
Na proposta do Senado, o novo imposto seletivo alcança vários produtos, como bebidas alcoólicas e não alcoólicas, combustíveis, cigarros, energia elétrica, serviços de telecomunicações e veículos terrestres, aquáticos e aéreos, por exemplo. Refrigerantes, sucos e até mesmo água mineral poderiam ser alvo do novo tributo, independentemente de serem ou não açucarados.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o Fórum Econômico Mundial
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o Fórum Econômico Mundial - Walter Duerst/Fórum Econômico Mundial
A tributação sobre doces é uma nova discussão global. O Reino Unido foi um dos países que adotou o imposto sobre bebidas com açúcar, em 2018, com amplo apoio da comunidade médica. O efeito da tributação tem sido avaliada como positivo, mas ainda faltam evidências científicas que mostrem seu efeito para a saúde. Outros países europeus e estados americanos debatem a adoção da taxa.
No Senado brasileiro, já tramita um projeto de lei do senador Rogério Carvalho (PT-SE) para aumentar a tributação especificamente de bebidas açucaradas, apontadas por estudos médicos como corresponsáveis pelo aumento da obesidade e doenças dela derivadas.
De 2007 a 2017, segundo estudo do Ministério da Saúde, a taxa de jovens obesos no Brasil saltou de 4,4% para 8,5%. De acordo com dados de 2018 compilados pelo ministério, um em cada cinco brasileiros é obeso —recorde no país.
Em nota, a Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos) afirmou que a maior parte do consumo de açúcar no Brasil (56,3%) vem do que é adicionado no preparo final dos alimentos. O açúcar adicionado nos alimentos industrializados responde por 19,2% do total consumido, de acordo com estudos feitos com base nos últimos dados da POF/IBGE.
Disse ainda que experiências de taxação de alimentos por outros países não geraram evidências suficientes para comprovar a eficácia desta medida no combate à obesidade.
“Os altos índices de obesidade e de outros problemas de saúde associados ao estilo de vida contemporâneo têm causas multifatoriais e sua solução passa por uma abordagem ampla, incluindo o incentivo à prática de atividades físicas e à alimentação equilibrada. A indústria de alimentos acredita que nutrientes ou alimentos específicos não são responsáveis por doenças crônicas, e sim o seu consumo excessivo dentro do contexto de estilos de vida não saudáveis”, diz a associação.
A Abia diz ainda que o setor vem promovendo ações para ajudar a combater o problema e que mantém um acordo de cooperação com o Ministério da Saúde para a construção de um Plano Nacional de Vida Saudável, que inclui a melhoria no perfil nutricional dos alimentos industrializados.
Segundo a associação, já foram retiradas mais de 310 mil toneladas de gorduras trans e mais de 17 mil toneladas de sódio de 35 categorias de alimentos industrializados, com a meta de alcançar 28 mil toneladas neste ano. “O Plano de Redução de Açúcares, lançado em novembro de 2018, vai retirar 144,6 mil toneladas de açúcares de 23 categorias de alimentos até 2022.”
Se analisadas alíquotas atuais, os maiores aumentos na tributação devem ser em refrigerantes, chocolates e cervejas.
De acordo com a Receita Federal, a alíquota de IPI para refrigerantes está atualmente em 4%. Para cervejas, em 6%.
Há, no entanto, regras que reduzem o percentual em diferentes situações, como em compostos com suco de fruta, extrato de sementes de guaraná, extrato de açaí e cervejas especiais.
Já nas chamadas bebidas quentes (como vinhos, sidras, aguardentes, uísques e licores), as alíquotas cobradas pelo Fisco variam de 10% a 30% conforme o tipo.
Para chocolates, as alíquotas são de 5%.
No caso de cigarros, as empresas podem escolher dois regimes de tributação de IPI. No chamado regime geral, a alíquota é de 300%. No regime especial, somam-se as alíquotas percentual (66,7%) e específica por maço ou box (de R$ 1,50).
 

IMPOSTO SELETIVO

Reforma tributária do Senado (PEC 110): imposto de índole arrecadatória, cobrado sobre operações com petróleo e seus derivados, combustíveis e lubrificantes de qualquer origem, gás natural, cigarros e outros produtos do fumo, energia elétrica, serviços de telecomunicações, bebidas alcoólicas e não alcoólicas, e veículos automotores novos, terrestres, aquáticos e aéreos
Reforma tributária  da Câmara (PEC 45):  impostos de índole extrafiscal, cobrados sobre determinados bens, serviços ou direitos com o objetivo de desestimular o consumo. Caberá a lei ordinária ou medida provisória definir os bens, serviços ou direitos tributados
Proposta do ministro Paulo Guedes: Dentro da discussão dos impostos seletivos, agrupar o que os acadêmicos chamam de impostos sobre pecados: cigarro, bebida alcoólica e açucarados.
Colaboraram Eduardo Cucolo, de São Paulo, e Fábio Pupo, de Brasília

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